Ribeirão Santa Isabel está secando
Manancial perde mais de 3 bilhões de litros d'água em 18 anos
Por Sergio Ulhoa Dani
O principal manancial de abastecimento público de Paracatu, cidade de 90 mil habitantes do noroeste de Minas Gerais, está secando. Em 18 anos, a vazão média do Santa Isabel caiu de 1550 litros/segundo, para 1450 litros/segundo.
Parece pouco, porém isso representa uma queda de vazão média da ordem de 3 bilhões de litros de água em 18 anos, a uma taxa média de perda da ordem de 175 milhões de litros/ano.
Uma análise mais detalhada revela um cenário ainda mais grave. A taxa de queda da vazão parece estar aumentando nos últimos anos. Comparando as medidas de vazão dos períodos chuvosos nos triênios 1993-1995 e 2006-2008, verifica-se que houve uma perda média de mais de 1000 litros/segundo. É como se a cada ano, o ribeirão estivesse ficando um pouco mais seco que no ano anterior (veja Gráfico que acompanha este artigo).
“A gente não vê mais as grandes enchentes, como antigamente”, constata José Vicente Vieira de Souza, 43 anos de idade, nascido e criado na Fazenda Dobeira. “Os peixes de antigamente também sumiram: pacu, dourado, bagre, mandim, matrinchã, curimatá, piau, timburé. Até a quantidade de piaba diminuiu”, lamenta Vicente.
Se as ações de conservação de solo e produção de água não forem intensificadas no Sistema Serra da Anta, que inclui as nascentes do Ribeirão Santa Isabel e as nascentes do Ribeirão Santa Rita e Córrego do Sotero, Paracatu corre o risco de passar sede.
Em 1995-1996 a cidade já passou por essa experiência. Na época, a prefeitura decretou estado de calamidade pública por falta de água; a captação de água no Santa Isabel ainda não estava ativa, e as nascentes urbanas estavam degradadas pela mineração de ouro a céu aberto.
Passado, presente e futuro
O problema não é novo, mas está se agravando, por causa da degradação dos mananciais e da urbanização. No período de 1947-1951, houve uma seca tão intensa na região que até o Rio Paracatu secou. Mas, naquela época, a maioria da população morava na zona rural e acabou se virando de alguma forma. Hoje a maioria da população reside na cidade, e muitos moradores já sofrem com a falta d’água.
Uma das razões da falta d’água é o corte do fornecimento, por falta de pagamento da conta de água e esgoto da COPASA, empresa concessionária dos serviços de abastecimento público na cidade. O pobre de hoje está condenado a morrer de sede na cidade, porque já não existem os córregos e nascentes do passado, que davam água a todos, sem cobrança em troca.
A tendência futura é que as secas sejam cada vez mais intensas, e que a cidade fique cada vez mais vulnerável, por causa da mineração predatória de ouro. A transnacional canadense Kinross quer se apoderar da bacia de abastecimento público mais antiga e mais valiosa de Paracatu, o Vale do Machadinho, parte do Sistema Serra da Anta, para suprir suas necessidades de água, e, ao mesmo tempo, usar o vale como local de despejo de 1,2 bilhões de toneladas de rejeitos tóxicos. Se a barragem de rejeitos for construída ali, a água nunca mais poderá ser usada para consumo humano.
A mineradora conta com o apoio do governo do Estado de Minas Gerais, alguns políticos locais e funcionários e fornecedores da empresa, que defendem de seus interesses pessoais ou de grupo. Eles parecem não querer enxergar e defender os interesses da coletividade à qual pertencem.
Mas há também os que defendem a vida e o bem público, e eles estão organizados e vigilantes. O Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal conseguiram paralisar o projeto de construção da barragem de rejeitos da mineradora.
Já a Câmara Municipal de Paracatu está analisando um projeto de lei conhecido como a “Lei das Águas de Paracatu”, para declarar o interesse público do município pela proteção das águas do Sistema Serra da Anta.
A maioria da população de Paracatu apóia o movimento "Santas Águas de Paracatu: Eu Protejo", que despertou a opinião pública para a necessidade da aprovação da Lei das Águas.
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Sergio Ulhoa Dani
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