domingo, 19 de dezembro de 2010

Arsênio na bactéria dos outros é refresco

Arsênio na bactéria dos outros é refresco

Por Sergio Ulhoa Dani (*)

Pesquisadores da NASA descobriram no lago Mono da Califórnia uma bactéria que troca fósforo por arsênio nas suas moléculas, inclusive no DNA [1]. A descoberta é intrigante porque o arsênio é um elemento extremamente tóxico. Entretanto, o achado não autoriza a conclusão em favor da essencialidade do arsênio para nós e os nossos semelhantes.

Alta mobilização de arsênio mais de 200 anos depois do início da mineração de ouro no Quadrilátero Ferrífero.

Alta mobilização de arsênio mais de 200 anos depois do início da
mineração de ouro no Quadrilátero Ferrífero.

A concentração de arsênio na água dos córregos entre Ouro Preto e
Mariana está acima dos limites legais em todos os pontos analisados
por uma equipe da Universidade de Viçosa (UFV), conforme estudo
publicado na revista científica Environmental Monitoring Assessment
[1].

Os cientistas do Departamento de Química da UFV analisaram os
sedimentos e as águas dos córregos da região. A concentração de
arsênio na água variou entre 36,7 e 68,3 μg L⁻¹. A concentração de
arsênio em todos os pontos amostrados está aumentada de 3,67 a 6,83
vezes o limite máximo permitido pela legislação brasileira para água
destinada ao consumo humano, que é de 10 μg L⁻¹.

domingo, 12 de dezembro de 2010

DNPM analisa normas brasileiras de segurança da atividade mineradora

DNPM analisa normas brasileiras de segurança da atividade mineradora

Brasília, 9 dezembro de 2010

Atento às declarações do Ministro de Minas e Energia que, referentes ao
episódio ocorrido no Chile em que mineiros ficaram aprisionados no interior
de uma mina subterrânea, ordenou a revisão da normas brasileiras de
segurança da atividade mineradora, o Procurador de Justiça Serrano Neves
encaminhou uma mensagem de solicitação ao Ministro.

Na mensagem, Serrano Neves solicita que as análises alcancem o entorno, ou
externalidade, das áreas de mineração a céu aberto no tocante à dispersão
aérea e hídrica de poluentes ou cargas nocivas, em especial arsênio e outros
metais pesados, e que atingem sistemas socioambientais com alto prognóstico
de dano, como já ocorreu no Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais e ocorre
em Paracatu, a 200 km de Brasília, com a dispersão do arsênio.

Os danos sistêmicos na externalidade são epidêmicos e podem atingir milhares
de pessoas, não sendo, portanto, menos importantes do que os danos
localizados em minas subterrâneas que atingem algumas centenas, informou
Serrano Neves na mensagem enviada ao Ministro.

A mensagem foi encaminhada à Diretoria de Fiscalização da Atividade
Minerária do DNPM-Departamento Nacional de Produção Mineral na pessoa do seu
diretor, Walter Lins Arcoverde para análise, informou hoje o geólogo Paulo
Ribeiro de Santana, ouvidor do órgão.

Fonte: DNPM

domingo, 5 de dezembro de 2010

Fala do Dr. Sergio U. Dani no plenário do CONSEA, transmitida via internet (Skype) a partir da Alemanha, em 19 de outubro de 2010

Fala do Dr. Sergio U. Dani no plenário do CONSEA, transmitida via
internet (Skype) a partir da Alemanha, em 19 de outubro de 2010

Prezadas Sras. e Srs.,

Em Paracatu, cidade de 100 mil habitantes no noroeste de Minas Gerais,
uma mineradora transnacional canadense, RPM/Kinross Gold Corporation
está poluindo a atmosfera e as águas superficiais e subterrâneas com
arsênio, um dos venenos mais potentes e persistentes conhecidos,
cianeto e ácido sulfúrico, entre outros poluentes, e causando um
verdadeiro genocídio das atuais e futuras gerações.

O arsênio está aprisionado nas rochas sulfetadas da mina do Morro do
Ouro na proporção de 1 kg de arsênio para cada tonelada do minério. O
ouro está presente na proporção de apenas 0,4 g por tonelada de
minério. Isso significa que, para obter 1 kg de ouro, a mineradora
libera 2500 kg de arsênio finamente pulverizado em uma parte muito
importante da bacia do Alto São Francisco. Os dados de concentração de
arsênio e teor médio de ouro citados aqui foram retirados dos
relatórios da própria mineradora.

O arsênio é lançado sobre nascentes de água que no passado abasteciam
os povoados de Paracatu. Em função da aprovação do projeto de expansão
da mineradora em 2009, pelos governos estadual, federal e municipal,
serão depositadas 1 milhão de toneladas de arsênio sobre o Vale do
Machadinho, a partir de 2011. As nascentes desse Vale drenam água
ainda potável da face leste do Sistema Serra da Anta. Essas águas
abasteciam a cidade de água por queda livre, através do histórico Rego
do Mestre de Campo. Essas águas agora serão expropriadas e poluídas
pela mineradora.

Em função da contaminação das águas subterrâneas, da destruição das
nascentes do Córrego Rico e São Domingos pela mineradora de ouro desde
1987, e do aumento do consumo de água na cidade, cerca de 80% do
abastecimento público de água potável dos 100 mil habitantes de
Paracatu passou, a partir de 1996, a depender das águas da face oeste
do Sistema Serra da Anta, onde se encontra o Ribeirão Santa Isabel e
seus afluentes. A água do Santa Isabel é captada pela concessionária
COPASA, tratada e bombeada para Paracatu, com altos custos
operacionais.

O Sistema Serra da Anta não é estanque. O aumento do consumo diário de
'água nova' pela mineradora - três vezes o consumo diário da cidade -
é apontado como um dos responsáveis pelo esgotamento desse sistema
hídrico, já verificado pelas medições feitas pela COPASA, a partir de
1995. O represamento dos rejeitos tóxicos da mineradora sobre as
nascentes da face leste do Sistema Serra da Anta criará uma pressão
hidrostática na face leste da Serra da Anta que causará um refluxo da
água contaminada pelo aqüífero no sentido da drenagem da face oeste do
Sistema. Esse fenômeno, que poderá durar anos ou séculos, acabará
poluindo as águas que hoje abastecem Paracatu. É tudo uma questão de
tempo.

A drenagem ácida da mina e das lagoas de rejeitos potencializa a
poluição por arsênio. Medições feitas pelo CETEC (MG) em 2008 indicam
altíssima concentração de sulfatos nas águas que drenam da lagoa de
rejeitos atual. Estudo da UFMG-Universidade Federal de Minas Gerais de
2009 mostra poluição grave e persistente por arsênio nos sedimentos
dos córregos à jusante da mina: Córrego Rico e Ribeirão Santa Rita. Em
alguns trechos, as concentrações exorbitam os limites legais em mais
de 700 vezes. Análises do laboratório CAMPO de 2010 indicaram aumento
da concentração de arsênio na água de 6 partes por bilhão (ppb). O
laboratório CAMPO, que é colaborador da mineradora, não detectou
arsênio nas águas a montante da mina, indicando que a fonte de
poluição é a mineradora.

Medições de arsênio na poeira colhida em 20 pontos diferentes de todo
o assentamento urbano da cidade de Paracatu realizadas em duplicata
pela UFMG e pela Universidade Técnica de Freiberg, na Alemanha
indicaram em julho de 2010 concentrações de arsênio tão extremamente
danosas à saúde pública, a ponto de qualificar o efeito da mineração
de ouro a céu aberto em Paracatu como genocídio.

Um grama de arsênio mata agudamente 7 pessoas adultas. Quantidades
muito menores, na faixa de milionésimos do grama inalados ou ingeridos
cronicamente causam uma série de doenças, incluindo: diabetes, câncer,
doenças cardiovasculares, demências e outras doenças neurológicas,
abortos e malformações congênitas, doença renal, entre outras.

Apenas 0,1% de todo o arsênio a ser liberado pela mineradora
RPM/Kinross nos próximos 30 anos bastaria para matar toda a população
atual do nosso planeta: 7 bilhões de pessoas. Para evitar essa
catástrofe, a mineradora teria que operar com uma eficiência de
neutralização e imobilização do arsênio da ordem de 99,9%, um índice
impossível de atingir simplesmente pela capacidade operacional da
mineradora. Um estudo da própria mineradora publicado em colaboração
com o CETEM (RJ) indica uma capacidade de recuperação de apenas 30% do
arsênio na fase da hidrometalurgia.

O genocídio cometido pela mineradora só não se manifesta em escala
global porque os efeitos do arsênio que ela libera são concentrados
nos níveis local e regional e diluídos no tempo. Mesmo considerando a
alta mobilização do arsênio dissolvido na água ou gaseificado, na
prática, 'apenas alguns milhões de pessoas' morrerão ou adoecerão
cronicamente em função da atividade da mineradora, geralmente aqueles
mais próximos da fonte de contaminação: os paracatuenses e a população
que se servir das águas da bacia do Rio São Francisco nos próximos
anos, décadas ou milênios.

Como existem milhares de minas de ouro em rocha dura contendo arsênio
espalhadas pelo mundo, acredita-se que os efeitos genocidas serão
multiplicados na esfera global, a partir dos níveis locais e
regionais.

Vários estudos científicos indicam que o arsênio persiste no ambiente
pelo menos durante séculos. É o caso, por exemplo, da Sierra Nevada,
no oeste americano, que apresenta poluição persistente causada por
minas de ouro abandonadas da época da corrida do ouro, por volta de
1850.

A mineração de ouro a céu aberto em Paracatu é um crime de genocídio e
causa um prejuízo enorme para o país, na medida em que afeta a saúde e
a vida de milhões de pessoas, no presente e no futuro.

Nem todo o ouro extraído de Paracatu seria suficiente para pagar os
custos de neutralização dos efeitos do arsênio liberado pela
mineração. Um estudo publicado em 2010 pelo Instituto Nacional de
Pesquisa Econômica da Suécia usou uma abordagem médico-ambiental que
leva em conta a exposição ao arsênio, a fim de analisar como os riscos
de câncer em locais contaminados por arsênio e suas vizinhanças são
implicitamente valorados no processo de remediação. Os resultados
mostram que o custo por vida salva varia de SEK 287 milhões a SEK
1.835.000 milhões (equivalente a R$ 73.973.607,53 - R$472.967.142,21),
a despeito de cálculos conservadores que de fato subestimam os custos.
Considerando-se conservadoramente apenas 1% da população atual de
Paracatu vitimada por câncer causado pelo arsênio (sem considerar
novas gerações ou as outras doenças causadas por arsênio, como Doença
de Alzheimer, diabetes, doenças cardiovasculares, etc.), teríamos um
custo conservador estimado entre R$73 bilhões e R$472 bilhões. Isso
quer dizer que os prejuízos causados pela mineração em Paracatu são de
5 a 10 vezes maiores que o valor bruto de todo o ouro retirado da
cidade. Infelizmente, nem 1% do valor líquido fica na cidade na forma
de impostos. O ouro vai e não volta, mas os problemas, os venenos, a
pobreza e a morte ficam.

Se todo o ouro já extraído no mundo fosse distribuído igualitariamente
pela população atual do planeta, cada ser humano receberia pouco mais
de 20 gramas de ouro, e levaria de brinde a pegada genocida dessas 20
gramas: 50 kg de arsênio.

Ouro é para um punhado de ricos, o que a maioria das pessoas não é. Os
pobres devemos nos contentar com o veneno que nos empobrece cada vez
mais até matar-nos. Até quando vão abusar da nossa paciência?

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Sergio U. Dani
Germany
Tel. 00(XX)49 15-226-453-423
srgdani@gmail.com