terça-feira, 28 de julho de 2009

Nota para a imprensa – 27 de julho de 2009


Nota para a imprensa – 27 de julho de 2009

(see also the English version of this press release below)
[READ MORE IN PORTUGESE (leia mais em português)
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/manifesto-de-paracatu.html
Fonte: Fundação Acangau (www.alertaparacatu.blogspot.com)
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Em pouco tempo, a transnacional canadense RPM/Kinross Gold Corporation está transformando Paracatu num inferno sobre a Terra – com o apoio de um punhado de autoridades brasileiras

Documentos antigos informam que já em meados do século 17 havia vida humana organizada em Paracatu, no noroeste de minas Gerais, Brasil. Quatro séculos depois, uma mineradora canadense traz destruição e morte para a cidade e suas imediações.

Apoiado em diversas análises, documentários, reportagens, relatórios e teses acadêmicas, o manifesto de Paracatu mostra por que e como a mineradora transnacional está transformando esta cidade de 90 mil habitantes num inferno sobre a Terra:

. Poluição do ar, da água e dos solos com metais pesados, arsênio e outras substâncias nocivas;
. Poluição e destruição das fontes de água potável da população;
. Aumento dos casos de câncer;
. Aumento dos transtornos mentais;
. Aumento dos casos de doenças cardiovasculares, renais, diabetes, doenças de pele e outras lesões;
. Aumento da concentração de renda (valor declarado da produção anual da mina de ouro: R$800 milhões ou US$500 milhões; mas 37,42% da população têm uma renda inferior a R$75,50 ou US$50);
. Aumento do desemprego e alto índice de desocupação (apenas 37% da população possui uma ocupação)
. Aumento das práticas de “facilitação dos negócios”;
. Degradação dos valores e costumes locais, degradação da cultura e da educação geral;
. Aumento dos gastos com manutenção de gigantescas barragens de rejeitos e tanques específicos de venenos, que são verdadeiras bombas de efeito retardado;
. Aumento do custo de oportunidade pela perda de vastas extensões territoriais que estão sendo sacrificadas em detrimento de outros usos alternativos prioritários (infra-estrutura urbana, conservação de mananciais, agricultura e agronegócio, etc.);
. Perdas econômicas decorrentes das perdas sócio-ambientais, que acarretam perdas de oportunidade de desenvolvimento de diversos setores da economia (como o turismo).

A expansão da mina da RPM/Kinross Gold Corporation em Paracatu representa uma catástrofe para a cidade. E a indiferença de um punhado de autoridades brasileiras trabalha a favor dessa catástrofe.

O Manifesto de Paracatu pede a atenção e a ajuda nacional e internacional para evitar essa catástrofe insidiosa.






Press release – July 27, 2009
Source: Acangau Foundation (www.alertaparacatu.blogspot.com)

Within a short timeframe, Canadian transnational RPM/Kinross Gold Corporation is turning Paracatu into a hell on Earth – with the backing of a fistful of Brazilian government authorities

Old documents tell us that Paracatu – located in northwestern Minas Gerais State, Brazil – already had an organized social life as early as the beginning of the 17th century. Four centuries later, a Canadian mining company brings destruction and death to the town and its surrounding region.

Supported by a number of analyses, documentaries, reports and scientifical data, the Paracatu Manifest shows how and why the transnational mining company is turning this 90,000 inhabitants town into a hell on Earth, featuring:

. Pollution of air, water and soils by heavy metals, arsenic and other harmful substances;
. Pollution and destruction of public sources of drinking water;
. Increasing cancer incidence;
. Increasing mental disorders;
. Increasing cases of cardiovascular diseases, renal disorders, diabetes, skin diseases and other lesions;
. Increasing income gap (value of the Paracatu mine annual gold production = US$500,000,000; income of 37,42% of Paracatu people = US$50);
. Increasing unemployment (37% of Paracatu people have an occupation)
. Increasing “facilitation payments” for governmental and non-governmental organizations;
. Increasing degradation of local cultural values and general education;
. Increasing liabilities (e.g., impending costs such as gigantic toxic tailings impoundments and other “clock bombs”) that overwhelm the actual value of gold reserves and anticipate bankruptcy;
. Increasing loss or degradation of vast extensions of valuable agricultural land and natural sources of drinking water;
. The worsening of social and environmental bases threatens the region with outrageous plight.

The Paracatu Manifest portrays the expansion of the RPM/Kinross Gold Corporation mine as a catastrophe which is backed by the indifference of a fistful of Brazilian government authorities.

The Paracatu Manifest calls attention and help from the national and international communities to avoid this insidious catastrophe.

Manifesto de Paracatu

Manifesto de Paracatu, julho de 2009

Carta-manifesto e apelo nacional e internacional (*)

Mineradora canadense traz doença, morte, pobreza e destruição aos milhares de habitantes de Paracatu, Brasil

Crianças e jovens são os que mais adoecem e morrem, e as riquezas e os valores são destruídos

A expansão da mina de ouro da transnacional canadense RPM/Kinross traz a morte e a pobreza aos milhares de habitantes de Paracatu. O processo de licenciamento ambiental do empreendimento é uma farsa orquestrada para esconder os fatos que são inconvenientes para os canadenses, e mortais para os brasileiros. Nada justifica a indiferença de algumas poucas pessoas do governo brasileiro que decidem pelo genocídio do seu próprio povo. Felizmente os autores deste manifesto tiveram tempo suficiente para descobrir e divulgar esses fatos. A sociedade brasileira e seus representantes ainda têm a oportunidade de evitar um dos maiores genocídios tolerados da história do Brasil moderno. Este documento sintetiza os pontos principais dessa catástrofe anunciada e reforça os apelos à comunidade nacional e internacional para intervir no caso.
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(*) As seguintes pessoas participaram da elaboração deste manifesto:

. Márcio José dos Santos, geólogo, possui 7 anos de experiência em pesquisa de ouro (Mineração Morro Velho - Grupo Anglo Gold, e Mineração Colorado - BHP-Utah Mining).

. Paulo Maurício Serrano Neves, procurador de justiça criminal do Estado de Goiás.

. Sergio Ulhoa Dani, médico, doutor em medicina e doutor em patologia, livre-docente em genética. SUD é o autor correspondente: srgdani@gmail.com.

Para maior clareza, o leitor pode consultar as referências e notas citadas [entre colchetes] e listadas ao final deste manifesto.
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Introdução: uma catástrofe anunciada

Paracatu é uma cidade de 90 mil habitantes localizada na região noroeste do Estado de Minas Gerais, a 200 km de Brasília, a capital do Brasil.

Em 1987, uma mineradora transnacional, a Rio Paracatu Mineração (RPM) instalou-se na cidade e obteve permissão das agências governamentais para explorar uma mina de ouro a céu aberto no perímetro urbano. Até 2003, a principal acionista desta mina era a anglo-australiana Rio Tinto. Neste ano, a mineradora transnacional canadense, Kinross Gold Corporation, adquiriu participação expressiva na mina, tornando-se sócia da Rio Tinto neste empreendimento. Logo em seguida, a Kinross adquiriu a totalidade da participação da Rio Tinto, tornando-se a única proprietária da mina de Paracatu.

A mina a céu aberto de Paracatu é única no sentido de possuir os mais baixos teores de ouro do mundo, 0,43 g por tonelada de minério [1], e por estar localizada dentro de uma cidade de 90 mil habitantes. O ouro da mina de Paracatu é encontrado em uma rocha filítica rica em arsenopirita, um mineral de arsênio.

Outra característica importante desta mina é que a gênese do depósito de ouro está relacionada a uma zona de falhamento e cisalhamento geológico. Por que isto é importante? Embora a rocha filítica tenha "baixa capacidade de armazenação e transmissividade de águas subterrâneas", conforme relatório de avaliação de risco elaborado pela SUPRAMNOR (agência do governo do Estado de Minas Gerais, Brasil, encarregada de elaborar os relatórios de licenciamento ambiental do projeto da mineradora RPM/Kinross), o que diferencia a região da mina é a existência desta zona de falhamento/cisalhamento. É, portanto, uma zona de intenso fraturamento, que intensifica a migração dos fluidos e magnifica os riscos de contaminação das águas subterrâneas.

A mineração de ouro da RPM/Kinross em Paracatu libera o arsênio para a atmosfera (poeira e gases da mina e dos rejeitos) e para os solos e aquíferos (águas e superficiais e subterrâneas contaminadas pela drenagem superficial e pela percolação através dos rejeitos contaminados e depositados nos tanques específicos e lago de rejeitos).

Mesmo em doses situadas na faixa de milionésimos do grama, arsênio é considerado o “rei dos venenos”, porque não tem cheiro nem gosto e é absorvido imperceptivelmente pelo organismo, onde se acumula e causa uma série de doenças, inclusive o câncer [2].

À medida que a RPM (Rio Tinto – Kinross) aprofundava a cava em busca do ouro, a rocha tornava-se cada vez mais dura e a quantidade de arsênio liberada aumentava. Em 2003, um relatório publicado pela própria mineradora [3] mostrava que a quantidade de arsênio na "poeira fugitiva" da mina de Paracatu aumentou de 3,42 kg em 2001, para 5,79 kg em 2002, e para 6,10 kg em 2003.

Isso é um verdadeiro escândalo à luz dos conhecimentos sobre os efeitos do acúmulo do arsênio no corpo humano. Isso significa uma exposição média de 67,7 mg de arsênio por habitante/ano em Paracatu, equivalente a 0,183 mg/habitante/dia. Considerando um peso médio corporal médio de 50 kg (entre adultos e crianças), isso equivale a uma dose de 0,00365 mg/kg/dia, portanto quase o dobro da dose de 0,002 mg/kg que a Organização Mundial de Saúde, já em 2001, considerava provisoriamente tolerável.

Como as crianças constituem o grupo mais sensível e vulnerável à intoxicação por arsênio, deve-se considerar esse grupo nos cálculos de risco. Entre 2004 e 2006, havia 16.623 crianças em idade escolar em Paracatu [4]. Se considerarmos o peso médio corporal de 18 kg, teremos uma exposição diária ao arsênio de 0,010 mg/kg/dia, que é 5 vezes acima do limite caucionário da OMS-Organização Mundial de Saúde. Para crianças menores ainda, a dose facilmente ultrapassa o patamar assustador de 10 vezes o limite caucionário provisório da OMS.

O problema se revela ainda mais grave, se considerarmos: (i) que não existe dose segura para substância cancerígena como o arsênio, (ii) que mesmo em pacientes sem nenhum sinal clínico de arsenicose, a quantidade de arsênio acumulado no corpo encontra-se acima do valor provisoriamente considerado tolerável pela OMS [5] e (iii) que pequenos acréscimos na dose de exposição ao arsênio se traduzem em grandes acréscimos na taxa de acúmulo de arsênio no corpo humano [6]. O diagnóstico de lesões típicas de arsenicose em jovens e crianças de Paracatu é alarmante e consubstancia essas evidências [4, 7].

A conclusão a que se pode chegar a partir dos dados de arsênio na poeira fornecidos pela própria mineradora e as evidências clínicas colhidas em Paracatu até o momento é que a mineração de ouro está matando gente na cidade, especialmente crianças e adultos jovens. Talvez por ter percebido essa realidade, em 2003, a Rio Tinto apressou-se em vender a totalidade de sua participação na mina de Paracatu para a Kinross Gold Corporation, empresa que tem se demonstrado ainda mais inescrupulosa, agressiva, “facilitadora” e homicida [8].

A Kinross é uma empresa nova que cresceu assustadoramente no cenário global usando táticas agressivas, como contratação de membros de governos, realização de pagamentos facilitadores, ocultação de dados, otimização de resultados financeiros à custa da destruição do meio ambiente e da saúde humana, etc. Um relatório independente chega a implicar o presidente e principal executivo da Kinross, Tye Burt, em atos de terrorismo, lavagem de dinheiro e de ouro e operações financeiras fraudulentas [9].

Após a aquisição da mina de Paracatu pela Kinross, os dados sobre arsênio foram sistematicamente ocultados da população. Quando provocados em uma audiência pública sobre o projeto de expansão, realizada em abril de 2008 na cidade de Paracatu, os representantes da mineradora chegaram a negar a presença do arsênio na poeira que sai da mina, conforme está gravado nas fitas das audiências e transcrito no Jornal Alerta Paracatu, edição especial de junho de 2008.


Genocídio tolerado pelo Estado

No mais recente “relatório único” da SUPRAMNOR, a palavra "arsênio" aparece escondida, citada apenas duas vezes no rol de diversos outros parâmetros secundários que serão "auto-monitorados" pela mineradora transnacional [10].

O relatório não discute o milhão de toneladas de arsênio inorgânico que serão liberadas para o meio ambiente urbano de Paracatu e seu entorno, em decorrência da expansão da mineração, e especificamente despejadas no Vale do Machadinho, a verdadeira caixa d’água potável de milhares de paracatuenses.

Quem lê o relatório da SUPRAMNOR não pode sequer imaginar que exista um problema desse, como se 1 milhão de toneladas de arsênio não fossem um problema gigantesco. Na verdade, deve ser a maior quantidade de arsênio jamais liberada por uma mina de ouro no mundo, dentro de uma cidade de 90 mil habitantes. E o relatório inexplicavelmente conseguiu esconder 1 milhão de toneladas de arsênio das pessoas que decidirão sobre sua aprovação ou rejeição, na reunião do COPAM do dia 20 de agosto de 2009, selando o destino de vida ou morte de milhares de pessoas.

Um milhão de toneladas de arsênio é veneno suficiente para matar 10 trilhões de pessoas, ou seja, mais de mil vezes a população mundial atual. A ocultação desse risco monstruoso é pior do que um crime. É um erro primário, por si só desqualificante do relatório da SUPRAMNOR.

Sabemos que hoje já é possível calcular, por exemplo, o número de casos de câncer e de mortes decorrentes do projeto de expansão da mina. A ciência do arsênio progrediu rapidamente no mundo todo, em reconhecimento à gravidade e à escala global do problema. Várias universidades e centros de pesquisa independentes pelo mundo afora possuem o know-how para estimar os riscos de morbi-mortalidade decorrentes da exposição crônica de populações inteiras ao arsênio.

Então por que a mineradora não apresentou esses estudos nos processos de licenciamento da expansão da mina? Por que as agências governamentais estão expedindo as licenças sem considerar o principal impacto de suas decisões?

Certamente porque ninguém do governo exigiu. Mas nós exigimos formalmente e não fomos ouvidos. O povo não é ouvido. As equipes do governo estadual e municipal deveriam ter exigido esses estudos da mineradora, ou deveriam ter atendido os nossos pedidos. Por que ainda não o fizeram? O que estão fazendo com o dinheiro dos nossos impostos e a nossa dignidade?

Em 2008, o procurador Serrano Neves advertiu: “As autoridades locais (atuais e candidatas) estão perdendo a chance de fazerem o dever de casa, mas estejam certas de que se não o fizerem o Judiciário o fará, e se o Judiciário não fizer - duvidamos que não faça - as doenças e mortes atribuídas ao arsênio e outros metais pesados lhes serão atribuídas por omissão.” [11]

Não é relevante saber que o projeto de expansão da Kinross em Paracatu está custando centenas, talvez milhares de vidas humanas? Um estudo publicado em 2007 provou que 10% das mortes em uma região do Chile foram causadas pela exposição ao arsênio [12]. Com base nos dados da literatura mundial sobre os efeitos da acumulação do arsênio no corpo humano, inclusive o estudo do painel internacional de experts contratado em 2001 pela OMS [13] e demais linhas de evidência, é obrigatório exigir que esses estudos epidemiológicos, clínico-laboratoriais e atuariais sejam conduzidos imediatamente, conforme há tempos solicitamos, como condição para avaliação de qualquer pedido de concessão de licença ambiental para a RPM/Kinross.

Outros erros mortais do relatório da SUPRAMNOR

1. Falhas geológicas ou falhas ideológicas?

Quanto aos riscos de contaminação das águas superficiais e profundas decorrentes da construção de um novo lago de rejeitos da mineradora no Vale do Machadinho, o parecer limita-se a fazer o seguinte comentário: "Os aspectos geológicos (rocha filítica) e hidrogeológico (baixa capacidade de armazenação e transmissividade de águas subterrâneas) garantem uma baixa vulnerabilidade ambiental ao empreendimento."

Conseguiram reduzir uma complexidade a uma inacreditável simploriedade, indicando que não houve o que comentar, provavelmente porque nada foi feito. Por exemplo: Que estudos foram feitos? Onde estão os mapas geológicos? Onde estão os falhamentos? Em que sentido caminhará a pluma de contaminação?

Conforme afirmamos acima e parece não ter sido considerado pela equipe da SUPRAMNOR, embora a rocha filítica tenha "baixa capacidade de armazenação e transmissividade de águas subterrâneas" (conforme afirmado no relatório de avaliação de risco elaborado pela SUPRAMNOR), o que diferencia a região da mina é a existência de uma zona de falhamento/cisalhamento. É, portanto, uma zona de intenso fraturamento, que intensifica a migração dos fluidos e magnifica os riscos de contaminação das águas subterrâneas.

Um modelo de contaminação das águas na eventualidade da construção desta nova barragem foi publicado em http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/transnacional-canadense-quer-envenenar.html. Esse modelo ainda não foi levado em consideração no processo de licenciamento dessa barragem.

Entretanto o modelo foi considerado plausível por profissionais da geologia, e para aferir se é válido seriam necessários dados fundamentais como: (i) mapa planialtimétrico, (ii) indicação da geologia das secções transversais dos vales e serras do Sistema Serra da Anta, mostrando o tipo das rochas e sua estrutura e (iii) o sistema e o grau de falhamento.

Além disso, é preciso considerar que os tremores de terra provocados pelas detonações na mina poderão abrir novas falhas e influenciar negativamente no modelo. Isso é altamente provável de ocorrer, principalmente à medida em que a mina se aprofunda, encontrando rochas mais duras.

Os desequilíbrios hidrogeológicos que serão causados (e que foram simplesmente mencionados pelo relatório da SUPRAMNOR, sem qualquer comentário ou discussão) poderão influir no modelo de contaminação. A hidrogeologia, em qualquer situação, é um sistema em equilíbrio (infiltração, sentido e velocidade de migração de fluidos, franja capilar, evaporação, saturação das rochas, nível do freático, permeabilidade e porosidade das rochas, fraturamento das rochas). Quando se interfere no sistema, o sistema busca o reequilíbrio, alterando todos os fatores intervenientes. Isto leva, infalivelmente, à alteração do equilíbrio geoquímico (ou hidroquímico). Por exemplo, elementos até então confinados a um ambiente podem migrar para fora dele; ou a oxidação de minerais presentes nas rochas, como os sulfetos e o arsênio, pode ser acelerada; ou elementos até então dissolvidos podem ser precipitados etc.

O arsênio dissolvido nos rejeitos pode alcançar o aquífero profundo, e migrar para bacias vizinhas. É por isto mesmo que uma barragem de rejeitos exige cuidados preventivos excepcionais. No caso em questão, a barragem da RPM, eles não permitem à sociedade certificar-se de que esses cuidados foram tomados. Acreditamos, pois, que a empresa faz pouco caso deles. Como o empreendimento foi conduzido por engenheiros, a preocupação maior foi com a engenharia civil. Afinal, se a barragem romper, a empresa talvez tenha que fechar as portas. Mas como é a própria empresa quem faz o monitoramento da contaminação, isto é uma questão de menor importância (para a empresa) e, quase certamente, dados comprometedores são escamoteados.
 
O bombeamento da água dos poços tubulares em torno da mina pode gerar um fluxo subterrâneo de água contaminada a partir dos reservatórios de rejeitos da mineração. Sempre que se abre um poço, este se torna um ponto de alívio de pressão para onde migra a água que satura as rochas e a que percola as fendas subterrâneas. O grande problema é que, como tudo em geologia, a migração é lenta e, tendo-se em conta a distância entre a barragem e as zonas urbanas e rurais adjacentes, isto demora a ser detectado. Os dados têm que ser colhidos em pontos de proximidade decrescente a partir da barragem, a intervalos regulares, para que, através de análise matemática se possa observar a marcha da migração dos contaminantes e assim prever se ela poderá tornar-se um risco. Como se sabe, isto não é feito, pelo menos não é feito por instituição idônea, não comprometida com a empresa.
 
Nos debates que têm se travado, quase não se fala da cava, que representa riscos muito sérios. É um absurdo que a empresa não tenha aberto poços de monitoramento em torno da zona urbana, na parte que divide com a cava, e entregue esse monitoramento ao órgão ambiental do Estado ou da municipalidade. Será uma cava profunda até ao final do jazimento cubado. É possível que novas cubagens sejam realizadas em níveis mais profundos, não podemos dizer com certeza porque não tivemos acesso ao mapa geológico da mina, mas é uma possibilidade que precisa ser considerada.

Num primeiro momento, a cava não representará risco de contaminação por migração de fluidos. Ao contrário, tenderão a migrar para a cava os fluidos oriundos da zona da barragem e do subsolo da cidade. Provavelmente, a água será retirada para abastecer a usina de beneficiamento. O que isto representa? Em termos de contaminação da água subterrânea de Paracatu, nada. Mas, para os poços de água que existem na zona urbana de Paracatu será o seu fechamento.

O mecanismo é simples, a água subterrânea sempre migra para baixo, se existir uma zona de descompressão. Tomando-se em consideração o diâmetro e a profundidade da cava da RPM, muito abaixo do lençol freático da zona urbana, é possível presumir o que acontecerá num segundo momento, quando a jazida for exaurida.

Quando a jazida for exaurida e a cava começar a encher-se de água, acontecerá o inverso do que foi descrito acima: à medida que a água subir de nível tenderá, por pressão, a reocupar os espaços vazios das rochas subterrâneas nas imediações. Que água é esta? Uma mistura de líquidos contaminados vindos da barragem, líquidos contaminados a partir da lixiviação na área da cava e água pluvial. Se por acaso os poços de água subterrânea na área da cidade voltarem a ser produtivos, certamente não fornecerão água potável, mas água poluída. E na cava teremos um lago de enxofre, arsênio e outros elementos químicos nocivos.

Neste momento, a população de Paracatu terá perdido mais de 20% de sua água potável, a não ser que escolha morrer de câncer e outras doenças, causadas por consumo de água contaminada por arsênio. Vinte por cento é a proporção da água de poços tubulares de abastecimento público do assentamento urbano de Paracatu. Essa porcentagem não inclui as dezenas de poços particulares em operação, que são mais difíceis de controlar.
Neste momento, a demanda sobre as águas superficiais do Vale do Acangaú (Ribeirão Santa Isabel) e a demanda sobre as águas superficiais do Vale do Machadinho (Ribeirão Santa Rita) irá aumentar. Grande azar e motivo de lamentação, porque o Santa Isabel está secando [14] e o Vale do Machadinho estará para sempre aterrado e contaminado com os rejeitos tóxicos da mineradora.

2. Em certo ponto, o relatório afirma: "Os critérios de projeto dependem da classificação da barragem relativa às potenciais conseqüências incrementais de sua ruptura (potenciais perdas de vida e danos sócio-econômicos, financeiros e ambientais). De acordo com as Diretrizes da CDA, as barragens da Bacia do Eustáquio deveriam ser
classificadas como tendo conseqüências de ruptura de “Alta” (algumas fatalidades, grandes danos) a “Muito Alta” (grande número de fatalidades, danos extremos). A integridade da barragem deve ser mantida sob todas as cargas esperadas, condições de percolação e outras condições como deformações e erosão (PCA, fl. 357)." No
restante do relatório, nada permite supor que critérios adequados a estes riscos foram observados. Por exemplo, que providências foram tomadas para salvaguardar a reparação dos danos? Que depósitos-caução? Zona de amortecimento a jusante? Consequências do rompimento e custos das medidas mitigadoras e reparadoras?

3. Não está claro de onde virá o material para a construção da barragem. Falam em usar rejeito, depois fala-se em usar material argiloso, depois deixam em suspenso. Isso não é trivial. Uma barragem como essa consome milhões de toneladas de material. Há anos estamos assistindo, incrédulos, indignados e impotentes, a uma romaria de caminhões carreando terra e cascalho de áreas vizinhas à mina, inclusive em APP, fenômeno que estende o impacto ambiental da barragem para grandes distâncias. Nada disso foi considerado, avaliado, quantificado.

4. "Conforme consta na Resolução CONAMA nº 369, de 28 de março de 2006, em seu Artigo 2, “... O órgão ambiental competente somente poderá autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em APP, devidamente caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e prévio, e atendidos os requisitos previstos
nesta resolução e noutras normas federais, estaduais e municipais aplicáveis, bem como no Plano Diretor, Zoneamento Ecológico-Econômico e Plano de Manejo das Unidades de Conservação, se existentes, nos seguintes casos: I - utilidade pública: ... c) as atividades de pesquisa e extração de substâncias minerais, outorgadas pela autoridade competente, exceto areia, argila, saibro e cascalho;...” ” Aqui encontramos outros erros. Em primeiro lugar, não se pode considerar uma barragem de rejeitos como coisa de utilidade pública, e muito menos se essa barragem for construída em local de utilidade pública para o abastecimento de água, como tem sido o Vale do Machadinho, desde o século 18. Uma barragem dessa nem chega a ser uma "inutilidade pública", ela é um enorme problema público, um dano ao patrimônio público. De outro lado, o argumento da exploração mineral não se aplica sensu strictu, porque nenhum mineral será explorado no Vale do Machadinho, com exceção da água que, como vimos é de utilidade pública para o uso humano prioritário. Querem usar a água do vale e ainda usar o vale como depósito de rejeito mineral obtido em outro lugar, destruindo-o para sempre para o uso prioritário humano.

5. O relatório afirma que "o empreendimento já possui outorga, aprovada na reunião do CERH realizada em dezembro de 2007. A emissão do Certificado de Outorga ocorreu em 02 de abril de 2008, por meio da Portaria nº 109/2008 (fls. 551 a 554)." Entretanto não informa a vazão total outorgada pelo IGAM para Rio Paracatu Mineração, CNPJ 20.346.524/0001-46. Há pontos de captação outorgados no Córrego Santo Antônio, Ribeirão Santa Rita, Ribeirão São Pedro, afluente do Córrego São Domingos e também no Córrego do Eustáquio. Somente conseguimos a informação de vazão deste último ponto. Por razão desconhecida, as portarias 01535/2006, 01536/2006 e 01537/2006 não especificam as vazões autorizadas. Já encaminhamos um pedido de informações ao IGAM, até agora sem resposta.

O relatório da mineradora de 2003 [3] indica que, naquele ano, metade de toda a água utilizada pela mineradora era "água nova" captada nos rios da região, e o restante era água de chuva e água reciclada da barragem de rejeitos. E agora, com o projeto de expansão? Sabemos que vão triplicar o volume de água, porque vão triplicar a capacidade de processamento de minério, e uma coisa é diretamente proporcional a outra. Vão desviar a água nova dos nossos agricultores e irrigantes, para sujar na mina. É um absurdo e um abuso sem fim!

6. "Com acúmulo de água novas espécies de fauna, principalmente aves aquáticas serão atraídas para região, trazendo enriquecimento da biodiversidade. Fato este já observado na barragem atual." Aqui os relatores não se preocuparam com os efeitos da contaminação ambiental sobre a fauna. Sabe-se, por exemplo, que arsênio afeta a capacidade reprodutiva de aves e outros animais, seja interferindo no eixo hormonal, seja interferindo na resistência dos ovos. Então, na verdade, estamos falando em uma armadilha para a fauna, e não em um aumento da biodiversidade. Se nem nós, humanos, fomos avisados dos riscos do arsênio, o que dizer das aves que inadvertidamente se interessarem pela barragem de rejeitos? E as crianças que vão nadar e pescar lá, como já cansamos de ver na barragem velha, e vão se intoxicando com arsênio?

7. O relatório faz a seguinte avaliação simplória e equivocada dos impactos sobre o meio antrópico (Sócio-econômico):

“• Incremento no nível de emprego municipal.
• Incremento no nível de renda.
• Incremento no nível de arrecadação municipal.
• Incômodos à população - Tráfego de veículos e circulação de pessoas.
• Intervenções sobre ocorrência arqueológica e antropológica.”

Talvez eles tenham se baseado na metodologia equivocada e falaciosa de análise econômica da empresa, denunciada por Serrano Neves de forma clara e acessível ao cidadão comum em http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/anatomia-da-exploracao.html.

Na verdade, vários estudos [15] apontam para um cenário sócio-econômico de Paracatu que é bem diferente daquele que foi apontado pela mineradora e aceito sem críticas pelos relatores da SUPRAMNOR: baixa participação da mineração na contribuição geral de arrecadação (4%) e emprego (6%), além de insuficiência da arrecadação para fazer face aos impactos de médio e longo prazos, geradores de ônus ao erário público, e geradores de pobreza.

Não basta incrementar a arrecadação municipal, se o incremento é desproporcionalmente menor que os passivos gerados (custos de manutenção das barragens, custos de tratamento de água, custos com saúde, perdas de vidas, perdas de oportunidades em outros negócios, desvalorização patrimonial, etc.). Não basta gerar 6% dos empregos formais insustentáveis, e destruir 18% dos empregos informais sustentáveis (agricultores, pecuaristas, coletores, turismo, lazer, etc.). Nossa estimativa é que para cada emprego formal gerado pela mineradora, pelo menos 3 empregos informais são destruídos.

Uma tese de doutorado defendida na Universidade de Brasília [16] examinou os dilemas do desenvolvimento sustentável a partir de uma base mineira. A economia de Paracatu já não é mais de base mineira (a contribuição da mineração na economia do município é de apenas 4%, e apenas 6% dos empregos formais), mas assim mesmo o caso da cidade foi estudado na tese. A autora encontrou aumentos significativos de neoplasias, transtornos mentais, má-formação e lesões nos municípios mineradores estudados, em comparação com municípios-controles. Reconheceu que a atividade mineradora em Paracatu compromete vastas áreas, em um território onde o custo de oportunidade do uso do solo (e acrescentamos: da água) é alto, por causa dos usos alternativos do solo (e da água) no agronegócio e na própria ocupação urbana. Numa análise de cluster de um índice de crescimento econômico, Paracatu situou-se bem abaixo de municípios mineradores como Parauapebas (PA) e Itabira (MG). A autora afirma categoricamente: “No município de Paracatu, é baixo o peso da mineração na economia local”. O PIB per capita de Paracatu situa-se abaixo do PIB per capita do município vizinho não minerador de Unaí, e a taxa de crescimento deste índice na cidade de Paracatu entre os anos de 1970 e 2003 tem sido menor do que a taxa de Unaí. A taxa de crescimento populacional de Paracatu é superior à taxa de crescimento populacional de Unaí. Em 2000, 42% da população estava ocupada em Unaí, contra apenas 37% da população de Paracatu. Em 2006, a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) per capita era de R$34,00 em Paracatu, contra R$489,00 em Mariana (MG), R$310,00 em Itabira (MG), R$551,00 em Parauapebas (PA) e R$920,00 em Canaã dos Carajás (PA). Numa classificação de municípios mineradores de acordo com fatores de crescimento e desenvolvimento, Paracatu situa-se no mesmo nível de desenvolvimento que Crixás (GO), e num nível de desenvolvimento pouco menor que o de Itabira, mas Itabira apresenta um crescimento muito maior. Apesar de Paracatu crescer mais que Forquilhinha (SC), o município está muito abaixo de Forquilhinha no que diz respeito ao índice de desenvolvimento. Na análise de cluster, o índice de desenvolvimento de Paracatu foi menor do que os de Forquilhinha (SC), Corumbá (MS), Mariana (MG), Itabira (MG), Santa Bárbara (MG) e Minaçu (GO). Em 2000, Paracatu ocupava a 205ª posição no ranking de IDHM-Índice de Desenvolvimento Humano Municipal entre todos os municípios do Estado de Minas Gerais. Apesar de o município ter subido 9 posições no ranking estadual do IDHM no período de 1991 a 2000, esse avanço não pode ser atribuído à mineração propriamente dita, nem ao aumento do nível de renda. Ele foi provavelmente decorrente da migração de pessoas mais qualificadas para a cidade, e não o reflexo de um desenvolvimento endógeno sustentável. No período de 1991 a 2000, Paracatu conseguiu reduzir a pobreza, medida em termos da redução do percentual de pessoas com renda abaixo de R$75,50 (47,43% da população era considerada “pobre” em 1991; 37,42% era considerada “pobre” em 2000). Entretanto, nesse nível de pobreza, que mais adequadamente descreve “miséria”, essa redução não pode ser atribuída à mineração, e sim aos programas de assistência social do governo federal. Outros índices, como a concentração da renda, provavelmente dão uma melhor dimensão do empobrecimento da cidade. E realmente houve aumento da concentração de renda em Paracatu no mesmo período analisado. O município de Paracatu não conseguiu conciliar baixo nível de pobreza com alta taxa de ocupação e baixa concentração de renda. Paracatu apresentou alta concentração de renda e gastos com saúde altos relativamente a outros municípios mineradores. O benefício da CFEM foi identificado como muito inferior aos danos causados pela mineradora ao município.

8. Os "programas sociais" da mineradora, pretensamente “mitigadores de impacto” são obras-primas da hipocrisia e da técnica de dominação. Os colonizadores fizeram escola, distribuindo espelhinhos como presentes para os índios. Conhecemos os "programas sociais" desta mineradora. São migalhas que servem para controlar e humilhar uma população pobre, explorada, escravizada. Nenhum desses programas tem real valor mitigatório, compensatório ou reparatório.

9. Os relatores reconhecem que o "desmate causará a alteração e extinção de cursos d’água, modificando negativamente a qualidade ambiental local e alterando o microclima local e da cidade de Paracatu, com perda da biodiversidade". Está inconsistente com uma afirmação anterior de que haveria aumento da biodiversidade. Depois eles aceitam a compra da Fazenda Garricha e da Fazenda Córrego Rico como medidas compensatórias. Conhecemos estas áreas, inclusive porque uma delas (Fazenda Garricha) ficou em comodato com a Fundação Acangaú durante 6 anos, para a preservação ambiental. Estas áreas já estão em bom estado de conservação, inclusive a Fazenda Garricha está incluída na Área de Proteção Especial (APE) de Paracatu. Então que medida compensatória é essa? Adquirir áreas que já estão em bom estado de conservação? Simplesmente muda a rubrica do proprietário, mas a compensação não foi efetivada. Os relatores da SUPRAMNOR sequer tiveram o cuidado de exigir que essas áreas fossem transformadas em RPPNs-Reservas Particulares de Patrimônio Natural da empresa, obrigando a mineradora a cuidar delas permanentemente. Ou será que eles vão transferir o ônus da manutenção dessas áreas para o Estado, que não dá conta nem das próprias unidades de conservação?

10. Não se discutem as alternativas técnicas e locacionais obrigatórias para o projeto do lago de rejeitos sobre as nascentes do Vale do Machadinho e os tanques específicos de cianeto e arsênio nas imediações da mina, verdadeiras “bombas mortais de efeito retardado”. Na verdade, a opção "matar nascente" não é a única para a mineradora, esta seria apenas a opção mais barata. Empresas mineradoras ricas como a transnacional canadense RPM/Kinross jamais fechariam as portas de uma mina avaliada em 15 bilhões de dólares, por causa de um problema técnico envolvendo a destinação de rejeitos. Foi a própria mineradora que afirmou que existem alternativas técnicas para o projeto da nova barragem de rejeitos que ameaça destruir as mais importantes nascentes de abastecimento público da cidade no Vale do Machadinho. "Caso não se chegue a um acordo sobre o uso da área, a empresa irá buscar alternativas técnicas para a implantação de uma nova barragem", afirmou a empresa, em nota divulgada dia 7 de abril pela Folha Online [17]. Noventa e três por cento (93%) das mais de mil pessoas que votaram na enquete do site www.alertaparacatu.blogspot.com, iniciando no mês de maio de 2009 até a data de hoje, foram a favor da proteção das nascentes do Vale do Machadinho. Mas o relatório da SUPRAMNOR está apoiando a destruição dessas nascentes. O que aconteceu?

11. Sobre a drenagem ácida [18] e as preciosas toneladas de calcário agrícola que serão sacrificadas numa tentativa de neutralizar parte da acidez, durante algum tempo, nenhuma palavra no relatório da SUPRAMNOR.

12. Os relatores do SISEMA aceitam o "auto-monitoramento" da empresa,
selando esta farsa: Um placebo customizado para a Kinross Gold Corporation, um veneno encomendado para a população de Paracatu.

13. Apesar das perdas e danos e do gigantesco passivo sócio-econômico-ambiental causado pelas atividades da RPM/Kinross em Paracatu, licenças estão sendo concedidas pelos governos federal, estadual e municipal, sem o conhecimento ou a exigência de um plano de fechamento de mina que garanta as indenizações adequadas à gravidade do caso, segundo as necessidades de Paracatu, e não simplesmente de acordo com o que a RPM/Kinross julga ser adequado.

A Kinross Gold Corporation destina fundos do seu fluxo de caixa operacional para os custos de reabilitação e fechamento da mina. As atividades de reabilitação executadas depois que a mina completar suas operações são financiadas pelo portfólio das minas em operação da Kinross no mundo [1], e não por garantias financeiras reais no Brasil.

A Kinross contabiliza as obrigações de reabilitação de acordo com práticas geralmente aceitas no Canadá e nos EUA. Para Paracatu, por exemplo, isso significa que a Kinross está declarando o valor líquido presente (a taxa de desconto é baseada no custo de capital para a Kinross) do custo total de reabilitação estimado pela própria Kinross para todos os danos, como uma obrigação ou passivo de longo prazo [1].

Os fluxos de caixa da Kinross são baseados nos planos de vida útil da mina estimados a partir do seu modelo de recurso e reserva descrito no seu próprio Relatório Técnico [1]. A Kinross considera o modelo financeiro confidencial e não incluiu detalhes do modelo no corpo deste relatório. Os modelos financeiros de Paracatu podem ser disponibilizados sob a vigência de um termo de confidencialidade a ser executado com a Kinross [1]. Ou seja, o assunto é sigiloso. O povo que sofre os impactos da mineradora não tem o direito de saber o quanto a Kinross vai destinar para o fechamento da mina, e precisa pedir licença para a transnacional, se quiser saber de alguma coisa. Ficamos à mercê da boa vontade da mineradora. Deveria ser exatamente o oposto! Nós e nossos representantes é quem deveríamos estipular o que deveria ser feito e o quanto deveria ser pago ou garantido, já que é o governo brasileiro quem está concedendo as licenças de exploração, e o povo é que sofre as consequências. Na falta dessa exigência, fica o dito pelo não dito, abre-se o caminho para a mineradora fazer o que bem entende, inclusive dar o calote.

Nossas análises indicam que não está nos planos da mineradora arcar com os passivos das suas atividades em Paracatu, estimados pelas nossas estimativas na casa dos bilhões de dólares, mais do que o valor do lucro que será auferido pela mineradora, o que torna inviável o projeto de expansão da mina de Paracatu [15]. Na iminência de calote da mineradora, é obrigação dos governos exigir um depósito-caução para garantir a reparação dos danos, a substituição das atividades danosas por outras atividades sustentáveis e iniciar desde já a recuperação econômica de Paracatu, tudo segundo a sistemática e as necessidades ditadas pela comunidade, e não pela mineradora transnacional.

Paralelamente, é preciso suspender as licenças e buscar alternativas de socorro financeiro, político e tecnológico emergencial, como o Banco Mundial, a OMC e as Nações Unidas, conforme já iniciamos e agora deverá ser acompanhado pela sociedade e pelos governos federal, estadual e municipal [19].


Referências e notas:

[1] Henderson RD. 2006. Paracatu Mine Technical Report. Kinross Gold Corporation, July 31, 2006. Disponível na internet em: http://www.kinross.com/operations/pdf/Technical-Report-Paracatu.pdf

[2] Arsênio é considerado o “rei dos venenos”, porque não tem cheiro nem gosto e é absorvido imperceptivelmente pelo organismo, onde se acumula e causa uma série de doenças, inclusive o câncer. O arsênio é absorvido principalmente por inalação ou ingestão. Um grama de arsênio é suficiente para matar rapidamente até 10 pessoas adultas. A exposição de longo prazo a doses bem menores de arsênio (na escala de microgramas/dia, ou seja, na faixa das milionésimas partes de um grama) provoca o acúmulo do veneno nos tecidos do corpo, causando uma série de doenças e morte: aterosclerose, diabetes, hipertensão, anemia, neuropatia periférica, doenças cardíacas, lesões renais, confusão, cefaléia, transtornos hepáticos, despigmentação ou hiperpigmentação (manchas de pele) e hiperceratose (calos, cascões na pele, nas palmas das mãos e nas plantas dos pés). O câncer é um fenômeno tardio decorrente da exposição crônica ao arsênio, e pode acometer vários tecidos e órgãos do corpo, como pele, pulmões, rins, fígado, etc. Os riscos de câncer após ingestão ou inalação de arsênio são semelhantes (Smith AH, Ercumen A, Yuan Y, Steinmaus CM. 2009. Increased lung cancer risks are similar whether arsenic is ingested or inhaled. Journal of Exposure Science and Environmental Epidemiology 19, 343–348). Geralmente leva mais de 10 anos para o câncer causado por arsênio se manifestar. E mesmo pessoas que estiveram expostas ao longo prazo ao arsênio e se afastaram da fonte de exposição há muitos anos, continuam com risco aumentado de desenvolver câncer. As crianças constituem o grupo mais sensível e mais vulnerável à exposição crônica ao arsênio, porque o arsênio se acumula mais rapidamente no seu organismo. Alguns estudos mostram que crianças expostas cronicamente ao arsênio podem ter uma perda de capacidade mental de até 20%.

[3] www.riotinto.com-documents-ReportsPublications-2003_socEnv_Brazil.mdi

[4] Ferreira IN, 2008. Busca ativa de hanseníase na população escolar e distribuição espacial da endemia no município de Paracatu. – MG (2004 a 2006). Tese de doutorado, Universidade de Brasília – UnB, Faculdade de Ciências da Saúde. Resumo publicado por Ferreira IN, Evangelista MSN e Alvarez RRA, na Revista Brasileira de Epidemiologia, vol.10 no. 4 São Paulo Dec. 2007, acessível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1415-790X2007000400014&script=sci_arttext. Este estudo revelou uma elevada incidência de lesões cutâneas entre as crianças e adolescentes de Paracatu. Quase a metade (43,6% ou 7.450) dos estudantes examinados apresentaram algum tipo de lesão de pele. Por exemplo, os autores encontraram 1.898 estudantes (11,42% do total das crianças e adolescentes examinados) com discromias (nevus, etc.) e 900 estudantes com dermatoses papulo-vesicobolhosas (5,41% do total das crianças e adolescentes examinados). Em contraste, os autores estabeleceram o diagnóstico de hanseníase em "apenas"  68 estudantes, o que já foi o bastante para caracterizar uma hiperendemia de hanseníase na cidade de Paracatu. Apesar de os autores não terem considerado a possível intoxicação crônica por arsênio e outros metais liberados pela mineração a céu aberto na cidade, é sabido que a intoxicação crônica por arsênio pode provocar, em algumas pessoas geneticamente predispostas (i.e., pessoas metabolizadoras lentas de arsênio), o aparecimento de lesões de pele de grau e aparência variáveis, desde discromias, até lesões escamosas e ceratoses. Neurites também são descritas, o que impõe o diagnóstico diferencial com hanseníase. Não estamos sugerindo que os casos que foram diagnosticados como hanseníase representem casos de intoxicação crônica pelo arsênio, mesmo porque não há elementos no trabalho de Ferreira e colaboradores que permitam esta conclusão. "O exame definidor de diagnóstico foi o da avaliação dermatológica, realizada em todos os pacientes, identificando alterações de sensibilidade nas lesões (cutâneas) encontradas nos mesmos" (Ferreira IN, tese). Apenas consideramos uma feliz circunstância que o trabalho de pesquisa ativa da hanseníase em Paracatu tenha identificado uma alta prevalência de lesões de pele não-leprosas: quase 1/5 dos estudantes examinados apresentaram algum tipo de lesão de pele nas categorias "discromias" e "dermatoses papulo-vesicobolhosas". Este achado, associado à comprovada presença de arsênio em doses elevadas na cidade de Paracatu, proveniente da mina de ouro a céu aberto na cidade, constituem uma forte indicação de intoxicação crônica por arsênio e uma justificativa muito forte para que estudos epidemiológicos clínico-laboratoriais e atuarias da intoxicação crônica por arsênio e metais pesados sejam conduzidos em Paracatu.

[5] Raie RM. 1996. Regional variation in As, Cu, HG, and Se and interaction between them. Ecotoxicology and Environmental Safety 35:248-252.

[6] http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/quando-como-e-por-que-o-arsenio-acumula.html

[7] Veja sinais do envenenamento fotografados em Paracatu: http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/09/envenenamento-foografado.html

[8] Exemplos do comportamento inescrupuloso, agressivo, corruptor e homicida da Kinross Gold Corporation no Brasil e no mundo:
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/transnacional-canadense-quer-envenenar.html
http://www.augustreview.com/issues/globalization/trilateral_plan_to_corner_world_gold_market?_20081209107/
http://www.augustreview.com/issues/globalization/the_trilateral_commission%3a_usurping_sovereignty_2007080373/
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/o-loteamento-do-congo-por-empresas.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/perseguicao-aos-quilombolas-de-paraciso.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/o-devastador-efeito-kinross.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/canadense-kinross-ameaca-matar-milhares.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/refusing-gold.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/paracatu-17-de-maio-de-2009-o-perigo.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/lagrimas-de-crocodilo.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/historias-mal-contadas-por-sergio-ulhoa.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/rpmkinross-mente-sobre-o-filme-ouro-de.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/producao-de-ouro-pela-rpmkinross-e.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/kinross-gold-mine-at-paracatu-brasil.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/mineradora-estrangeira-nega-que-pratica.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/paracatu-23-de-abril-de-2009-governo.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/anatomia-da-exploracao.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/ouro-de-sangue-abortado-na-tv.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/12/kinross-digging-its-own-grave-in-south.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/11/pacincia-acabou.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/08/minerao-poltica-e-alienao-em-paracatu.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/01/pagamentos-facilitadores.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2007/12/os-prmios-de-um-juiz.html

[9] http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/relatorio-independente-implica.html

[10] PROTOCOLO Nº 320065/2009 da SUPRAMNOR, acessível em: http://200.198.22.171/down.asp?x_caminho=reunioes/sistema/arquivos/material/&x_nome=ITEM_5.1_-_PU_-_Rio_P._Minera%E7%E3o_S.A.pdf

[11] http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/07/insustentvel-leveza-da-poeira-venenosa.html

[12] Yuan Y, Marshall G, Ferreccio C, Steinmaus C, Selvin S, Liaw J, Bates MN, Smith AH. 2007. Acute myocardial infarction mortality in comparison with lung and bladder cancer mortality in arsenic-exposed Region II of Chile from 1950 to 2000. American Journal of Epidemiology 166:1381–1391.

[13] WHO. 2001. United Nations Synthesis Report on Arsenic in Drinking-Water. By various authors. Accessible from: http://www.who.int/water_sanitation_health/dwq/arsenic3/en/
Highlights of this report having bearing on the Paracatu case are accessible from: http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/united-nations-synthesis-report-on.html

[14] http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/ribeirao-santa-isabel-esta-secando.html

[15] Ensaios sobre a pobreza de Paracatu causada e agravada pela mineração da RPM/Kinross.
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/anatomia-da-exploracao.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/05/quem-pagara-conta-quando-mina-fechar.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/uma-conta-espetada-no-morro.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/o-povo-aumenta-mas-nao-inventa.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/03/nao-abusem-da-nossa-pobreza.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/09/expanso-da-kinross-em-paracatu-pior-do.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2007/12/por-que-continuarmos-pobres-e_17.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2007/11/um-conselho-por-um-dlar.html

[16] Enríquez, MARS. Maldição ou dádiva? Os dilemas do desenvolvimento sustentável a partir de uma base mineira. Tese de Doutorado, Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. 2007, 449 páginas.

[17] http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/04/pobreza-desinformacao-e-medo-em.html

[18] http://alertaparacatu.blogspot.com/2008/06/drenagem-cida-um-dos-problemas-da-mina.html

[19] http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/letter-to-world-banks-president-mr.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/world-trade-organization.html
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/letter-to-world-health-organization.html

Greve de funcionários afeta produção de ouro da Kinross

8 de Julho de 2009

Greve de funcionários afeta produção de ouro da Kinross

Os funcionários da Compania Minera Mantos de Oro, uma subsidiária da Kinross
no Chile, iniciaram greve na mina de La Coipa, depois que as partes não
conseguiram chegar a um acordo nas negociações coletivas. A greve afeta a
produção de aproximadamente 300 onças equivalentes de ouro por dia da
operação de La Coipa. A companhia está buscando uma solução que seja justa e
aceitável pelos funcionários, para que eles possam voltar ao trabalho de
produção o mais rápido possível.

Fonte:
http://www.marketwire.com/press-release/Kinross-Gold-Corporation-TSX-K-1014775.html
--
Sergio Ulhoa Dani
Tel. 00(XX)49 15-226-453-423
srgdani@gmail.com

23 de Julho de 2009

Funcionário da RPM/Kinross em Paracatu: veja o que acontece no Chile, onde os funcionários da Kinross de lá (Mina da Companhia Mantos de Oro, subsidiária da Kinross em Copiapó, Chile) têm coragem de fazer greve e o Sindicato apóia!

Além de já oferecer abono de férias (55% do salário base) e outras bonificações e gratificações (festas pátrias, natal, continuidade operacional etc.) a companhia fez a seguinte proposta para retorno dos grevistas ao trabalho:

1. Aumento real de salário base sobre o IPC de 2,25%;

2. Aumento de pagamentos fixos mensais, incluindo: (i) um aumento de 25% na bonificação do turno noite (atendendo a uma exigência do Sindicato dos Trabalhadores do Chile); (ii) um adicional mensal de insalubridade; (iii) um aumento de 17% na bonificação de continuidade operacional;

3. Aumento das remunerações variáveis, incluindo aumentos das bonificações por produção e economia de custos;

4. Aumentos de 4% a 9% dos valores concedidos a título de bolsas de estudo aos trabalhadores da mina e seus familiares;

5. Bônus de reintegração ao trabalho.

Retirado do site da empresa:

http://www.mdo.cl/volante%208%20mdo.pdf

Gerente geral da Kinross em Paracatu é demitido?


Gerente geral da Kinross em Paracatu é demitido

Por WebRepórter (*), adaptado para o AlertaParacatu

Sete meses após ter assumido o posto mais alto da mineradora em Paracatu-MG,
Jairo Leal deixa a função

Na tarde desta terça-feira (07 de julho) a Kinross comunicou a demissão do
Gerente Geral da empresa em Paracatu, Jairo Leal.

Contratado há apenas 7 meses para substituir Victor Hugo Belo nas funções de
gerente-geral da mina de ouro de Paracatu, Jairo Leal encontrou uma empresa
imersa em problemas decorrentes do plano de expansão da mineradora. Não
bastase as dificuldades técnicas que ameaçam a viabilidade do plano de
expansão da mina, como as barragens de contenção de rejeitos tóxicos e a
operação de um gigantesco moinho SAG, a empresa enfrenta fortes denúncias de
contaminação do ar e da água e a ameaça de destruição de fontes de
abastecimento público de água potável da cidade pelo aprofundamento da cava
da mina e a construção de um novo lago de rejeitos tóxicos.

Em Paracatu ouviu-se dizer que as razões da demissão de Jairo Leal foram
"dificuldades encontradas nas questões particulares da unidade de Paracatu",
que possui "características bem diferentes daquelas já conhecidas pela
multinacional canadense". Como Jairo Leal possui vasta experiência em
mineração, tendo atuado na Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores do
mundo, as especulações sobre as reais causas de sua demissão são
inevitáveis.

A mina de ouro da Kinross em Paracatu está situada dentro da cidade, o que
causa impactos significativos para a população de 90 mil habitantes.

As rochas da mina possuem o mineral arsenopirita, que libera arsênio durante
o processo de mineração. Arsênio é substância cancerígena. Como a
concentração de ouro no minério é a mais baixa do mundo (0,4 g/tonelada), a
Kinross precisará processar mais de um bilhão de toneladas de minério em 30
anos de operação (40 a 60 milhões de toneladas/ano) a fim de tornar a mina
economicamente viável.

Críticos do projeto de expansão, como a Fundação Acangaú, denunciam que os
passivos gerados pelo projeto tornam a operação inviável.

(*) http://paracatu.esquiro.kinghost.net/index.php?act=noticias&nid=321
--
Sergio Ulhoa Dani
Tel. 00(XX)49 15-226-453-423
srgdani@gmail.com

O FEDOR DO ANIQUILAMENTO


O FEDOR DO ANIQUILAMENTO

* Por Sandro Neiva

Em Paracatu tudo se parece a um convento de freiras Carmelitas, nada é tão
amargo quanto se apregoa nem nada é tão doce como se insinua. A vida se
assemelha a uma salada de frutas feita por um monstro cego ou a um balão
inflado por um tuberculoso, onde naturalmente, existem perigos para todos os
gostos e para todos os lados, até mesmo dentro dos muros da filosofia, por
sobre os elevadores imaginários da intelectualidade.

Canalhice é o que não falta. Os mais incautos não percebem a dialética dos
verdugos, a dissimulação dos abutres, o jogo dos rufiões, assim como seus
disfarces e prognósticos para conservar as chaves do poder, garantir seu
quinhão no bolo e seguir engendrando ilusões e ficções para um rebanho
amorfo.

A cidade às vésperas de um linchamento? Só se for linchamento contra os
direitos das comunidades quilombolas e camponeses do Vale do Machadinho.

Linchamento operado pela mineração aos historicamente abandonados pelo poder
público. Não creio que o cidadão paracatuense tenda a fazer justiça com as
próprias mãos. Cabe aqui uma frase de um pensador francês, não René Girard,
mas Charles Baudelaire: “ser pacifista é não fechar os olhos perante a
violência”. E não se trata de ser “sergiodanista ou rpmista”, como se nos
resumíssemos a esse reducionismo. Trata-se de atitude, de não querer fazer
parte desse teatro de quinta categoria.

Enquanto alguns pseudo-intelectuais, munidos de conformismo covarde em
troca de migalhas, preferem mergulhar o traseiro diante da inércia
alienadora das novelas globais com seus Juvenais Antenas da vida, outros
seguem por aí, gorduchos, disseminando a maldição de suas conjecturas, com
sua tradicional soberba, hospedando-se no Hotel Veredas e dando tapinhas nas
costas de prefeitos e vereadores, financiando veículos de comunicação e até
faculdades. Sim. Estão por aí, mais poderosos e feudais do que nunca,
triplicando o tamanho de sua devastação. O cheiro de aniquilamento é fétido.

E ele emerge das águas e do solo. Será o *gran finale?*


* Sandro Neiva é jornalista

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Era só o que faltava: arsênio chega aos rios


Era só o que faltava: arsênio chega aos rios


A revista britânica Nature, a mais tradicional e respeitada revista
científica do mundo, publicou um estudo realizado por pesquisadores da
Universidade de Stanford, em julho de 2008, que prova que o arsênio é
liberado a partir de sedimentos superficiais alagados e transportado, pelo
aqüífero subjacente, até os rios.

Os autores do estudo descrevem como alterações ou desequilíbrios
hidrológicos causados pelas atividades humanas – como a construção de uma
barragem a montante das fontes de captação de água para consumo humano –
podem aumentar a concentração de arsênio na água e consequentemente causar
sérios problemas de saúde.

Esse estudo publicado na revista Nature engrossa o conjunto de provas e
evidências de que uma barragem de rejeitos da mineração de ouro no Vale do
Machadinho contaminará as preciosas águas superficiais e profundas de
Paracatu e região, com impacto negativo na bacia do Rio São Francisco.

Referência:

Polizzotto ML, Kocar BD, Benner SG, Sampson M, Fendorf S. 2008. Near-surface
wetland sediments as a source of arsenic release to ground water in
Asia. Nature 454(7203):505-8.
--
Sergio Ulhoa Dani
Tel. 00(XX)49 15-226-453-423
srgdani@gmail.com

(OR)AÇÃO POR BANGLADESH


(OR)AÇÃO POR BANGLADESH
Geocentelha 086

Belo Horizonte, 25 de outubro de 1999

Edézio Teixeira de Carvalho
Ex-Diretor do Instituto de Geo-Ciências da UFMG

“Assisti há dias a reportagem de televisão sobre o mais grave problema ambiental afetando a saúde humana de que já tive notícia. A jornalista solicitou ao médico sanitarista uma comparação com tragédias conhecidas, como a de Chernobyl (radioatividade), a de Bhopal na Índia (gases tóxicos) e a de Minamata no Japão (contaminação por mercúrio). Respondeu ele que tais tragédias, todas provocadas por ações humanas, eram comparativamente insignificantes. Não obstante os avisos sobre a sinistra presença de arsênio em alguns poços, a água continuou a ser usada, até que terrível e mortal forma de câncer começou a atingir pessoas de todas as idades. Sem responsável participação geológica na solução, a saúde de milhões de pessoas continuará em risco e a economia do país totalmente comprometida.”

O país tem 140.000 km2 de área e mais de 120 milhões de habitantes. Sua marca fisiográfica é o delta do sistema Ganges-Brahmaputra, construído à custa da escavação dos respectivos vales no Tibete, Nepal e Índia. Os temporais das monções são violentos e já mataram milhões de habitantes (num episódio de 1970 estimativas davam conta de 600.000 óbitos). É impossível manter condições sanitárias toleráveis, porque a água está por todo lado, nos distributários do delta, nos pântanos, lagos, lagunas e muitas vezes a menos de 1m da superfície; assim praticamente inexiste solo aerado que possa absorver a contaminação dos dejetos humanos e dos animais antes que retorne a um corpo superficial de água. Malária, cólera e doenças do trato intestinal dominam o quadro da saúde infantil principalmente. O país é pouco urbanizado e isso constitui fator limitante da eficácia de medidas sanitárias centralizadas.

A plataforma geológica é instável, pela geodinâmica interna, sujeita a terremotos, embora sem atividade intensa, e principalmente pela externa, que muda a geografia local nos temporais, quando mar, Ganges, Brahmaputra, ventos e chuva entram em conflito de proporções colossais.

Com indicadores sócio-econômicos dos mais precários, não precisava de mais nada para ser considerado país refratário à construção de nação próspera. Não precisava, mas tem. Assisti há dias a reportagem de televisão sobre o mais grave problema ambiental afetando a saúde humana de que já tive notícia. A jornalista solicitou a médico sanitarista uma comparação com tragédias conhecidas, como a de Chernobyl (radioatividade), a de Bhopal na Índia (gases tóxicos) e a de Minamata no Japão (contaminação por mercúrio). Respondeu ele que tais tragédias, todas provocadas por ações humanas, eram comparativamente insignificantes.

Para evitar o consumo de águas superficiais contaminadas, o UNICEF coordenara programa de execução de poços para o abastecimento. Um milhão deles foram executados, e mais 3 milhões diretamente pela população. Não obstante os avisos sobre a sinistra presença de arsênio em alguns poços, a água continuou a ser usada, até que terrível e mortal forma de câncer começou a atingir pessoas de todas as idades. O UNICEF determinou a execução de testes sistemáticos nos poços, e, por impossibilidade de lacrá-los imediatamente, pintou de vermelho os contaminados. Determinou também a execução de 5.000 poços profundos. A jornalista perguntou a uma mulher que retirava água de um poço antigo por que não fervia a água superficial disponível. A mulher respondeu que não tinha lenha. Obviamente não tem Bangladesh capacidade hospitalar para tratar as pessoas (o que não surpreende, quando a própria Europa não dá conta de tratar todas as crianças de Chernobyl).

Se os testes levarem à condenação e fechamento de 50% dos poços, serão dois milhões de poços perdidos, que terão de ser substituídos por poços profundos, para cuja execução, que implicaria investimento em redes de distribuição, a reportagem mostra que os meios são precários.

A geologia pode contribuir das seguintes maneiras: 1) Estudando amostras de sondagens e registros geofísicos adequados, de modo a identificar as camadas portadoras de arsênio; 2) com esses dados e outros obtidos de mapeamento, determinando as correlações que os vinculam à área fonte do perigoso elemento, nas bacias do Ganges e Brahmaputra ou de um deles; 3) em seguida verificando se essas áreas ainda estão contribuindo com o aporte de arsênio através da erosão. De resultados dessa investigação, será possível determinar, em cada novo poço, os intervalos que devem ser isolados, evitando que a água contaminada contamine a água pura de outras camadas. Provavelmente todos os poços contaminados terão de ser desativados e tamponados, cimentados do fundo até a boca para evitar que sirvam de via de contaminação.

Se tal serviço não for feito, a execução de novos poços rasos será baseada no método(?) de tentativa e erro, ou então os sedimentos mais superficiais serão descartados de plano, eliminando possibilidade real de resolver a custo mais baixo o problema do suprimento. Não conheço as condições geológicas específicas de jazimento do arsênio nas possíveis áreas-fontes e no próprio delta, mas estou certo de que, sem responsável participação geológica na solução, a saúde de milhões de pessoas continuará em risco e a economia do país totalmente comprometida.

O caso de Paracatu: genocídio tolerado por um punhado de autoridades



O caso de Paracatu: genocídio tolerado por um punhado de autoridades

Paracatu é uma cidade de 90 mil habitantes no noroeste do Estado de Minas Gerais. Em 1987, o governo do Estado autorizou a mineradora anglo-australiana Rio Tinto a iniciar uma mineração de ouro a céu aberto dentro da cidade. Em 2004, a mina foi adquirida pela canadense Kinross Gold Corporation.

A mina de Paracatu é a mina do menor teor de ouro do mundo (0,4 g Au/tonelada minério) e portanto a da maior taxa de disposição de rejeitos. A quantidade de minério processado e despejado na barragem de rejeitos tóxicos até 2008 chegou a 300.000.000 de toneladas. A rocha minerada contém arsênio, considerado o “rei dos venenos”.

Vários estudos realizados a partir de 2006 indicam que os enormes passivos da mineração a céu aberto em Paracatu tornam esse projeto inviável e estão causando uma verdadeira catástrofe sócio-econômica e ambiental em Paracatu: destruição de um grande número de preciosas fontes de água potável; contaminação do ar, solo e água por arsênio, ácido sulfúrico e outros poluentes; incidência de doenças e mortes causadas pelo envenenamento crônico por arsênio; expulsão de comunidades tradicionais de suas terras; aumento do desemprego e da desocupação; aumento da concentração de renda e alto custo de oportunidade em uma região de economia eminentemente agrícola.

A dose de exposição diária dos habitantes de Paracatu ao arsênio da mina chega a 10 vezes o valor caucionário estabelecido pela Organização Mundial da Saúde-OMS. Os intensos falhamentos geológicos que caracterizam a região onde a mina está instalada, juntamente com o projeto de expansão desta mina magnificam a contaminação das águas subterrâneas pelo arsênio, inviabilizando seu uso para consumo humano.

A Prefeitura Municipal de Paracatu sob a gestão Vasco Praça Filho, as agências licenciadoras do Estado e o próprio Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, vêm sendo formalmente informados dessa situação, a partir de 2007. Entretanto, ambas as administrações continuam a emitir licenças para o projeto de expansão da mina da Kinross, simplesmente omitindo os enormes passivos dos relatórios, como se eles não existissem.

A expansão da mina de Paracatu vai triplicar o volume de minério processado, vai triplicar o volume de água nova captada, vai aprofundar a cava em mais de 100 metros abaixo do nível do freático e vai piorar as já insuportáveis condições da saúde em Paracatu. Após ter destruído três nascentes, a mineradora agora quer despejar 1.000.000.000 de toneladas de rejeitos tóxicos sobre as nascentes do Ribeirão Santa Rita, no Vale do Machadinho, verdadeira caixa d’água da cidade de Paracatu.

Um punhado de pessoas que hoje pertencem aos quadros do Estado de Minas Gerais, e a mineradora canadense Kinross Gold Corporation, talvez confiantes na impunidade, ensaiam os primeiros passos daquele que talvez seja o maior genocídio tolerado da história moderna do Brasil. Fonte: Fundação Acangaú. Mais informações e relatórios completos podem ser obtidos gratuitamente em www.alertaparacatu.blogspot.com.

O caso de Paracatu: genocídio tolerado por um punhado de autoridades

O caso de Paracatu: genocídio tolerado por um punhado de autoridades

Paracatu é uma cidade de 90 mil habitantes no noroeste do Estado de Minas Gerais. Em 1987, o governo do Estado autorizou a mineradora anglo-australiana Rio Tinto a iniciar uma mineração de ouro a céu aberto dentro da cidade. Em 2004, a mina foi adquirida pela canadense Kinross Gold Corporation.

A mina de Paracatu é a mina do menor teor de ouro do mundo (0,4 g Au/tonelada minério) e portanto a da maior taxa de disposição de rejeitos. A quantidade de minério processado e despejado na barragem de rejeitos tóxicos até 2008 chegou a 300.000.000 de toneladas. A rocha minerada contém arsênio, considerado o “rei dos venenos”.

Vários estudos realizados a partir de 2006 indicam que os enormes passivos da mineração a céu aberto em Paracatu tornam esse projeto inviável e estão causando uma verdadeira catástrofe sócio-econômica e ambiental em Paracatu: destruição de um grande número de preciosas fontes de água potável; contaminação do ar, solo e água por arsênio, ácido sulfúrico e outros poluentes; incidência de doenças e mortes causadas pelo envenenamento crônico por arsênio; expulsão de comunidades tradicionais de suas terras; aumento do desemprego e da desocupação; aumento da concentração de renda e alto custo de oportunidade em uma região de economia eminentemente agrícola.

A dose de exposição diária dos habitantes de Paracatu ao arsênio da mina chega a 10 vezes o valor caucionário estabelecido pela Organização Mundial da Saúde-OMS. Os intensos falhamentos geológicos que caracterizam a região onde a mina está instalada, juntamente com o projeto de expansão desta mina magnificam a contaminação das águas subterrâneas pelo arsênio, inviabilizando seu uso para consumo humano.

A Prefeitura Municipal de Paracatu sob a gestão Vasco Praça Filho, as agências licenciadoras do Estado e o próprio Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, vêm sendo formalmente informados dessa situação, a partir de 2007. Entretanto, ambas as administrações continuam a emitir licenças para o projeto de expansão da mina da Kinross, simplesmente omitindo os enormes passivos dos relatórios, como se eles não existissem.

A expansão da mina de Paracatu vai triplicar o volume de minério processado, vai triplicar o volume de água nova captada, vai aprofundar a cava em mais de 100 metros abaixo do nível do freático e vai piorar as já insuportáveis condições da saúde em Paracatu. Após ter destruído três nascentes, a mineradora agora quer despejar 1.000.000.000 de toneladas de rejeitos tóxicos sobre as nascentes do Ribeirão Santa Rita, no Vale do Machadinho, verdadeira caixa d’água da cidade de Paracatu.

Um punhado de pessoas que hoje pertencem aos quadros do Estado de Minas Gerais, e a mineradora canadense Kinross Gold Corporation, talvez confiantes na impunidade, ensaiam os primeiros passos daquele que talvez seja o maior genocídio tolerado da história moderna do Brasil. Fonte: Fundação Acangaú. Mais informações e relatórios completos podem ser obtidos gratuitamente em www.alertaparacatu.blogspot.com.


The Paracatu issue: a genocide tolerated by a fistful of authorities

Paracatu is a town of 90,000 inhabitants in the northwestern part of the State of Minas Gerais, Brazil. In 1987, the Minas Gerais State administration permitted anglo-australian Rio Tinto to initiate an open pit gold mine within the town. In 2004, the mine was acquired by Canadian Kinross Gold Corporation.

The Paracatu mine has the world’s lowest gold grades (0.4 g Au/ton ore), and thus the world’s largest tailings disposition rates. In 2008, mine tailings already amounted some 300,000,000 tons. The mine’s hard rock contains arsenic, which is considered the “king of poisons”.

A number of studies and reports have indicated, as early as 2006, that the liabilities of the Paracatu open pit gold mine are so enormous as to render this operation unfeasible. Nonetheless, the continuity of the operation is causing a true socio-economical and environmental catastrophe in Paracatu: destruction of a number of precious sources of drinking water; air, soil and water contamination by arsenic, sulfuric acid and other pollutants; chronic poisoning of the population which causes diseases and deaths, distress and plight; expelling of traditional communities from their land; increasing unemployment and disoccupation; increasing income gap and unbearably high opportunity cost imposed on an agriculture-based economy.

Daily arsenic exposure in Paracatu is in excess of tenfold the cautionary WHO daily dose limit. Intense geological faulting which characterizes the region where the mine is located together with the mine expansion project magnify the arsenic contamination of underground water, rendering the water inadequate for human consumption.

The Paracatu municipal administration under major Vasco Praça Filho and the Minas Gerais environmental agencies under State governor Aécio Neves have been formally warned about the situation, beginning in 2007. However, both administrations continue to issue permits for the expansion of the Paracatu mine. They manage to hide the enormous liabilities of this project, as if they did not exist.

The expansion of the Paracatu mine means a threefold increase in ore processing, a threefold increase in new water consumption by the mining operation, a deepening of the mining works some 100 meters below the water table, and an unbearable worsening of the health situation. Having already destroyed three important water springs by its mining operation, Kinross now intends to throw some 1,000,000,000 tons of toxic tailings on top of three precious water springs of the Santa Rita river in the Machadinho Valley – the true water reservoir of Paracatu town.

A fistful of people who belong to the Minas Gerais State administration corps and Canadian Kinross Gold Corporation are confident in their impunity. They rehearse the first steps towards the perhaps biggest tolerated genocide of modern Brazilian history. Source: the Acangaú Foundation. For further information and complete reports the reader is referred to: www.alertaparacatu.blogspot.com.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Arsênio na poeira de Paracatu - dados assustadores da própria RPM/Kinross



Prezados amigos que se importam com Paracatu e com a vida humana

Vejam que assustador: relatório de 2003 da própria RPM/Rio Tinto/Kinross (anexo) mostra que a quantidade de arsênio na "poeira fugitiva" da mina de Paracatu aumentou de 3,42 kg em 2001, para 5,79 kg em 2002, e 6,10 kg em 2003.

Isso é um verdadeiro escandalo à luz dos conhecimentos atuais! Isso significa uma exposição média de 68 mg de arsênio por habitante/ano em Paracatu. São 67.777 microgramas por
habitante/ano, equivalente a 183 microgramas por dia. Vejam no gráfico da Figura 2 de
http://alertaparacatu.blogspot.com/2009/07/quando-como-e-por-que-o-arsenio-acumula.html.


Essa dose é mais de dez vezes a dose considerada segura pela Organização Mundial de Saúde. Só esse dado já é prova de que a Kinross Gold Corporation está matando gente aos montes em Paracatu. E ainda querem triplicar o impacto, com o projeto de expansão dessa empresa
genocida.

Depois do aquisição completa da RPM pela Kinross Gold Corporation, reina o silêncio sobre o tema arsênio, que virou tabu. Durante as audiências públicas, representantes da Kinross chegaram a negar a existência de arsênio na poeira de Paracatu, conforme está gravado nas
fitas das audiências e transcrito no Jornal Alerta Paracatu, edição
especial de junho de 2008. No relatório único do SISEMA/COPAM, a
palavra "arsênio" aparece escondida, citada apenas duas vezes no rol
dos parâmetros que serão "auto-monitorados" pela transnacional
criminosa.

Confiram no relatório anexo, que também mostra que em 2003 quase metade de toda a água utilizada pela mineradora era "água nova". E agora, com o projeto de expansão? Sabemos que vão triplicar o volume de água. Vão desviar a água nova dos nossos agricultores e irrigantes,
para sujar na mina. É um absurdo e um abuso sem fim!

Atenciosamente,
Sergio Dani

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Sergio Ulhoa Dani
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segunda-feira, 20 de julho de 2009

Transnacional canadense quer envenenar preciosas fontes de água



Abuso inacreditável! Transnacional canadense quer envenenar preciosas fontes de água de beber de milhares de pessoas no Brasil

Por Sergio Ulhoa Dani (*)

A mineradora transnacional canadense, Kinross Gold Corporation, proprietária da mina Morro do Ouro, quer jogar os restos tóxicos da sua mineração de ouro na caixa d’água de 90 mil pessoas, em Paracatu, cidade do noroeste do Estado de Minas Gerais, Brasil.

A caixa d’água de Paracatu é o Sistema Serra da Anta, composto pela Serra da Anta e os seus dois vales: a oeste, o Vale do Acangaú e a leste, o Vale do Machadinho (Figura 1).


Figura 1 – Representação esquemática do Sistema Serra da Anta, num corte transversal no sentido oeste-leste. O corte mostra as diversas camadas de rochas e os dois vales que compõem o sistema: o Vale do Acangaú (oeste) e o Vale do Machadinho (leste). O Vale do Machadinho é mais estreito e mais elevado que o Vale do Acangaú.
O sistema Serra da Anta é classificado pelos geólogos como um aqüífero fissural. Isso significa que a água das chuvas que cai sobre a Serra da Anta infiltra pelas rochas e se acumula em espaços ou fissuras entre as rochas. A força de infiltração da água é chamada de “capilaridade” e ela gera pressão. A pressão da água e a força da gravidade da terra puxam a água para fora das fissuras da serra, fazendo aparecer as nascentes superficiais que alimentam os córregos do Sistema Serra da Anta. Parte da água penetra camadas mais profundas, para constituir a água subterrânea (Figura 2).

Figura 2 – Representação esquemática do fluxo das águas da chuva que caem sobre o Sistema Serra da Anta. Uma parte da água das chuvas escorre pela superfície e uma parte infiltra pelas rochas. Dessa água que infiltra pelas rochas, parte sai pelas nascentes superficiais que alimentam os córregos e outra parte infiltra mais profundamente, para constituir a água subterrânea.
Se a mineradora construir um lago de rejeitos tóxicos no Vale do Machadinho, a pressão da água do lago vai se somar à pressão da água da chuva, à força da capilaridade e à força da gravidade da terra. A força resultante vai chupar a água contaminada do lago para o Vale do Acangaú. Essa água vai trazer para o Ribeirão Santa Isabel o arsênio e outros venenos que a mineradora quer despejar no Vale do Machadinho (Figura 3).

Figura 3 – Esse esquema mostra o que poderá acontecer se a mineradora construir um lago de rejeitos no Vale do Machadinho: a pressão da água do lago vai se somar à pressão da água da chuva e à força da gravidade da terra. A força resultante vai chupar a água contaminada do lago do Vale do Machadinho para o Vale do Acangaú. Essa água vai lançar no Ribeirão Santa Isabel e no lençol freático subterrâneo o arsênio e outros venenos que a mineradora quer jogar no Vale do Machadinho. Atualmente, 80% da água de Paracatu é captada no Ribeirão Santa Isabel. O restante é captado de poços profundos.
Quem não acredita que o fenômeno descrito aqui possa acontecer, deve fazer um experimento bastante simples. Coloque um pouco de anilina colorida ou outra tinta solúvel em água num copo de água limpa. O copo com água colorida representa o lago contaminado pelo veneno da mineradora. Agora pegue um pedaço de papel de filtro de café limpo. O papel representa as rochas da Serra da Anta. Encoste o papel de filtro na água suja do copo e observe o que acontece. A água “sobe” pelo papel, carregando a poluição do copo. A água “subiu” pela serra, graças à força de capilaridade, carregando consigo a poluição do lago de rejeitos da mineradora. A água encontra caminhos que poucos podem imaginar ou suspeitar. Esse experimento tão simples prova que água sobe morro e atravessa pedra.

As autoridades e o público não podem ficar indiferentes ao risco de contaminação da água de milhares de pessoas em Paracatu. A mineradora tem que ser impedida de construir um lago de rejeitos tóxicos no Vale do Machadinho. Esses rejeitos contêm centenas de milhares de toneladas de arsênio, veneno suficiente para matar toda a humanidade, e provocar uma catástrofe ambiental de amplas proporções, como a catástrofe de Bangladesh e Bengala Ocidental.

A água do Vale do Machadinho é preciosa para Paracatu, porque é água pura de montanha que chega por queda natural ao centro da cidade. Água assim, pura e barata, é preciosa e está ficando cada dia mais difícil de encontrar. Tem que ser defendida como se fosse um patrimônio mundial da humanidade.

(*) Médico, doutor em medicina e patologia, livre-docente em genética, escrevendo de Göttingen para o www.alertaparacatu.blogspot.com, em 20 de julho de 2009.

O seu corpo encardido de veneno


O seu corpo encardido de veneno

Por Sergio Ulhoa Dani (*)

Arsênio é veneno e acumula no seu corpo, encardindo o seu corpo de um modo semelhante ao que acontece quando a sujeira encarde um pano.

Imagine que quando você nasce seu corpo é como um pano limpo. Quando o pano fica sujo, você lava o pano com água e ele volta a ficar limpo. Mas, depois de cada lavada, o pano vai ficando cada vez mais encardido, e nenhum sabão ou água consegue limpar mais o pano. Isso é o que acontece quando a sujeira acumula no pano: com o tempo, nenhum sabão, máquina de lavar ou lavadeira consegue limpar mais o pano encardido.

Aí você joga o pano fora e compra um pano novo. Mas você não pode jogar seu corpo fora e comprar um novo. Você tem que cuidar muito bem do seu corpo, para ele não ficar encardido.

Se você viver em Paracatu e respirar a poeira da mina de ouro a céu aberto, você vai encardir o seu corpo com arsênio, assim como a sujeira encarde um pano com o passar do tempo.

Arsênio encardido é um veneno que nada pode tirar. O arsênio é um veneno tão terrível e perverso que não tem gosto, nem cheiro, nem cor. E ainda assim, ele encarde o seu corpo por dentro, assim como a sujeira encarde um pano. E quando você perceber, você já estará fraco e doente por causa do arsênio encardido no seu corpo.

Assim como sabão não limpa pano encardido, também não existe remédio para tirar o arsênio do seu corpo encardido. Seus rins são como máquina de lavar roupa, e fazem o que podem para filtrar o sangue e jogar parte do veneno fora, 24 horas por dia, 365 dias por ano, durante toda a sua vida. Mas os seus pulmões também respiram arsênio 24 horas por dia, e os rins não conseguem tirar aquela parte do veneno que fica “encardida”.

Corpo encardido com arsênio não pode ser lavado. Isso significa que o arsênio é como uma mancha que não sai nunca e só vai aumentando. Quanto mais o seu corpo ficar encardido com arsênio, maior é o risco de você adoecer e morrer de doenças causadas pelo arsênio encardido, como manchas de pele, doenças das veias, artérias e coração, diabetes e câncer.

O que fazer? Você pode fazer uma dosagem de arsênio no seu corpo para saber se ele já está encardido com arsênio. Aí você pode decidir mudar para um lugar sem arsênio. De qualquer forma, você tem o direito de entrar na justiça e exigir uma indenização da mineradora que está encardindo o seu corpo com arsênio.

Várias pessoas no Brasil e em outros países do mundo já conseguiram indenizações por causa da intoxicação crônica por venenos liberados por empresas poluidoras. Em alguns casos, as indenizações alcançaram milhões de dólares.

(*) Médico, doutor em medicina e patologia, livre-docente em genética, escrevendo para o Alerta Paracatu, em 20 de julho de 2009.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Quando, como e por que o arsênio acumula no organismo e causa doenças e morte



Quando, como e por que o arsênio acumula no organismo e causa doenças e morte

Por Sergio Ulhoa Dani (*)

O arsênio é um elemento tóxico semelhante a metal presente em algumas rochas da crosta terrestre. Em função das intempéries naturais ou de algumas atividades humanas sobre essas rochas, como a mineração, o arsênio se desprende para diversos compartimentos ambientais, onde é absorvido por microorganismos, plantas e animais.

O metabolismo de alguns seres vivos é capaz de transformar as formas inorgânicas tóxicas do arsênio em compostos orgânicos, menos tóxicos. Algumas espécies de plantas e animais acumulam mais arsênio que outras. Abelhas são muito sensíveis ao arsênio. Elas podem acumular quantidades muito maiores de arsênio que outros insetos. Certos microorganismos, como fungos (p.ex., Penicillium brevicaule) e bactérias presentes em plantas e no solo podem reduzir o arsênio a uma forma altamente tóxica, a trimetilarsina.

O arsênio tende a ser lavado dos continentes para o mar, onde boa parte é transformada em arsênio orgânico, num processo que dura centenas, milhares ou milhões de anos e tende a dispersar o elemento. Concentrações anormais de arsênio livre no ambiente denotam a liberação de arsênio novo por uma fonte ativa: atividades geológicas naturais localizadas, como vulcanismo e fontes hidrotermais, e atividades humanas, como a mineração.

A mineração de rocha dura libera arsênio novo para o ambiente

A principal fonte de liberação de arsênio novo para o ambiente é a mineração de rocha dura, e especialmente a mineração de ouro, porque o ouro ocorre na natureza juntamente com o arsênio. As fontes de liberação de arsênio para a biosfera associadas à mineração de ouro incluem solos e rochas não aproveitadas, água residual de locais com concentração de minério, oxidação de alguns tipos de minérios de ouro para a remoção de enxofre e óxidos de enxofre e a lixiviação aumentada por bactérias. As concentrações de arsênio nas proximidades das operações de mineração de ouro estão elevadas em materiais abióticos e na biota.

Numa revisão feita em 2004, Eisler verificou que os trabalhadores de minas de ouro apresentam uma variedade de problemas de saúde associados ao arsênio, incluindo excesso de mortalidade por câncer de pulmão, estômago e trato respiratório.

Mineradores e crianças em idade escolar nas vizinhanças das atividades de mineração de ouro apresentam níveis elevados de arsênio na urina. Nas populações analisadas, cerca de 20% das pessoas apresentaram concentrações elevadas de arsênio na urina associadas aos efeitos adversos futuros.

Quanto maior a quantidade de arsênio e chumbo no ambiente, maior é a absorção desses elementos e maiores são os efeitos danosos à saúde (Chang e cols., 2008). Em 2003, Yáñez e colaboradores encontraram uma freqüência de dano ao DNA aumentada em crianças que vivem em locais onde as concentrações de arsênio e chumbo estão aumentadas na camada superficial dos solos e na poeira doméstica.

Critérios para a proteção da saúde humana e dos recursos naturais contra o arsênio foram listados e discutidos por Eisler (2004). Muitos desses critérios não protegem adequadamente as espécies sensíveis de plantas e animais.

Efeitos imediatos e a longo prazo da exposição ao arsênio

As formas inorgânicas do arsênio, como o trióxido de arsênio, são venenos clássicos para plantas, animais e para o ser humano. Em dose alta, arsênio mata imediatamente como um agente neurotóxico; em doses baixas por longos períodos, mata como um agente cancerígeno.

“Arsênio é um elemento pouco usual, no sentido de que existem dados epidemiológicos humanos de qualidade científica aceitável para a avaliação dos riscos à saúde associados à exposição de longo prazo ao arsênio, o qual tem uma relação causal com os riscos aumentados de câncer de pele, pulmão, bexiga e rins, bem como outras alterações da pele, como hiperceratose e alterações da pigmentação. Esses efeitos têm sido claramente demonstrados em um número de estudos epidemiológicos de diferentes desenhos. Altos riscos e relações de exposição-dose têm sido observados para cada um desses pontos terminais.” [WHO, 2001]

Um grama de arsênio inorgânico não tem cheiro nem gosto e pode matar rapidamente até 10 pessoas. Após um período de adaptação, alguns seres humanos adultos saudáveis podem tolerar até 0,5 g de arsênio/dia, por algum tempo. Entretanto, a adaptação e a tolerância não são completas nem duradouras. Elas são funções da constituição genética, do estado fisiológico e do estado nutricional, envolvendo fatores ambientais como, por exemplo, a disponibilidade de selênio em quantidade adequada no ambiente e na dieta.

Organismos mal-nutridos utilizam mais o arsênio que organismos sadios, e de uma forma diferente. Uma das reações do corpo humano ao arsênio é o aumento da produção das células sanguíneas, donde o efeito terapêutico de pequenas doses de arsênio receitadas no passado. Ao longo prazo, entretanto, a adaptação e a aparente tolerância ao arsênio podem desaguar em câncer, doenças vasculares e diabetes, entre outras.

“Alguns estudos epidemiológicos chamaram a atenção para o fato de algumas populações expostas a arsênio ambiental não terem demonstrado qualquer manifestação clínica de toxicidade crônica por arsênio. Além disso, há uma ampla variação na incidência de arsenicose crônica em uma população afetada. Mesmo em uma família afetada, nem todos os membros da família mostram efeitos clínicos. A razão para tal variação na expressão da doença é um enigma. Entretanto, como as pessoas expostas ao arsênio estão em risco de desenvolver câncer relacionado ao arsênio, elas necessitam de acompanhamento prolongado.”[WHO, 2001]

Absorção, metabolismo, eliminação e acumulação

As vias oral e respiratória respondem por 90% da absorção de arsênio. A absorção pela pele também pode ocorrer. As taxas de absorção variam de 25-40% para o trato respiratório a 80% para o trato digestivo. Essas taxas podem sofrer variações sob influência de fatores como a idade do indivíduo e a composição mineral dos alimentos e da atmosfera.

Uma vez absorvido, o arsênio distribui-se rapidamente por todos os tecidos do corpo onde pode ser metabolizado em graus variáveis, e é eliminado principalmente pelos rins. Um relatório da FAO/WHO estabelece provisoriamente como tolerável uma quantidade máxima absorvida de arsênio inorgânico de 0,002 mg/kg de peso corporal/dia. Entretanto, como o arsênio é uma substância cancerígena, não se pode falar em dose segura de exposição ao arsênio.

Mesmo expostas a doses consideradas toleráveis, durante longos períodos, pessoas saudáveis e especialmente pessoas com função renal comprometida ou idosos (que geralmente manifestam algum grau de comprometimento da função renal) acumulam arsênio em quantidades tóxicas.
O processo de eliminação apresenta um gradiente de concentração, que pode ser representado por uma função exponencial simples:

Ct = C0 * e(-bt)

Ct é a concentração num órgão ou no corpo no tempo t; C0 é a concentração num órgão ou corpo no tempo 0; b é a constante de eliminação específica do elemento e t é o tempo. O tempo decorrido até que a concentração de um elemento absorvido seja reduzida à metade é chamado de meia-vida do elemento. Meia-vida curta significa rápida eliminação do elemento; meia vida longa significa lenta eliminação.

Se as quantidades absorvidas em um determinado período forem pequenas e os intervalos entre exposições consecutivas forem longos em relação à meia-vida do elemento, então o elemento não se acumulará no órgão ou no corpo. Se, ao contrário, a dose administrada ou absorvida for alta e o intervalo entre as exposições for curto, ou se a meia-vida do elemento for longa, então o elemento acumulará no organismo.

O acúmulo de arsênio acontece mesmo em pessoas saudáveis, em decorrência de exposições crônicas a doses consideradas baixas, normais ou toleráveis, sem que as pessoas apresentem sinais clínicos de intoxicação, e pode ser agravado por diversas condições fisiológicas, patológicas e ambientais.

Na literatura científica encontram-se valores de meia-vida do arsênio que variam de 2-30 horas
.
A taxa de eliminação do arsênio influencia a sua meia-vida. Diversas condições fisiológicas, patológicas e ambientais, isoladamente ou em conjunto, podem aumentar a meia-vida de eliminação do arsênio, por exemplo: a idade e a constituição genética, a insuficiência cardíaca, a insuficiência renal e a insuficiência hepática, e a formação de compostos de arsênio e chumbo.

Cada órgão tem um valor diferente de saturação, que se reflete em padrões variáveis de acúmulo. As maiores concentrações do elemento podem ser encontradas nos ossos, pulmão e pele.

Estudos científicos realizados em humanos e animais comprovam que o arsênio se acumula no organismo com o passar do tempo (Figura 1). Quanto maior a duração e a intensidade da exposição ao arsênio, maiores serão os efeitos danosos à saúde humana a longo prazo, como câncer, doenças cardiovasculares e diabetes.


Figura 1. Gráfico do acúmulo de arsênio no corpo humano durante a vida. Esse gráfico foi elaborado a partir das concentrações médias obtidas por Raie (1996) em material de autópsia de pacientes de Glasgow sem sinal clínico de arsenicose, que morreram por causas externas, como acidentes. Observe que mesmo nessas condições de acumulação sub-clínica, a quantidade acumulada encontra-se acima do valor provisoriamente considerado tolerável pela WHO (i.e. = 0,002 mg/kg). O aspecto do gráfico é compatível com o modelo experimental animal de Marafante e colaboradores (1982).

A partir dos dados disponíveis na literatura científica, foi possível construir o gráfico da Figura 2, que ilustra um modelo de acúmulo de arsênio em uma população cronicamente exposta a doses crescentes de arsênio.





Figura 2. Gráfico ilustrativo do modelo de acúmulo de arsênio em uma população cronicamente exposta a doses crescentes do metalóide tóxico. As curvas A-D correspondem às curvas teóricas de acúmulo após exposição crônica às seguintes doses crescentes de arsênio (em microgramas/dia): A, 12 ug/dia; B, 15 ug/dia; C, 20 ug/dia; D, 38 ug/dia. Observe o padrão exponencial de acúmulo, i.e., pequenos acréscimos na dose diária causam grandes aumentos na concentração corporal de arsênio, e consequentemente o deslocamento da curva de acúmulo para cima. As curvas B-D não se verificariam na realidade de uma população cronicamente exposta, porque a maioria dos pacientes morreria quando o acúmulo de arsênio alcançasse a dose letal.

Para um homem de 70 kg, a dose letal seria alcançada a partir da curva A (exposição crônica a 12 ug/dia, resultando em uma concentração de arsênio de até 1 mg/kg de peso corporal), dependendo da capacidade de tolerância individual ao arsênio. Além da dose diária, a capacidade de tolerância individual e a mortalidade decorrentes da exposição crônica ao arsênio são determinantes do tipo de curva de acumulação verificado na realidade. Os dados usados para construir este modelo foram obtidos da literatura citada ao final deste artigo.

Não existe tratamento eficiente para a intoxicação crônica por arsênio. A única alternativa eficiente é a inativação da fonte poluidora da água, alimentos e atmosfera.

Conclusões:
1. Altas concentrações de arsênio livre no ambiente são claramente decorrentes de atividades humanas, como a mineração.

2. O arsênio é absorvido principalmente por via oral (água, alimentos, objetos contaminados) e respiratória (poeira, gases).

3. Arsênio é veneno tanto em doses altas quanto em doses baixas. Em doses altas, a morte é imediata; em doses baixas o arsênio causa câncer e outras doenças ao longo prazo. Como o arsênio é uma substância cancerígena, não existe dose segura para exposição ao arsênio.

4. Mesmo em doses consideradas toleráveis e durante exposição crônica ao arsênio na água, alimentos e atmosfera, o arsênio se acumula no organismo humano saudável, causando ou agravando efeitos danosos à saúde.

5. Mesmo quando as populações expostas cronicamente ao arsênio não apresentam nenhum sinal clínico de intoxicação, ainda assim elas estão sujeitas ao risco de desenvolver câncer relacionado ao arsênio. Por isso, elas necessitam de acompanhamento prolongado.

6. Não existe tratamento eficiente para a intoxicação crônica por arsênio. As únicas alternativas eficientes são a inativação das fontes poluidoras da água, alimentos e atmosfera, ou a prevenção da ativação de novas fontes poluidoras.

(*) Médico, doutor em medicina e patologia, livre-docente em genética, escrevendo de Göttingen, Alemanha, em 10 de julho de 2009, para o Alerta Paracatu. srgdani@gmail.com.

Referências:
Chiang WF, Yang HJ, Lung SC, Huang S, Chiu CY, Liu IL, Tsai CL, Kuo CY. 2008. A comparison of elementary schoolchildren's exposure to arsenic and lead. Journal of Environmental Science and Health C Environmental Carcinogenesis and Ecotoxicological Reviews. 26(3):237-55.

Eisler R. 2004. Arsenic hazards to humans, plants, and animals from gold mining. Reviews in Environmental Contamination and Toxicology 180:133-65.

Fiedler HJ, Rösler HJ (Eds.) Spurenelemente in der Umwelt. Gustav Fisher Verlag Jena, Stuttgart, 1993.

WHO, 2001. United Nations Synthesis Report on Arsenic in Drinking-Water. Acessível a partir de: http://www.who.int/water_sanitation_health/dwq/arsenic3/en/

Marafante E, Bertolero F, Edel J, Pietra R & Sabbioni E. 1982. Intracellular interaction and biotransformation of arsenite in rats and rabbits. Science of the Total Environment 24:27-39.

Raie, RM. 1996. Regional variation in As, Cu, HG, and Se and interaction between them. Ecotoxicology and Environmental Safety 35:248-252.

Yáñez L, García-Nieto E, Rojas E, Carrizales L, Mejía J, Calderón J, Razo I, Díaz-Barriga F. 2003. DNA damage in blood cells from children exposed to arsenic and lead in a mining area. Environmental Research 93(3):231-40.