terça-feira, 8 de janeiro de 2008

GARIMPO ARTESANAL DE SUBSISTÊNCIA

GARIMPO ARTESANAL DE SUBSISTÊNCIA

A dignidade da pessoa humana consistente e ganhar o sustento com as próprias mãos pode ser assegurada mesmo quando o trabalho é realizado de maneira informal.

O trabalho informal para a subsistência sinaliza que a economia está marginalizando a força produtiva por não gerar empregos ou não qualificar a mão de obra, e se revela na atividade das sacoleiras, dos camelôs, do comércio de oportunidade dos vendedores ambulantes de alimentos e bebidas, das lavadeiras, das faxineiras e dos que vivem de pequenos serviços.

Não será por ser o ouro um ativo financeiro - e um metal cobiçado - que o garimpo artesanal de subsistência - o faiscamento sem uso de mercúrio - deve ser combatido.

O garimpo artesanal de subsistência ocorre na camada superficial do solo, na terra misturada com ouro, na mesma camada de solo em que as plantas criam suas raízes e extraem os minerais para crescimento, frutificação e alimentação humana. É o horizonte da vida, no qual não se pode falar em "mineração".

Proibir que uma riqueza superficial aflorada em terras particulares seja extraída para subsistência é proibir que a própria vida tenha curso: pés apoiados sobre a riqueza aflorante sustentando estômagos com fome.

A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República, e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária um dos objetivos.

Como resguardar a dignidade e construir uma sociedade justa quando o garimpo artesanal de subsistência é proibido para que as faiscas engrossem as toneladas extraídas.

Não é razoável que a pobreza e a fome sejam mantidas para que ativos financeiros sejam transferidos para o exterior.

Cuida-se, aqui, de verificar a recepção da legislação minerária pela Constituição de 88 que estabelece o primado do Estado de Direito e declara, no art. 127, o regime democrático a ser defendido pelo Ministério Público.

"SENDO O ESTADO A INTEGRAÇÃO POLÍTICA E JURÍDICA DA SOCIEDADE, O REGIME DEMOCRÁTICO É O PODER DE GOVERNO EXERCIDO COM A MENOR GRAVOSIDADE PARA O CIDADÃO."

Gravosidade é a imposição de esforço ao cidadão para atendimento do que a lei exige seja cumprido.

Um exemplo simples de gravosidade são as filas nos balcões de serviços públicos: filas maiores representam maior gravosidade e filas menores menor gravosidade. A gravosidade é senso comum, ou seja, os cidadãos entenderão o que é uma fila "razoável", na qual não esperarão tanto e o governo não gastará muito para o atendimento.

Os direitos de mineração não podem ser absolutos e embora o ordenamento jurídico privilegie quem pode mais, a Constituição assinala, através da proteção da vida e da dignidade da pessoa humana, que quem pode o menos deve ter acesso aos recursos minerários se destes depender, em maior ou menor grau, para a subsistência que lhe assegure a vida e a dignidade, recepcionando pelos seus princípios, que o proprietário de terras mineráveis possa subsistir com a exploração no horizonte da vida - a superfície do solo, até que a lei incida para estabelecer a servidão minerária.

Não se trata de mudar a lei porque o processo é demorado e polêmico, mas de evitar o ABSOLUTISMO MINERÁRIO consistente em vedar ao proprietário em gozo da totalidade dos direitos reais de superfície o usufruto de minerais aflorantes com vistas à sua subsistência, pois a simples expectativa de direitos do minerador não pode ter força "democrática" - e nem pode esta força ser concedida por via judicial - para preservar direitos futuros de extração, vez que a prospecção e os estudos de lavra não criam a propriedade sobre o mineral a ser extraído.

É o mesmo REGIME DEMOCRÁTICO que, no confronto entre quem pode mais e quem pode menos, deve, através dos órgãos licenciadores, fiscalizadores e judiciais, exige a razoabilidade nas decisões e na condução do processo de lavra, para que os pequenos, diante do poder de grandes mineradoras, tenha seus direitos protegidos e possa usufruir até que lhe venha a indenização justa dos seus direitos de superficiário.

Em resumo, menos peso sobre as costas dos coitados que deverão se render à lei.

Paracatu não viveu do ouro que lhe foi extraído, viveu das faíscas do ouro que encheu o cofre dos estrangeiros.

Paracatu viveu do ouro de bateia, do ouro da sobrevivência, e não cresceu proporcionalmente ao ouro que gerou.

A esmola dos mineradores representa hoje cerca de 2% da arrecadação do município, ou seja, para que Paracatu viva de ouro por 1 (um) ano serão necessários 50 (cincoenta) anos de mineração.

É fácil ver que o ouro não sustenta os cidadãos, não gera empregos e não garante o futuro.

É fácil ver que o ouro não está construindo a sociedade livre, justa e solidária.

O garimpo artesanal pode e deve ser restabelecido em benefício da subsistência dos que podem menos, bastando para isto que as autoridades sejam sensíveis a reconhecer que o cumprimento estrito das leis traz uma carga de maldade contra brasileiros que ainda vivem do trabalho na terra.

A mesma polícia que inibe o garimpo pode fazer o papel social de fiscalizar a atividade, aliando-se aos técnicos que podem orientar a garimpagem sem dano ambiental, aos moldes daquilo que eu assistia quando da minha infância em Paracatu.

"Vale a pena salientar como a literatura recente sobre economias informais é capaz de lançar luz sobre as formas de estruturação do garimpo. Alejandro PORTES (1994) entende por informalidade “uma ação econômica desenvolvida à margem do poder legalmente
instituído, sendo neste sentido, excluída da proteção das leis, ou seja, uma atividade produtiva de bens e serviços que se desenvolve paralelamente à economia formal”.

"É importante distinguir conceitualmente atividades econômicas informais e ilegais. A incapacidade de marcar analiticamente a distinção conduz, freqüentemente, a interpretações equivocadas do fenômeno da informalidade. Segundo PORTES (1994), “o
empreendimento ilegal envolve a produção e a comercialização de bens que são definidos, em um determinado lugar e tempo, como ilícitos”. No empreendimento informal, ao contrário, os acordos são realizados na sua maioria como bens lícitos, embora sob
modalidades de ação econômica não sujeitas (ou resistentes) à regulação estatal. Assim, pode-se afirmar que a diferença básica entre economia formal e informal não está no caráter final do produto, mas sim, na maneira como ele é produzido e trocado."

"O garimpo artesanal ou manual constitui uma atividade econômica tipicamente orientada à subsistência, mantendo-se ainda na marginalidade de forma residual em algumas regiões. Caracteriza-se pela ausência completa de máquinas e de sondagem. Utiliza algumas ferramentas como a bateia e, atualmente, faz uso do mercúrio para a apuração do ouro. É uma atividade que requer baixíssimo capital. Obviamente, não detém a concessão da área de exploração4 e continua na clandestinidade, atuando nos rios e nas suas margens. Mantém quase intactas as mesmas técnicas utilizadas nos séculos passados. É um empreendimento individual, itinerante e realizado por grupos independentes, muitas vezes familiares.

4 Esta concessão é fornecida pelo DNPM, e se trata de um processo lento e oneroso, o que desmotiva o garimpeiro a buscá-lo, e desta forma, dar o primeiro passo a sua legalização.

Este não é o grupo mais perseguido pelos órgãos fiscalizadores, pois o seu poder de degradação ambiental não é grande. Muitas vezes, trabalha clandestinamente nos esgotos das grandes mineradoras, onde explora os resquícios de uma extração mais racional. Normalmente os donos dos garimpos semi-mecanizados permitem que estes grupos se aloquem ao lado de suas cavas."

http://www.sbsociologia.com.br/congresso_v02/papers/GT29%20Trabalho,%20Precariza%C3%A7%C3%A3o%20e%20Pol%C3%ADticas%20P%C3%BAblicas/Microsoft%20Word%20-%20papers_SBS.pdf
Homens de ouro: o métier de garimpeiro e os garimpos em Minas Gerais.
Luciano Rodrigues Costa
Doutorando em Ciências Sociais UNICAMP - lrodrigues00@yahoo.com.br

Não estamos sozinhos

Ainda o ouro da colônia
Rui Nogueira é médico, pesquisador e escritor. rui.sol@ambr.com.br

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O fruto de várias décadas de trabalho de nossos patrícios foi usurpado e mina, estrada de ferro, usinas, pesquisas, portos, navios, foram transferidos para mãos estrangeiras a troco de nada

No caso de Paracatu, todo ouro é transferido como ativo ou exportado com isenção de impostos.

Quanto a exportação, o relatório do setor econômico da Unesco, referente ao último ano, salienta que o gigantesco volume de exportações em todos os setores não é muito benéfico ao Brasil. Segundo os estudiosos, boa parte das exportações são realizadas por firmas estrangeiras que recebem os resultados das vendas. Eles não falam das isenções de impostos para exportação, mas dizem que no comércio internacional 60% das operações são feitas entre matrizes e filiais, com os preços fixados de acordo com suas conveniências.

Conclusão, Paracatu está fadada a ter o mesmo destino de cidades resultantes da mineração, vai sair ouro com todas as isenções, mera transferência de riquezas para o exterior e ficará buraco e miséria. O meio ambiente não será recomposto, os lençóis freáticos jamais se recuperarão e todos que levaram séculos na sua construção estarão excluídos de alguma benesse ou resultado da exploração do ouro e dos metais contaminantes sob absoluto controle das transnacionais estrangeiras.

Até quando será assim?
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LEIA O TEXTO INTEGRAL EM http://www.anovademocracia.com.br/31/12.htm

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

PAGAMENTOS FACILITADORES

PAGAMENTOS FACILITADORES

O "Code of Business Conduct and Ethics" (Código de Ética e Conduta nos Negócios) da Kinross, controladora da RPM - RIO PARACATU MINERAÇÃO, diz:

"Small "facilitation payments" intended to secure a routine business service or have routine administrative actions performed by public officials, such as obtaining phone service or police protection, may be made to foreign public officials unless prohibited in the relevant jurisdiction. In addition, it is a defence to the anti-bribery provisions that the payment, gift or benefit was lawful under the written laws of the foreign state for which the foreign public official performs duties or functions. It is also a defence that the payment or benefit was made to pay reasonable expenses incurred in good faith by or on behalf of the foreign public official that are directly related to the execution or performance of the contract between Kinross and the foreign state for which the official performs duties or functions." (http://www.kinross.com/corporate/governance-conduct.html )

A expressão "facilitation payments" é traduzida como "pagamentos facilitadores", e é assim porque se trata de uma prática corrente, como pode ser visto no código de ética de outra grande empresa multinacional:

"Em alguns países, às vezes pode ser usual pagar a funcionários públicos para desempenharem as tarefas exigidas. Esses pagamentos facilitadores, como são conhecidos, são pequenas quantias pagas para facilitar ou acelerar atos governamentais de rotina, não discricionários, tais como a obtenção de serviço telefônico ou uma licença comum. Já a propina, em contraposição, que nunca é permitida, é dar ou oferecer algo de valor a um funcionário público para influenciar uma decisão discricionária."
( http://www.thecoca-colacompany.com/ourcompany/pdf/COBC_Portuguese.pdf )

Os pequenos "pagamentos facilitadores" no Brasil são conhecidos como: caixinha, gorgeta, graxa, molhar a mão, jabaculê, cafezinho, cervejinha etc.

Os grandes "pagamentos facilitadores" no Brasil são conhecidos como propina.

A diferença entre pequenos e grandes pagamentos facilitadores é só no valor, ou seja, são pagamentos para que os funcionários públicos façam aquilo que é da obrigação fazer.

No Brasil é assim:

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DO BRASIL

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

LEI Nº 8.429 - DE 2 DE JUNHO DE 1992 - DOU DE 3/6/92 - LEI DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, e notadamente:

I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

Existem várias regras técnicas para interpretação de leis mas, no senso comum, a "vergonha na cara" é a regra.

Interpreta-se a lei com "vergonha na cara" quando queremos preservar a moral e a ética, como se interpreta uma gravidez: não existe gravidez pequena ou gravidez grande, ou seja ou está ou não está.

Interpreta-se a lei sem "vergonha na cara" quando se quer passar pelas beiradas da moral e dá ética, tal como colocar um travesseiro na barriga para que a aparência da gravidez permita usar o privilégio da fila especial no banco.

Um exemplo de pequeno pagamento facilitador é dar gorgeta para o garçon arrumar uma boa mesa num restaurante ou prometer um cafezinho para o lavador de carros dar uma caprichada, ou seja, para arrumar uma boa mesa num restaurante cheio o garçon "gorgetado" passará alguém para trás, e o lavador de carros demonstrárá que sem o cafezinho o serviço prestado seria uma grossa porcaria.

Garçon e lavador podem aprender, facilmente, que receber "algum" para cumprir a obrigação é um bom negócio.

Exemplos de grandes pagamentos facilitadores aparecem na mídia acontecendo em Brasília e outros lugares nobres, e geram CPIs e processos judiciais.

Os bons operadores de pagamentos facilitadores são espertos e qual macacos velhos que não põe a mão em cumbuca, sabem andar na tábua da beirada sem cair, coisa muito parecida com agradar o pai e a mãe para conquistar a moça para o namoro e casamento.

Namorar e casar é um bom propósito, mas adular o pai e a mãe da moça para que eles ajudem a fazer a cabeça dela pode ser feito só para tirar proveito do namoro e sumir antes de casar, e isto é um mau propósito.

O que o moço namorador faz com os pais da moça é uma espécie de "pagamento facilitador": uma vara de pescar para o pai, um ramalhete de flores para a mãe, e a facilitação começa a operar: "que bom rapaz, atencioso ...".

Pais responsáveis sentam o rapaz namorador e lêem para ele o "abc da onça", ao qual só resistem ouvir os de bons propósitos.

Ora, se os tais "pagamentos facilitadores" são outra coisa que não sabemos o que é, ou são coisa diferente daquilo que as empresas exemplificadas escrevem e assinam embaixo, elas que venham a público explicar de forma clara o que são e o que estão querendo facilitar.

Responsabilidade social ou responsabilidade ambiental de empresas não podem ser distribuição de benefícios à sociedade fazendo aquilo que não pudemos nós mesmo fazer por falta de capacidade própria.

Responsabilidade social e ambiental, ou sócio-ambiental, é ajudar a sociedade a crescer e construir, fazendo isto com respeito à dignidade da pessoa humana.

Estou certo de que a RPM-KINROSS não está cumprindo a Constituição da República do Brasil.

Pode até estar cumprindo a lei, mas isto não é o bastante num país em que as leis nem sempre pegam ou são feitas para atenderem a interesses do que o próprio governo chama de desenvolvimento.

O direito das populações é algo a ser resolvido na Constituição:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

Serrano Neves
Procurador de Justiça Criminal em Goiás.

domingo, 6 de janeiro de 2008

PARACATU DOS SEM OURO

PARACATU DOS SEM OURO

Paulo Mauricio Serrano Neves

A riqueza é o nosso ouro
Que eles estão levando,
A pobreza é o nosso couro
Que eles estão tirando.

Matando as águas nascentes,
Poluindo o nosso ar,
Humilhando nossas gentes,
Comprando nosso lugar.

Tirando a tranqüilidade
Até nas nossas moradas,
Comendo Paracatu,
De colher, pelas beiradas.

Em trinta anos corridos,
Todo o ouro levarão,
E ficaremos sofridos
Na beira de um buracão