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quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

ECONOMIA DE SUBSISTÊNCIA E GARIMPO ARTESANAL NÃO-FORMAL

ECONOMIA DE SUBSISTÊNCIA E GARIMPO ARTESANAL NÃO-FORMAL

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
...
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

A economia brasileira vai bem, mas a economia do povo não vai igual, como demonstram os programas governamentais de assistência às faixas de baixa renda.

O IBGE anota no grupo de renda até R$ 400,00 mensais (que inclui os sem renda) que 32,73% das famílias vivem de rendimento não monetário. (http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pof/2002/tab212.pdf)
  • "Excluídos os programas de transferência de renda, de Benefício de Prestação Continuada (BPC), além das aposentadorias e pensões, o índice de de pobres na população brasileira passaria de 30,1% para 41,7%.
  • A publicação aponta o BPC como uma das mais importantes inovações da política social entre 1995 e 2005, por atender “a um público até então excluído de qualquer mecanismo público de transferência de renda”." http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/04/12/materia.2007-04-12.0110170462/view acessado em 30.01.08 às 18:01
É razoável falar em 30% de pobreza na população, visto que a linha de corte do BPC é de R$ 95,00 (noventa e cinco reais) mensais. Essa população "sobrevive" às custas de atividades marginais, ou não-formais, complementares, como coleta de resíduos e pequenos serviços ocasionais.
  • "Observa-se que o setor de subsistência aqui considerado compreende o conjunto de atividades econômicas e relações de trabalho que propiciam meios de subsistência e/ou ocupação a uma parte expressiva da população, mas tais relações não são reguladas pelo contrato monetário de trabalho assalariado, nem visam primordialmente à produção de mercadorias ou de serviços mercantis com fins lucrativos."
  • O SETOR DE SUBSISTÊNCIA NA ECONOMIA E NA SOCIEDADE BRASILEIRA: GÊNESE HISTÓRICA, REPRODUÇÃO E CONFIGURAÇÃO CONTEMPORÂNEA - Guilherme Costa Delgado - Brasília, junho de 2004
  • http://www.ipea.gov.br/pub/td/2004/td_1025.pdf acessado em 30.01.08 as 17:30
A coleta e venda de resíduos têm sido estimulada em nome do meio-ambiente e recebe tratamento "inclusivo" na economia formal, mas sua gênese é a pobreza.

Em nome da inclusão e da geração de renda a pobreza é aliada à remoção de resíduos prejudiciais ao meio-ambiente ou aproveitáveis pela economia formal que não os alcançaria com competitividade pois os custos formais de apropriação são bem mais elevados do que os da "pobreza coletora".

A essa "pobreza coletora" é vedado, e combatido pelos governos, o acesso não-formal a bens naturais minerais incluídos na produção formal.

A política de "fechar os olhos" ao acesso não-formal opera enquanto a atividade é de baixa densidade e dispersa, não havendo interesse em formalizar, ou no mínimo reconhecer e autorizar, pois a máquina administrativa não é competente para lidar com grandes grupos de pequenos, vez que é montada para lidar com pequenos grupos de grandes.

A máquina administrativa tem enorme dificuldade em gerir pessoas, como demonstram os serviços públicos de massa, seja por inabilidade, seja por carência de suporte financeiro, seja pela notável incapacidade de fiscalizar as atividades autorizadas.

Assim, é mais fácil para o governo ser intolerante com o não-formal e combatê-lo com seus regramentos e poder de polícia, quando não o faz com a própria "polícia", e transformar os fundamentos da República em uma espécie de "poder assistencialista" que acalma as carências, melhora as estatísticas e rende dividendos político-eleitorais.

Paracatu, em Minas Gerais, é uma cidade de bicentenária atividade extrativa de ouro.

Em Paracatu a atividade garimpeira artesanal acompanhou a história da cidade ao lado da exploração que transfere, até hoje, o ativo aurífero para o exterior.

A característica atual, marcante da história garimpeira de Paracatu, é o privilégio minerário para uma empresa (hoje a canadense Kinross) que se intitula Rio Paracatu Mineração, em detrimento de outras formas de garimpo menores.

O uso do mercúrio na apuração do ouro é nocivo e sua proibição é mais do que válida, mas o fato de o mercúrio ter sido utilizado e danado com o meio ambiente não é razão para que seja vedado, na sua modalidade menor de sobrevivência, o garimpo artesanal no horizonte raso do solo (horizonte da vida) com pequenas caixas de lavagem e bateia, sem uso de mercúrio e com suporte de qualificação para o manejo do ambiente de atuação.

A possibilidade de formalização do garimpo artesanal individual, na conformidade da legislação examinada, pela complexidade e custos de obtenção da concessão, deixa à margem o garimpo de subsistência.

O garimpo de subsistência não é, por sua natureza atividade regular nem operação econômica. Sua feição está mais para coleta e escambo do que para economia de mercado, vez que ocorre como geração de renda para provimento pessoal e familiar, sem geração de excessos formadores de ativos, figura bastante próxima da "economia de subsistência".

A forma artesanal de subsistência não confere ao seu praticante nenhum avanço para cima do patamar da pobreza, mantendo-o, mesmo dentro da formalidade, no entorno da linha de corte de R$ 400,00 (quatrocentos reais) mostrada pelo IBGE.
  • "A presidência da Associação dos Garimpeiros de Pedra Lavrada - Asgapala - tem registro de mais de 800 garimpeiros atuando no setor, com retirada mensal de R$ 320 a R$ 500, um salário que pode ser complementado com a produção do artesanato mineral."
  • Artesãos ganham equipamentos de lapidação e expandem negócios - 31-Jul-2007
  • http://www.paraiba.pb.gov.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=24181 acessado em 30.01.08 as 17:30
As considerações feitas em "GARIMPO ARTESANAL DE SUBSISTÊNCIA" postado neste mesmo blog, tem em destaque:
  • A dignidade da pessoa humana consistente e ganhar o sustento com as próprias mãos pode ser assegurada mesmo quando o trabalho é realizado de maneira informal.
O destaque - e a leitura do texto citado - estimula pensar na sociedade que queremos construir, ou que governos e governantes queremos ter: se uma sociedade na qual o trabalho não-formal possa ser exercido com dignidade, ou uma sociedade na qual a proibição do trabalho não-formal produz a indignificação do alistamento nos programas de assistência.

Garantir a subsistência dos incapazes para o trabalho é atribuição do governo, mas o provimento dos capazes para o trabalho pode ser obtido pelas próprias mãos e garantir isto também é atribuição do governo.

É necessário e urgente que o governo, por seus agentes - e pior, por particulares que se sentem protegidos - pare de constranger, ameaçar, prender e processar os que praticam o garimpo artesanal de sobrevivência.

Espera-se dos governos, num Estado Democrático de Direito, com ordem jurídica e regime democrático, que os princípios expressos na Constituição da República recebam interpretação que supere o ordenamento jurídico positivo que, na espécie mineração, protege mais os bens de uma mineradora do que os de um pequeno proprietário rural.

Espera-se dos brasileiros e brasileiras que prestam seu trabalho a essas mineradoras estrangeiras que levam 100 e deixam apenas 2, a compreensão de que a defesa de seus empregos não implica em venda das suas consciências nem a tolerância com práticas devastadoras do meio-ambiente e de indignificação de pessoas.

Bastaria um pouco mais de vontade política dos nossos governantes, um pouco mais de gestão social, e um pouco mais de trabalho para que o povo de Paracatu não precisasse se desdobrar em agradecimentos por "benefícios sociais" realizados com o dinheiro do próprio ouro extraem do nosso solo.

Não temais ímpias falanges
Que apresentam face hostil;
Vossos peitos, vossos braços
São muralhas do Brasil;
Vossos peitos, vossos braços
Vossos peitos, vossos braços
São muralhas do Brasil.
Brava gente brasileira!
Longe vá temor servil
Ou ficar a Pátria livre
Ou morrer pelo Brasil;


Hino da Independência do Brasil tem letra de Evaristo da Veiga e música de D. Pedro I.

Adriles Ulhoa Filho

Adriles Ulhoa Filho

Membro da ALNM
adriles@uai.com.br

Com atenção e particular interesse li o relatório da Fundação Acangaú, publicado na edição de setembro/2007 desse jornal, sobre as medidas compensatórias e mitigatórias recomendadas em nome da população de Paracatu, para o pacífico andamento do Projeto III da RPM - Rio Paracatu Mineração nessa cidade. Sou um paracatuense inconformado com a maneira que a exploração da Mina do Morro do Ouro vem sendo feita: sem contrapartida razoável à população, que já sofre efeitos nocivos e mais ainda poderá sofrer no futuro, dada a maneira predatória e enganosa, até então, que os projetos vêm sendo executados – trocados por migalhas.  Quero dar meus parabéns a esse jornal e a Fundação Acangaú pela inciativa. Contem comigo.

 

Duguai Francisco de Andrade

Duguai Francisco de Andrade

(depoimento tomado dia 13 de outubro de 2007)

"Sou paracatuense e possuo uma propriedade rural na bacia do Ribeirão Santa Rita. Concordo com todas as medidas recomendadas pelo relatório publicado no Jornal O Lábaro de setembro/2007. Nós que moramos às margens do Rio Santa Rita somos contra a construção da nova barragem de rejeitos que irá destruir as principais nascentes do rio. Além disso, os rejeitos com metais pesados vão contaminar a nossa água e prejudicar os moradores da região. Estamos todos preocupadíssimos com a construção da barragem da Expansão III; a notícia da confirmação desta barragem tirou todo o nosso sossego. Nós nunca fomos ouvidos sobre a possibilidade desta construção".

Geraldo Lúcio Quaresma Lemos

Geraldo Lúcio Quaresma Lemos

economista, biólogo, Presidente da AARPA- Associação dos Amigos do Rio Paracatu. (depoimento tomado dia 13 de outubro de 2007). Geraldo.quaresma@bcb.gov.br

"Uma das melhores coisas que já aconteceram com relação ao meio ambiente em Paracatu foi esta percepção, essa contribuição que a Fundação Acangaú trouxe. Antes disso, muitas entidades não se expressavam, temendo represálias. Outros acreditavam que seria uma luta perdida, criticar a atuação de uma grande e poderosa empresa. O relatório colocou em evidência os riscos que a mineradora traz, e os benefícios que poderia trazer para a comunidade. Esse relatório informa e é bastante esclarecedor. Até então, ninguém imaginava que a mineradora tivesse a obrigação de reparar os danos que causa, implantando as medidas compensatórias sugeridas no relatório. Foi necessário haver uma entidade que sintetizasse as idéias, para fundamentar as ações. Esse papel de vanguarda foi assumido pela Fundação Acangaú. Como presidente da Associação dos Amigos do Rio Paracatu, AARPA, eu apóio o relatório, inclusive porque as medidas recomendadas irão beneficiar o Córrego Rico e seus tributários, que são afluentes do Rio Paracatu. Além disso, esse relatório poderá induzir a união das entidades em favor de Paracatu. Eu acredito na veracidade do relatório e espero que a alta direção da RPM implante todas as medidas recomendadas, para o bem da comunidade, do meio ambiente e do futuro da própria empresa em Paracatu."

 

Ildeu Araújo Caldas

Ildeu Araújo Caldas

(depoimento tomado dia 13 de outubro de 2007)

"Sou nascido às margens do Rio Santa Rita. Vivo aqui há 57 anos. Não sou contra o progresso da RPM, mas eu sou contra a barragem, porque vem nos prejudicar. A barragem vem dar desassosego para nós, e vem diminuir a qualidade e a quantidade da água. Se um dia a barragem estourar, a vida da gente vai embora. Sou pequeno produtor que necessito da água para produzir, para beber e tomar banho. Eu não tenho uma profissão a não ser essa que eu exerço, de pequeno produtor. Não desejo procurar uma cidade para viver. A RPM diz que não precisa da nossa área, mas está abalando a nossa área e a nossa vida, e nós precisamos da nossa vida. Então, acho justo que a RPM nos indenize, para a nossa comunidade adquirir outra propriedade com água saudável e em quantidade, e continuar junta. As nossas propriedades atuais devem continuar sendo nossas, mas nós queremos plantar ali uma reserva florestal de madeira nobre para a gente explorar. Eu dou total apoio ao relatório que foi publicado no jornal O Lábaro".

Irineu Pereira da Silva

Irineu Pereira da Silva

(depoimento tomado dia 15 de outubro de 2007).

"Como morador da comunidade Santa Rita, antes mesmo da chegada da Rio Paracatu Mineração, eu sou apreciador da natureza. A natureza é coisa que só Deus pode nos dar. Sem água e sem ar puro nenhum vivente sobreviverá. Não adianta nada pregar meio ambiente numa era em que se fala de aquecimento global e dizer que temos que ter cautela. Que cautela? Eu lhe digo que com meio ambiente tem que ter é ação e já. A mineradora RPM está causando e poderá causar efeitos drásticos sobre o nosso meio ambiente, se alguém não der um basta. Admiro muito que a Fundação Acangaú abraçou essa causa. Esse nosso movimento é lícito. Ilícita é a destruição da natureza e das comunidades. Nós temos que defender o ambiente em que vivemos. Onde está a riqueza do Córrego Rico? Na cabeceira do Santa Rita fizeram crateras enormes; eles não se incomodam com a destruição, só se interessam pelo ouro. E para consegui-lo, causam a destruição da comunidade, a perda dos moradores, perda dos associados da nossa associação de moradores, perda da água, perda do clima, dos animais, árvores, perda dos nossos valores, nossos sonhos, perda do nosso ânimo, poluição do ar e da água. Enquanto isso, no país deles, estão protegendo as geleiras e até os ursos. Nós nem conhecemos esse povo, e não vemos o ouro que sai daqui. O que vai valer esse minério para nós? O que vai valer para os nossos jovens, no futuro? Sem água, sem mata, sem os nossos bichos, até as borboletas já sumiram. O que nos importa a vida sem a cadeia da natureza? Sem pássaro, sem água, sem ar puro? O que vai nos interessar, sem a cadeia da natureza? A mineradora tira os nossos valores, e acima de tudo, rouba os nossos sonhos. Acaba com a nossa missão de produzir alimentos e garantir a nossa sobrevivência. Mas eles não vão roubar a nossa voz. Seria como se nós morrêssemos antes da hora. Eu não sou contra o progresso, eu sou a favor. O progresso é para os meus filhos e para os filhos de toda a humanidade. Sou contra a construção de uma nova barragem e contra muitas coisas que essa mineradora está fazendo. Nós já moramos em baixo da primeira barragem de rejeitos. Todos sabemos que um acidente pode acontecer. Se acontecer, não serão somente plantas e animais, e sim vidas humanas que serão destruídas pela lama. Esse mineral, o ouro, vem assolando os fracos, humildes e pobres, desde Nabucodonosor. Ele fez uma estátua de ouro e queria que todo o povo adorasse essa estátua. Quem não se ajoelhasse seria lançado ao fogo. Mas alguns não se ajoelharam e venceram. Esta será a maldição de Paracatu, se essa mineradora continuar fazendo o que está fazendo. Eles passam por cima de tudo e de todo mundo, dizendo que ninguém vai impedi-los de construir a barragem. Eles dizem que só no futuro vão recuperar a área. Não podemos ter cautela, temos que tomar providências já, precisamos de ação. Minha reivindicação é esta: se a comunidade não rejeitar o projeto da mineração, que nos indenizem, para que possamos ir para outra área. Que invistam na comunidade, em novos parques ecológicos, nas reservas já existentes, no rio Paracatu, no Ribeirão Santa Rita, no São Pedro. Não podemos permitir que coloquem o ouro acima da água. A Paracatu do Príncipe agora é a Paracatu do Faraó, que ameaça atropelar a comunidade que está no seu caminho. Mas a nossa força é maior."

João Araújo de Oliveira

João Araújo de Oliveira

Depoimento tomado dia 12 de outubro de 2007

"Sou ourives há 30 anos, nascido em João Pinheiro. Mudei-me para Paracatu há 10 anos, com a esperança de montar minha própria indústria de jóias de ouro. Foi uma frustração, porque, apesar de Paracatu ser a terra do ouro, nós não temos condição de trabalhar o ouro daqui. Antigamente era fácil adquirir ouro dos garimpos democráticos de Paracatu. A RPM monopoliza a extração do ouro, mas não vende nada na cidade. Eu julgo que é um dever da mineradora adotar as recomendações do relatório, no sentido de vender parte da sua produção em Paracatu e financiar a criação e manutenção do Centro de Referência Internacional do Artesanato e Indústria do Ouro nesta cidade. Julgo que esta é uma forma justa de compensar as perdas que a população teve com o monopólio do ouro. Precisamos de apoio para formar profissionais joalheiros na região. Eles sempre existiram em Paracatu. Hoje são cerca de 20 profissionais talentosos em Paracatu, sem condições de trabalho. Eu também acho corretas as demais recomendações do relatório."

Lavoisier Albernaz

Lavoisier Albernaz

Historiador, escritor, poeta e cineasta, nascido em Paracatu.

"A RPM desmantelou o Morro do Ouro e assim o paisagismo de Paracatu perdeu essa montanha histórica, que era um dos documentos concretos do I Ciclo da Mineração, o que deu origem a nossa cidade. Perderam-se flora, fauna e as certidões das antigas lavras do período das bandeiras. Para que a RPM fique amiga dos paracatuenses, será imprescindível que ela compense essas perdas ambientais e histórico-culturais irreparáveis, com a criação do fundo referido no relatório publicado no "Lábaro", das medidas compensatórias da empresa para o patrimônio histórico e cultural de Paracatu. Nada mais justo, pois o patrimônio perdido era parte da identidade histórico-cultural do povo. Acredito que a administração desse fundo deverá ser feita por uma comissão técnica de paracatuenses de notório saber, com competências técnicas e culturais comprovadas através de currículo, para que possa melhor atender às necessidades da temática do fundo. Embora não seja possível retornar o Morro do Ouro à condição original, considero que o financiamento, pelo fundo, da reconstrução de vários monumentos históricos e paisagísticos da Paracatu antiga seria uma troca bastante adequada. Esta troca irá estimular o Turismo em Paracatu, como fonte geradora de uma economia sustentável, recompor a imagem estética da cidade e reedificar o fato histórico. Como exemplos de monumentos perdidos e importantes para o Núcleo Histórico, temos: o Passo da Ouvidoria; o Theatro Philodramatico; a Casa da Ópera; a Casa de Cênica; os Passos da Paixão do Senhor; o calçamento original das ruas e largos; a frente do Cemitério e sua Igreja; um Parque na Floresta Central da Chácara dos Padres; o Museu do Ouro; o Museu Casa do Tropeiro de Minas Gerais; o Museu da Cultura Popular; a restauração original do Museu Histórico de Paracatu e diversos casarões, capelas, chafarizes, serras e suas formações florestais, córregos urbanos e outros bens da cultura. A imagem da RPM também será positivamente reconstruída, uma vez que ela devolverá ao povo o que dele foi retirado."

Márcio José dos Santos

Márcio José dos Santos

Geólogo e Empresário

"A profundidade do impacto ambiental causado pela mineradora foi até agora desconsiderada pelas autoridades e por grande parte da população. O projeto de expansão já se encontra em andamento e, pela rapidez de seu avanço, estaremos nos defrontando com situações irreversíveis, como nascentes e vegetação destruídas, assoreamento de córregos, além de ameaças de barragens gigantescas e da poluição que compromete a saúde das pessoas. Isto está acontecendo sem que medidas destinadas a compensar impactos ambientais negativos, principalmente os custos sociais que não podem ser evitados e o uso de recursos ambientais não renováveis, sejam tomadas pelos responsáveis pela execução do projeto. A cobrança dessas medidas não é ato de ofensa à empresa ou a seus empregados, mas o exercício legítimo do direito dos cidadãos, assim como é dever da empresa cumprir as exigências das leis do País. Do ponto de vista geológico e geoquímico, eu gostaria de reforçar o que já foi dito no relatório publicado no Jornal "O Lábaro" de setembro, porque o potencial de envenenamento ambiental e danos à saúde humana, animal e vegetal, decorrente das atividades da mina de ouro da Rio Paracatu Mineração realmente é enorme, e o projeto de expansão da mina apresentado pela empresa não demonstra capacidade de tratar adequadamente este problema. Na prática, a mineradora está ocultando e transferindo o problema para as gerações futuras. Uma questão crítica diz respeito ao cianeto. A política de comunicação social da mineradora é informar a população que o cianeto utilizado na mina para recuperar o ouro é inativado na barragem de rejeitos pela fotólise, isto é, a degradação pelos raios ultravioleta do sol. Entretanto, a mineradora não divulga que a maior parte do cianeto utilizado fica reservada em tanques específicos, que depois são cobertos por terra. É como se o veneno fosse jogado debaixo do tapete da nossa casa, deixado ali dormente, em vez de ser eficientemente inativado. Algo semelhante ocorre com o excesso de arsênio precipitado na hidrometalurgia, e que fica armazenado em tanque específico. Consideramos esse procedimento inadequado, porque transfere o problema e o risco de envenenamento para as gerações futuras. O risco de envenenamento ambiental realmente é grande e os processos são complexos e não estão merecendo a devida atenção por parte da empresa, dos órgãos ambientais, das autoridades ou da sociedade em geral. A atividade da mineradora, quando comparada a outras fontes de degradação do ambiente, como a agricultura e a pecuária, afeta diretamente uma área relativamente pequena. Contudo, os elementos solubilizados dos rejeitos, quando atingem os cursos d'água, impactam negativamente áreas localizadas a centenas de quilômetros da mineração. Elevados teores de metais pesados podem ser encontrados na cadeia alimentar e no homem nos arredores das áreas de mineração, pela entrada desses elementos em solos agrícolas, córregos, rios e ribeirões e nos alimentos produzidos nestas áreas. Isso coloca em risco toda a população localizada no entorno do empreendimento minerário. A atividade da Rio Paracatu Mineração na Mina Morro do Ouro, que contém minerais sulfetados, como arsenopirita (FeSAs), expõe à atmosfera os sulfetos confinados que, ao entrarem em contato com a água e o ar, sofrem oxidação facilitada por bactérias. Os produtos da oxidação dos sulfetos, além de serem altamente solúveis, apresentam reação fortemente ácida, de modo que são facilmente dissolvidos na fase líquida, acidificando as águas de drenagem. Em razão dos baixos valores de pH, elementos tóxicos, incluindo alumínio, manganês, cobre, arsênio, chumbo, mercúrio e cádmio, presentes no meio, são solubilizados e mobilizados nas águas de drenagem, podendo ser absorvidos em níveis tóxicos pelas plantas e incorporados na cadeia alimentar. A flora e a fauna assimilam compostos de arsênio com facilidade, pois este elemento substitui o nitrogênio e o fósforo em algumas vias metabólicas. A drenagem ácida da Mina Morro do Ouro constitui sério problema ambiental, capaz de comprometer a qualidade dos recursos hídricos, cujas águas se tornam inadequadas para irrigação, consumo humano e animal e para uso industrial. Ela é tanto mais séria, quanto maior é a profundidade da mina. Também ocorre dificuldade de revegetação das áreas de rejeito e de estéril advindos da mineração. Os depósitos de rejeitos são um "morro triturado e virado ao contrário", transformado em uma planície estéril e venenosa. A geração de acidez e a conseqüente solubilização de metais, nessa planície e nas áreas de lavra e nas cavas de onde os rejeitos vieram, podem ser prevenidas pelo controle do ingresso de oxigênio ao substrato sulfetado. Portanto, uma medida eficiente seria inundar os depósitos de rejeito e o lavrado e, deste modo, prevenir o acesso de oxigênio. Esta solução pode funcionar parcialmente na área da cava, mas não nas áreas do entorno e, muito menos, nas barragens de rejeito, em função da diminuição da estabilidade e segurança dessas barragens. A medida mais viável é a revegetação. A revegetação pode retornar boa parte da água de percolação para a atmosfera, por meio da transpiração, além de dar mais estabilidade à superfície, para prevenir o arraste de partículas contaminadas pelo vento e pela água. Entretanto, os rejeitos apresentam sérias restrições ao desenvolvimento das plantas, considerando, principalmente, os teores baixos de fósforo, potássio e matéria orgânica; bem como a elevada acidez e salinidade e o alto teor de arsênio. Nessas condições, a mortalidade das plantas é próxima a 100%. Basta observar, na paisagem atual da mina, que não ocorre colonização vegetal espontânea. Qual o custo da revegetação, nestas condições? Onde estão os resultados dos projetos de reflorestamento? Onde está o plano de reflorestamento? Quais são e onde estão os resultados dos testes e pesquisas?"

Marcos Tadeu Silva Gama

Marcos Tadeu Silva Gama
9192-9365 ou  3671-6395

"Sou paracatuense e sou favorável ao relatório publicado no Jornal "O Lábaro". Damos total apoio à ação liderada pela Fundação Acangaú e gostaria de falar em nome da Comunidade do Machadinho, da qual sou Presidente, expondo nossas idéias contrárias à construção da nova barragem, pois só vem nos causar transtornos. A nossa comunidade está sendo desmantelada pela RPM. São moradores que nasceram e foram criados naquela região e hoje têm que dar lugar à invasão dessa empresa. Se a RPM adquirir todos os imóveis rurais do Machadinho, destruirá os vínculos familiares e de amizade que existem há mais de 200 anos. Só no Machadinho são trinta e sete famílias de pequenos produtores que sobrevivem das suas propriedades. Minha propriedade está a jusante da área da nova barragem, e a RPM não está preocupada com o que poderá acontecer com todos os moradores que estão na mesma situação. Com a construção da barragem, corremos o risco de perder os melhores acessos às nossas propriedades, que existem desde a criação do arraial. A RPM adquire primeiro as terras dos grandes proprietários, que são aqueles que poderiam apoiar os pequenos produtores, pela sua melhor situação e capacidade de entendimento da lei e de negociação. E os pequenos produtores são deixados à mercê da própria sorte. Eles nos "proibiram" de fazer qualquer investimento em nossas propriedades, como se as nossas propriedades já fossem deles. Se essa barragem for construída, vai soterrar as três principais nascentes que alimentam o Ribeirão Santa Rita."

Paulo Mauricio Serrano Neves

Paulo Mauricio Serrano Neves*

"Paracatu de um tempo curto que marcou a minha vida de tal forma que 50 anos depois ainda sou capaz de descrever a Ana do Seu Teixeira cavando a cacimba na margem do Córrego Rico enquanto a roupa - lavada em águas cristalinas - quarava. Não escrevo pela saudade, escrevo pela água. Vi, em 1985, o desastre ambiental causado pela mineradora no Córrego Rico. Chorei e escrevi a respeito. Por algumas vezes - em viagem - passei por Paracatu e fechei os olhos para não ver o desastre. O povo de Paracatu suportou - não sem sofrimento - o desenvolvimento conjuntural que começou com os peões que construiam a rodovia engravidando as moças e sumindo no mundo. O córrego que alimentava as famílias dos desempregados com algumas gramas de ouro de bateia sob o sol, foi transformado em desenvolvimento. O meio ambiente pagou a conta e o povo está sofrendo com a falência ambiental. Canto o "... ou ficar a Pátria livre ou morrer pelo Brasil ..." que aprendi ai em Paracatu. Nós, os paracatuenses natos, adotados (como meu pai Geraldo Serrano Neves) ou "embengados" como eu, não merecemos tal legado de destruição. Precisamos agir com firmeza cidadã, sem temor de represálias, como aprendi também ai: "Quem não pode com mandinga não carrega patuá." Ou enfrentamos essa mineradora com a decisão de fazê-la pagar pelos danos, à margem do que os políticos e outros ditos poderosos queiram, ou aceitemos o diploma de subdesenvolvidos, tolos ou miseráveis que aceitam "cestas" de compensação em troca da dignidade e do meio-ambiente. Sou ambientalista ativo aqui em Goiás, com bons resultados obtidos através de parceiros de igual tutano. O Inferno é pouco para esses predadores ambientais e fazê-los restaurar o equilíbrio ambiental quebrado às custas do discurso de que estão "dentro da lei" e da conveniência ou omissão das autoridades é o mínimo que pode ser feito em nome da cidadania e da dignidade. Creiam que se a população de Paracatu morresse por inteiro ou por inteiro mudasse a mineradora festejaria a liberdade de não ter que confrontar-se com pessoas humanas. Creiam que algumas (ou muitas) consciências estão sendo inconscientemente cooptadas pela geração de impostos, empregos ou renda. Impostos, empregos e renda não podem ser legados aos descendentes e, se pudessem, não sustentariam, com qualidade, a vida deles. Como dizemos aqui em Goiás, de forma ultra-concisa: "ferro no boneco".

* Serrano Neves é Procurador de Justiça Criminal de Goiás (na ativa) e diretor do Instituto Serrano Neves (www.serrano.neves.nom.br) com sede em Uruaçu-GO, de onde estimula e articula a defesa do Lago da Serra da Mesa, o maior reservatório de água doce (em volume) do Brasil.

 

Sergio Ulhoa Dani

Sergio Ulhoa Dani

"Como médico e cientista, tenho a obrigação de manifestar minhas preocupações com relação ao empreendimento da Rio Paracatu Mineração. Diversas medições de variáveis ambientais e contaminantes do ar, dos solos, das águas e das plantas são conduzidas pela própria RPM, ou a seu mando. Essas medições são obrigação da empresa, mas não devem ser feitas pela empresa quando e como ela julgar conveniente, e sim por uma equipe independente e capacitada, com visão científica e crítica, e não com a visão empresarial, defensiva e burocrática da RPM. As medições, como vêm sendo feitas atualmente, parecem servir apenas ao propósito de defesa da empresa junto aos órgãos ambientais e contra possíveis ações judiciais, e não aos propósitos de defesa do meio ambiente e da saúde das pessoas. Paracatu, por diversas razões, ainda não conseguiu atrair e fixar massa crítica de pesquisadores e doutores. Por isso, é tão crítico e absolutamente fundamental a constituição do ITAPAR-Instituto de Tecnologia Ambiental de Paracatu, do Parque Tecnológico e dos fundos para saúde, educação e desenvolvimento social, conforme proposto no relatório publicado na edição de setembro/2007 do jornal "O Lábaro". Existem, na lavra, nos rejeitos, na água da drenagem e na poeira da mineração, substâncias tóxicas que podem provocar sérios danos à saúde se aspiradas ou ingeridas de forma crônica ou cumulativa, como pneumoconioses, alergias, conjuntivites, afecções da pele, câncer, doença renal, anemia, doenças cardiovasculares, distúrbios do sistema nervoso, entre outras . É inaceitável que as medições e análises ambientais desses agentes nocivos sejam feitas pela RPM. As análises e pesquisas químicas, ambientais e médicas devem ser feitas por cientistas e técnicos do ITAPAR, com base científica e conforme planos de amostragem robustos, exaustivos e regulamentados, auditorias e verificações constantes e independentes, equipamentos calibrados e estatísticas adequadas. Do contrário, a RPM domina, como tem acontecido, e perde-se a objetividade e a credibilidade dos dados e sua interpretação. A RPM não pode se intrometer em assuntos tão sérios da vida de Paracatu, isso é inaceitável. Em vez disso, Paracatu é que tem todo o direito de fiscalizar de perto os processos físicos e químicos da RPM que afetam a qualidade de vida na nossa região."

RELATÓRIO PARTE 10 - FINAL

III - Em conclusão, este relatório recomenda a contratação das seguintes medidas compensatórias, como condicionantes ao licenciamento do projeto de expansão III da RPM (1):

1. Destinação de 0,4% do faturamento bruto da RPM para financiamento da criação, implantação e manutenção do Instituto de Tecnologia Ambiental de Paracatu (ITAPAR), com administração superior do tipo fundacional, sob a curadoria do Ministério Público, independente e integralmente feita por cientistas com competência comprovada através de currículo e grau mínimo de doutor nas respectivas áreas de especialização. O ITAPAR terá um quadro permanente de pelo menos 12 cientistas e técnicos das diversas ciências necessárias para o adequado acompanhamento e gestão técnica dos passivos ambientais criados pelas atividades da RPM no município. O ITAPAR desenvolverá atividades de pesquisas científicas e tecnológicas, ensino, extensão e inovação na região.

2. Destinação de 0,2% do faturamento bruto da RPM para financiamento da aquisição da área física e implantação da infra-estrutura básica do Parque de Inovação Tecnológica de Paracatu (Tecnopólo de Paracatu), sob a gestão do ITAPAR, com o envolvimento de empresas inovadoras de base tecnológica e agentes financeiros privados e governamentais.

3. Destinação de 0,25% do faturamento bruto da RPM para indenização justa a todos os atingidos pelas duas barragens de rejeitos da RPM, especialmente os povoados do Machadinho, Santa Rita e Lagoa de Santo Antônio, e a criação e isolamento de zonas de segurança a jusante das barragens, que serão transformadas em unidades de conservação de proteção integral.

4. Destinação de 0,35% do faturamento bruto da RPM para financiamento da criação, implantação e manutenção de, pelo menos, 15 mil hectares de novas unidades de conservação na Área de Proteção Especial de Paracatu, e 5 mil hectares de unidades de conservação na bacia hidrográfica do Ribeirão Santa Rita. Estas unidades de conservação serão do tipo sustentável e do tipo proteção integral. Sua localização e tipo serão definidos em conjunto com a comunidade, órgãos ambientais de várias instâncias administrativas, entidades do terceiro setor, ITAPAR e especialistas independentes, sob a fiscalização do Ministério Público.

5. Destinação de 0,15% do faturamento bruto da RPM para financiamento do projeto “Produtores de Água”, vencedor do Prêmio Furnas Ouro Azul, para duplicar o volume de água do Ribeirão Santa Isabel, que abastece a cidade de Paracatu.

6. Destinação de 0,05% do faturamento bruto da RPM para financiamento de um projeto de produtores de água na microbacia do Ribeirão Santa Rita e construção de escada para peixe no ponto de captação de água da RPM no Ribeirão São Pedro.

7. Destinação de 0,15% do faturamento bruto da RPM para financiamento da recuperação das nascentes e córregos urbanos tributários do Córrego Rico, como o Tanque do Nerva, o Córrego das Termas, o Córrego do Rasgão, Córrego dos Meninos, Olhos d´água e outros.

8. Destinação de 0,1% do faturamento bruto da RPM para financiamento da construção de uma barragem ecológica multifuncional (armazenamento de água, escada para peixe, lazer e turismo e geração de energia elétrica) no Ribeirão Santa Isabel, a montante do ponto de captação de água da COPASA (na margem direita da rodovia MG-188, sentido Paracatu-Guarda Mór), de concreto armado, com escada para peixe e sistema de controle de vazão, para criar capacidade de armazenamento e garantir o suprimento de água atual e futuro de Paracatu.

9. Que a RPM venda, a preço de mercado, pelo menos 3% da sua produção de ouro em Paracatu, para associações de artesãos, empresas e indústrias de jóias e componentes a serem instaladas num centro-escola no município, visando recuperar e desenvolver a antiga tradição de ourivesaria e joalheria da cidade. A cota do ouro produzido pela RPM deverá ser vendida pela empresa para os joalheiros, ourives e artesãos estabelecidos no centro-escola, em Paracatu, na proporção mínima de 2 kg de ouro/artesão/mês, de forma a fomentar uma indústria de artesanato de jóias do tipo exportação, que gerará empregos mais qualificados, nos setores das artes, ofícios e turismo. Estas jóias serão vendidas nos mercados nacional e internacional, com certificação de origem, baseada no apelo ambiental de tratar-se de ouro obtido sem a utilização de mercúrio e com o apelo adicional do benefício social da geração de emprego e renda.

10. Destinação de 0,1% do faturamento bruto da RPM para o financiamento da criação e implantação de um Centro-Escola de Referência Internacional do Artesanato e da Indústria do Ouro em Paracatu. Este Centro-Escola será implantado no Parque de Inovação Tecnológica de Paracatu (O Tecnopólo de Paracatu), onde terá melhores condições para oferecer sua estrutura de uso compartilhado e demais facilidades aos joalheiros, ourives, artesãos e seus aprendizes. e deverá ser adequadamente equipado e provido com recursos humanos de apoio contratados para atuar nas áreas comercial, marketing, design e administração.

11. Aquisição, implantação e manutenção, em diversos pontos da cidade de Paracatu, de estações de monitoramento e análise da qualidade do ar, que informem constantemente sobre o nível da poeira (material particulado em suspensão no ar) e outros parâmetros de qualidade do ar. A operação destas estações ficará a cargo dos pesquisadores independentes do ITAPAR.

12. Implantação e manutenção, em diversos pontos das microbacias atingidas pelo empreendimento da RPM, Córrego do Machadinho/Ribeirão Santa Rita e Córrego Rico e nas bacias adjacentes do empreendimento, Ribeirão Santa Isabel e Córrego do Espalha, de poços de monitoramento da qualidade das águas superficiais e subterrâneas. A implantação e operação destes poços ficará a cargo dos pesquisadores independentes do ITAPAR, custeados pela RPM. Os estudos e monitoramentos devem ser acompanhados, formal e sistematicamente, por um comitê permanente formado por representantes do Ministério Público, entidades do terceiro setor, Prefeitura Municipal de Paracatu e cientistas com competência comprovada através de currículo.

13. Criação de um fundo para recuperação dos Patrimônios Histórico, Artístico, Cultural e Ambiental de Paracatu, com o aporte mínimo de recursos equivalente a 1% (um por cento) do faturamento bruto da RPM, conforme deverá ser definido em conjunto com a comunidade e o MP. A gestão deste fundo ficará a cargo de gestores independentes.

14. Criação de um fundo para Educação, Saúde e Desenvolvimento Social Sustentável, com o aporte mínimo de recursos equivalente a 2% (dois por cento) do faturamento bruto da RPM, conforme deverá ser definido em conjunto com a comunidade e o MP. A gestão deste fundo ficará a cargo de gestores independentes.

15. Que a RPM somente adquira insumos com certificação de origem e apresente medidas compensatórias específicas para danos ambientais que ela causa indiretamente, pelo mecanismo de indução de dano. A RPM deverá contratar uma empresa de certificação idônea.

16. Que a RPM e suas contratadas empreguem e capacitem prioritariamente mão-de-obra local; devem-se instituir mecanismos eficientes de fomento, controle, auditagem, tributação e sanções que garantam a observância à contratação, a capacitação e a melhor remuneração da mão-de-obra qualificada local. Poder-se-ia, por exemplo, determinar que, obrigatoriamente, pelo menos 80% dos funcionários de todos os níveis contratados pela RPM e suas contratadas para trabalhar na planta da empresa em Paracatu sejam nativos de Paracatu. Haveria sanções rigorosas sempre que este percentual fosse menor. O Ministério Público, a Prefeitura, os Sindicatos Profissionais e entidades do terceiro setor deveriam estar envolvidos na aplicação desta medida compensatória.

17. Instituição de um fórum permanente de negociações com a RPM, com a participação obrigatória da própria RPM, das entidades do terceiro setor, sindicatos, associações de moradores, meios de comunicação, Prefeitura Municipal de Paracatu e Câmara Municipal, representantes do Ministério Público e da FEAM, entre outros, para garantir: (1) a fiscalização financeira e tributária de toda a operação da RPM, desde o seu início, em 1987, e daqui para frente; (2) o repasse dos recursos necessários à implantação das medidas compensatórias e mitigatórias; (3) a apresentação e aprovação de novos projetos e medidas compensatórias e mitigatórias a serem implantadas pela RPM em nível, quantidade e qualidade compatíveis com a extensão dos danos ambientais diretos e induzidos, os resultados financeiros da operação (por uma questão de justiça e eqüidade) e as perdas decorrentes da ineficiência dos processos gerenciais e tecnológicos.

Paracatu, 7 de setembro de 2007. Os relatores e subscritores do relatório das recomendações e condicionantes ao licenciamento do projeto de expansão III da RPM, atualizado em 7/09/2007: Sergio Ulhoa Dani (Médico, Dr.med., D.Sc., Livre Docente e empresário, presidente em exercício da Fundação Acangaú e Márcio José dos Santos (Geólogo e empresário, conselheiro e presidente eleito da Fundação Acangaú).”

1 O custo destas medidas soma apenas cerca de 6% do faturamento bruto da empresa previsto com este projeto de expansão, o que, em valores projetados, giraria hoje em torno de R$1 bilhão. A sugestão dos valores foi feita com base em planilhas de custos de projetos semelhantes, como subsídio para a tomada de decisão das partes envolvidas na análise e aprovação destas medidas. A Fundação Acangaú reconhece a necessidade de estudos e projetos para a apuração precisa dos custos de cada uma dessas medidas recomendadas. Estes estudos e projetos devem ser realizados por profissionais independentes, e custeados pela própria RPM, sob o acompanhamento da sociedade, idealmente no bojo de um termo de ajuste de conduta prévio a ser firmado entre a empresa e o Ministério Público.

FINAL DO RELATÓRIO

RELATÓRIO PARTE 9

9. Plano de Fechamento da Mina. Este plano é muito importante para somente ser implantado no longo prazo. Medidas: Urge investir na qualificação e fixação da massa crítica que conduzirá a execução do plano de fechamento da mina, que deverá incluir planos de desenvolvimento do turismo, manutenção das áreas de segurança, enriquecimento da paisagem, nucleação de massa crítica e economia residual sustentáveis. Estas atividades e a massa crítica que as conduzirá poderão ser nucleadas no Tecnopólo de Paracatu, conforme sugestão do item 4, acima.


10. Arrecadação de impostos, royalties e obrigações sociais, trabalhistas, previdenciárias e de seguros. As alíquotas de arrecadação de impostos e royalties sobre as atividades, produtos e recursos da mineração são relativamente baixas no Brasil, se comparadas às de outras atividades, produtos e recursos não renováveis, como o petróleo. O ouro, principal produto da RPM, é um produto de exportação, gozando dos incentivos tributários específicos para a exportação. Além desta perda de receitas de natureza tributária, existem evidências de perda de receitas previdenciárias e de seguros decorrentes da contratação, pela RPM, de empresas optantes pelo regime tributário simples. Uma vez que a empresa é co-obrigada com seus contratados, ela não gozaria da isenção de retenções de diversos impostos federais, em contratos fixos feitos no passado com empresas optantes pelo simples nas áreas de construção civil e contratos de homem-hora, por exemplo. A compensação financeira pela exploração de recursos minerais, nos moldes definidos na Lei nº 7.990, de 1989, e posteriores alterações e regulamentos, conforme informa Sergio Clemes (2002) tem natureza jurídica de receita patrimonial originária. A ela não se aplicam, via de conseqüência, os princípios e normas de Direito Tributário. “Constitui-se a obrigação em verdadeira forma de participação nos resultados da exploração, apesar do nomen iuris contemplado pela lei. Sendo assim, sua base de cálculo há de ser efetivamente o resultado, segundo a previsão contida no §1º do art. 20 da Constituição de 1988. Tendo em vista a necessidade de preservação da integridade de sentido dos termos técnicos consignados no texto constitucional, o conceito de resultado há de ser o empregado pelas Ciências Contábeis, e não substituído pelo de faturamento líquido, como fez o diploma legal em questão” (Sérgio Clemes, 2002). As reservas de ouro anunciadas pela empresa compreendem 15 milhões de onças. Pela cotação atual do metal na bolsa de Nova Iorque, estas reservas podem ser avaliadas em 20 bilhões de reais. Se a tecnologia atualmente empregada pela RPM for capaz de explorar somente 50% destas reservas, desperdiçando os outros 50%, o que seria absurdo, ainda assim teríamos um faturamento bruto da ordem de R$10 bilhões. Com a atual política tributária, a legislação de compensação financeira e as práticas e costumes vigentes, somente uma parcela irrisória desta riqueza ficará na comunidade de Paracatu, o que não parece justo nem compatível com os danos ambientais com os quais as atuais gerações e as gerações futuras terão que conviver, e as necessidades de alavancar um desenvolvimento qualitativo da sociedade. “Por uma questão de justiça e eqüidade, a compensação de um dano tem de estar relacionada com a extensão deste; do contrário, não se poderá falar nem mesmo em reparação, pois não se terá conseguido reconquistar o equilíbrio perdido, ou suplantar o abalo causado” (Sergio Clemes, 2002). Medidas: Deve haver transparência das contas da empresa e sua auditoria e fiscalização, de modo a assegurar os interesses da União, Estado e Município, bem como dos proprietários dos terrenos minerados. Diga-se, de passagem, que a RPM adquiriu extensas áreas urbanas, incluindo toda sua infra-estrutura, que foram incorporação à área da lavra. É preciso averiguar se houve indenização do município pela perda desta infra-estrutura. Deve ser instituído um fórum permanente para negociações envolvendo o Ministério Público, a RPM, a FEAM, as entidades do terceiro setor, os sindicatos, os meios de comunicação e a Prefeitura Municipal de Paracatu, entre outros, para complementar o trabalho das fazendas públicas municipal, estadual e federal e garantir: (1) a fiscalização tributária e financeira de toda a operação da RPM (inclusive, desde o seu início, em 1987); (2) a agregação de valor ao ouro, conforme ítem 8, acima; (3) a apresentação e aprovação de projetos e medidas compensatórias a serem implementados pela RPM em nível, quantidade e qualidade compatíveis com a extensão dos danos ambientais diretos e induzidos, os resultados financeiros da operação (por uma questão de justiça e eqüidade) e as perdas decorrentes da ineficiência dos processos gerenciais e tecnológicos atuais da empresa.

CONTINUA EM RELATÓRIO PARTE 10

RELATÓRIO PARTE 8

6. Qualidade e padrão de vida da população vizinha das áreas de lavra. Os prejuízos sofridos pelos moradores das áreas diretamente afetadas pela mineração incluem desvio de estradas e acessos antigos, emissão de poeira e ruídos, redução e poluição das águas superficiais e subterrâneas, sofrimento e estresse psicológico, constrangimento moral, desestruturação da comunidade, perda de bens de alto valor sentimental, cultural e econômico e abandono dos membros da comunidade à própria sorte. As comunidades que secularmente retiravam parte expressiva de sua renda do garimpo de ouro foram privadas dessa fonte de riqueza. São constantes as reclamações por parte da população vizinha das áreas de lavra, como os habitantes do povoado da Lagoa de Santo Antônio e Santa Rita. À noite, queixam-se da dificuldade de dormir, por conta da poluição sonora causada pelas máquinas; durante o dia, queixam-se da poluição atmosférica com a poeira levantada da lavra a céu aberto, seja pela movimentação das máquinas, seja pelos ventos. A visão do aterro da barragem impõe sofrimento psicológico às pessoas e às famílias que residem ali secularmente. Este sofrimento não pode ser amenizado simplesmente pelas garantias técnicas verbalizadas pela RPM. Esta dimensão de sofrimento psicológico humano ainda não foi devidamente reconhecida e remediada pela empresa. Vários boletins de ocorrência foram registrados junto ao destacamento da PM de Paracatu, tendo como infratora a RPM. Várias ações foram propostas na Comarca de Paracatu tendo como ré a RPM. Muitas outras ações deixaram de ser propostas, em função da pobreza e desamparo da população atingida. Certa ocasião, houve bloqueio do trânsito das máquinas da RPM em uma estrada de acesso à mina que atravessa o povoado da Lagoa de Santo Antônio. Este bloqueio só foi suspenso depois que a RPM enviou caminhões-pipa para molhar a estrada. Esta situação contribui para acirrar os ânimos da população contra a empresa, potencializando as tensões, os conflitos e o sofrimento. Medidas: medidas paliativas, como o asfaltamento das ruas dos povoados situados nas áreas de risco de desastre, são ineficientes no longo prazo. Vide sugestão do item 1.


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RELATÓRIO PARTE 7

6. Qualidade e padrão de vida da população vizinha das áreas de lavra. Os prejuízos sofridos pelos moradores das áreas diretamente afetadas pela mineração incluem desvio de estradas e acessos antigos, emissão de poeira e ruídos, redução e poluição das águas superficiais e subterrâneas, sofrimento e estresse psicológico, constrangimento moral, desestruturação da comunidade, perda de bens de alto valor sentimental, cultural e econômico e abandono dos membros da comunidade à própria sorte. As comunidades que secularmente retiravam parte expressiva de sua renda do garimpo de ouro foram privadas dessa fonte de riqueza. São constantes as reclamações por parte da população vizinha das áreas de lavra, como os habitantes do povoado da Lagoa de Santo Antônio e Santa Rita. À noite, queixam-se da dificuldade de dormir, por conta da poluição sonora causada pelas máquinas; durante o dia, queixam-se da poluição atmosférica com a poeira levantada da lavra a céu aberto, seja pela movimentação das máquinas, seja pelos ventos. A visão do aterro da barragem impõe sofrimento psicológico às pessoas e às famílias que residem ali secularmente. Este sofrimento não pode ser amenizado simplesmente pelas garantias técnicas verbalizadas pela RPM. Esta dimensão de sofrimento psicológico humano ainda não foi devidamente reconhecida e remediada pela empresa. Vários boletins de ocorrência foram registrados junto ao destacamento da PM de Paracatu, tendo como infratora a RPM. Várias ações foram propostas na Comarca de Paracatu tendo como ré a RPM. Muitas outras ações deixaram de ser propostas, em função da pobreza e desamparo da população atingida. Certa ocasião, houve bloqueio do trânsito das máquinas da RPM em uma estrada de acesso à mina que atravessa o povoado da Lagoa de Santo Antônio. Este bloqueio só foi suspenso depois que a RPM enviou caminhões-pipa para molhar a estrada. Esta situação contribui para acirrar os ânimos da população contra a empresa, potencializando as tensões, os conflitos e o sofrimento. Medidas: medidas paliativas, como o asfaltamento das ruas dos povoados situados nas áreas de risco de desastre, são ineficientes no longo prazo. Vide sugestão do item 1.


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RELATORIO PARTE 6

5. Benefícios econômicos passageiros x riscos sócio-ambientais permanentes. A atividade extrativista da RPM é, por definição, insustentável. Os investimentos anunciados pela empresa para custear o projeto de expansão poderão representar, em certa medida, o aumento da produção e fornecimento pelo comércio em Paracatu. Em muito maior medida, entretanto, os investimentos serão consumidos em equipamentos sofisticados, caros e importados. O projeto de expansão gerará cerca de 700 empregos diretos e outros tantos indiretos, podendo alcançar, em determinadas fases da operação da empresa, até 1.500 pessoas diretamente empregadas. Entretanto, a maioria dos empregos gerados é de baixa qualificação (“chão de fábrica”); quase todos os funcionários e prestadores de serviços mais qualificados são recrutados em outras regiões do estado, do país e até do mundo e são temporários; eles pouco contribuem para a conservação da riqueza gerada no município. Agrava o fato de que funcionários de empresas prestadoras de serviços da RPM, que vêm de outras regiões do estado e do país, permanecem em Paracatu após seu desligamento das empresas, causando inchaço urbano, um fenômeno muito comum após a instalação de indústrias que empregam principalmente mão-de-obra pouco qualificada. É preciso desvendar o que tem acontecido com os funcionários de empresas fornecedoras da RPM, quando se encerram os contratos de fornecimento. Uma análise cuidadosa poderá revelar que muitos desses indivíduos permanecem na cidade, criando demandas por produtos e serviços urbanos, nem sempre adequadamente atendidas, e não raro deixam filhos bastardos na cidade. Soma-se a isso a perda da renda da comunidade local que foi privada do acesso às áreas de garimpo de ouro e não teve alternativas econômicas que compensassem esta perda. Isso cria um processo de marginalização em uma parcela considerável da população, com impactos sócio-econômicos e culturais significativos, como o aumento da criminalidade, conflitos, invasões, insegurança e poluição, que precisam ser bem monitorados, compreendidos e tratados. A arrecadação tributária, nos moldes e alíquotas atuais, não é capaz de fazer face ao aumento da demanda por modernização da infra-estrutura urbana, e deixará de existir quando a empresa encerrar suas atividades em Paracatu. Mas os problemas não deixarão de existir em Paracatu com a saída da RPM. A simples presença da empresa em Paracatu gera expectativas e especulações, que são suficientes para atrair mais mão-de-obra desqualificada para a cidade, agravar o inchaço urbano, aumentar o custo de vida (aumento dos preços aluguéis, produtos e serviços) e diminuir a qualidade de vida (expansão urbana desordenada, aumento da poluição, da marginalização e da criminalidade, etc.). Medidas: É fundamental que a RPM e suas contratadas empreguem e capacitem prioritariamente mão-de-obra qualificada local; devem-se instituir mecanismos eficientes de fomento, controle, auditagem, tributação e sanções que garantam a observância à contratação, a capacitação e a melhor remuneração da mão-de-obra local. Poder-se-ia, por exemplo, determinar que, obrigatoriamente, pelo menos 80% dos funcionários de todos os níveis contratados pela RPM e pelas suas contratadas para trabalhar na planta da empresa em Paracatu sejam nativos de Paracatu. Há muitos nativos de Paracatu altamente qualificados, atuando profissionalmente em outras cidades ou mesmo no exterior, que poderiam ser recrutados pela RPM. Haveria sanções rigorosas sempre que este percentual fosse menor. O Ministério Público, a Prefeitura, os Sindicatos Profissionais e entidades do terceiro setor deveriam estar envolvidos na aplicação desta medida compensatória. Cabe aqui também uma sugestão semelhante àquela feita no item anterior: apoiar, financeiramente, a manutenção de serviços tecnológicos permanentes de antropologia urbana, ordenamento ambiental e planejamento estratégico para o desenvolvimento sustentável, baseados no Instituto de Tecnologia Ambiental de Paracatu (ITAPAR), que deverá ser estrategicamente constituído em um Tecnopólo em Paracatu. Uma das funções primordiais destes serviços seria tirar o máximo proveito da “bolha de crescimento” representada pelo projeto de expansão da RPM, a fim de desenvolver e implantar estratégias de desenvolvimento sócio-econômico sustentáveis, como a diversificação das atividades econômicas (veja, por exemplo, item 8 – Joalheria, ourivesaria, artes, ofícios e indústria fina, abaixo). O que não pode continuar a acontecer é a RPM, suas contratadas e as autoridades constituídas deixarem de se esforçar por compreender e atacar estes sérios problemas em uma justa medida.


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RELATORIO PARTE 5

4. Recuperação da biota na área minerada durante e após o fechamento da mina. Não é possível prever, atualmente, como evoluirá a biota sobre a área minerada e estéril. Esta situação gera insegurança e traz questões de ordem biótica, paisagística, sanitária, epidemiológica e ecológica que precisam ser respondidas. Um dos grandes problemas diz respeito à geração de poeira a partir da superfície desnuda da lavra, fato que vem ocorrendo desde o início da mineração da RPM em Paracatu. Embora a RPM tenha contratado, pontualmente, equipes externas para conduzir alguns estudos preliminares, inclusive de recuperação e recomposição da área minerada, recomenda-se que uma maior ênfase seja dada no sentido de estabelecer massa crítica local permanente, encarregada do monitoramento permanente da biota e das intervenções necessárias, em uma base contínua. Medidas: Esta medida compensatória poderá ser obtida mediante o financiamento, pela RPM, de uma estrutura mínima, porém suficiente, de um Instituto de Tecnologia Ambiental em Paracatu (ITAPAR). Já existem planos de expansão do Tecnopólo Vale do Acangaú, organizado nos moldes de um Condomínio Empresarial Parque Tecnológico, em área contígua ao CEPID-Centro de Ensino, Pesquisa, Inovação e Difusão do Acangaú e RPPN homônima, onde a própria RPM já investiu, por força de medida compensatória, 600 mil reais em infra-estrutura e estudos, no período de 2003-2007. A renovação da participação da RPM neste Tecnopólo certamente trará benefícios para toda a comunidade e para a própria empresa. O Mecanismo Parque Tecnológico propiciará economia, facilidades e conveniências à RPM, ao facilitar e dinamizar o acesso a serviços e produtos locais de alta qualidade e baixo custo. Ao mesmo tempo, contribuirá para desenvolver a massa crítica necessária para apoiar ou conduzir os processos de monitoramento e recuperação ambiental que são, necessariamente, de longo prazo e sobreviverão ao fechamento da mina, previsto para daqui a 30 anos. Os tecnopólos são grandes molas propulsoras do desenvolvimento sustentável das cidades, em várias partes do mundo.


Continua em RELATORIO PARTE 6

RELATORIO PARTE 4

3. Drenagem ácida, rebaixamento do lençol freático, equilíbrio hidrogeológico e a questão do abastecimento de água. Estes quatro pontos estão concatenados. A direção técnica da RPM argumenta que as rochas de filito da mina são em grande parte impermeáveis. Entretanto, esses filitos grafitosos são fraturados e intercalados com muitos bolsões de quartzo, o que indica a existência de fraturas. Além destas fraturas, há ocorrência de falhas, pois a mina do Morro do Ouro está em uma região de contato de pelo menos duas unidades geológicas de idades distintas. O falhamento nestas regiões de contato é intenso e as rochas se apresentam muito fraturadas. Estes falhamentos dão grande vazão à água. O próprio Córrego Rico, que atravessa a cidade de Paracatu, corre sobre uma destas falhas. Existe o risco de que estas fraturas tanto possam drenar acidez liberada na mina para as microbacias adjacentes, quanto seqüestrar água destas microbacias, afetando o equilíbrio hidrogeológico local. Os impactos mais imediatos da mineração concentram-se sobre o córrego conhecido como “Praia dos Macacos”, uma das nascentes do Córrego Rico, que margeia o bairro conhecido como Alto da Colina, e atravessa sob a BR 040 em direção à cidade de Paracatu. O aprofundamento da lavra certamente drenará água que, em condições normais verteria para o Córrego Rico. A RPM contemplou este cenário na elaboração de medidas de controle, incluindo o bombeamento de água para o Córrego Rico, enquanto o lago resultante do aprofundamento da lavra não seja preenchido pela água das chuvas até próximo do nível do lençol freático atual, atingindo um ponto de equilíbrio. Este ponto de equilíbrio, segundo modelagem feita pelo corpo técnico da empresa, deverá ocorrer de 11 a 16 anos após o fechamento da mina; entretanto, “após o encerramento das atividades da mina e o enchimento da cava (formação do lago), esta funcionará como uma grande bacia fechada, dentro do sistema hidrogeológico local. A modelagem prevê que, no pós-fechamento, os níveis de água subterrânea sofrerão depleção de 3 a 14 metros, em relação à condição atual, em parte da área mais próxima da mina” (1), o que lança dúvidas sobre quem arcará com os custos de manutenção da vazão do Córrego Rico, após o fechamento da mina. A manutenção da vazão do Córrego Rico é muito importante, seja por razões de ordem ecológica, paisagística e cultural, seja por razões de ordem sanitária, visto que todo o sistema de evacuação e tratamento de esgotos da cidade de Paracatu é baseado no transporte dos dejetos pela água. As tímidas medidas propostas pela RPM para compensar o impacto sobre o Córrego Rico, notadamente, o bombeamento de água e a construção de um Parque Ecológico Linear podem ser consideradas de natureza cosmética, porque não compensarão, de modo eficiente, a redução de vazão causada pela atividade da mineração. Seria preciso um conjunto de ações muito mais extensas, envolvendo a desapropriação de faixas de terrenos ao longo de todas as nascentes e córregos tributários do Córrego Rico dentro do perímetro urbano, sua recuperação ambiental, revitalização e proteção legal como Áreas de Preservação Permanente não edificável. Dois exemplos são o Córrego do Rasgão e o Córrego das Termas, que se originam de um afloramento do lençol freático no centro da cidade de Paracatu e encontram-se hoje quase totalmente canalizados. No passado, o Córrego das Termas fornecia água potável para a população de Paracatu. Além disso, será preciso tomar especial cuidado na análise independente dos possíveis efeitos dos represamentos das barragens de rejeitos e do rebaixamento do lençol freático – previstos no plano de expansão apresentado pela empresa – sobre a dinâmica hídrica nas microbacias do Córrego do Espalha e Ribeirão Santa Rita, adjacentes à microbacia onde a mineradora opera. A microbacia do Córrego do Espalha, juntamente com a do Ribeirão Santa Isabel, constituem uma APE – Área de Proteção Especial, criada pelo Decreto Estadual n° 29.587 de 03/06/1989 com a finalidade de proteger os únicos mananciais de abastecimento da cidade de Paracatu, o que justifica estas preocupações. A falta d’água na cidade aumenta a pressão de uso dos recursos hídricos destas bacias. Paracatu é uma das cidades brasileiras com o maior consumo per capita de água: são 180 litros de água/habitante/dia. A presença da RPM aumenta o consumo de água em Paracatu e cria novas necessidades de abastecimento, de várias formas, entre as quais citam-se: (i) o aumento da população de funcionários da RPM e de suas contratadas, que aumentam o consumo de água na cidade – essa água é proveniente do sistema APE/Ribeirão Santa Isabel; (ii) o aumento do gasto de água para limpeza dos domicílios e automóveis sujos pela poeira da mineração que atinge a cidade – essa água também é proveniente do sistema APE; (iii) o aumento do consumo de água na própria empresa, no processo de hidrometalurgia e carreamento dos rejeitos – esta água é proveniente da bacia do Ribeirão Santa Rita/São Pedro e dos tanques do Morro do Ouro; (iv) a perda de água por evaporação nas barragens de rejeitos (principalmente água do sistema Santa Rita/São Pedro) (v) a necessidade do aumento da captação de água na microbacia do Santa Isabel e nos córregos e nascentes urbanas, visando compensar a diminuição da vazão do Córrego Rico, causada pela destruição de duas nascentes deste córrego e da bacia de recarga das mesmas, o Morro do Ouro, que foi totalmente destruída pela mineração. As águas dos esgotos tratados da cidade de Paracatu retornam ao Córrego Rico, e essas águas são provenientes do sistema APE/Santa Isabel, cuja capacidade de produção e armazenamento de água deve ser aumentada; da mesma forma, os afluentes urbanos do Córrego Rico devem ser recuperados. Medidas: deve-se contratar uma equipe de especialistas independentes para a execução de um estudo hidrogeológico completo das microbacias do Córrego Rico, Ribeirão Santa Isabel, Córrego do Espalha e Ribeirão Santa Rita, e para a instalação e operação, nestas microbacias, de poços de monitoramento da qualidade e quantidade da água, situados em pontos a ser determinados pela equipe. Estes estudos e monitoramentos devem ser acompanhados, formal e sistematicamente, por um comitê permanente integrado por entidades do terceiro setor, produtores de água, consumidores de água e técnicos especialistas do Instituto de Tecnologia Ambiental que deverá ser criado em Paracatu (o ITAPAR, conforme será descrito adiante), e totalmente custeados pela RPM. Deve-se considerar ainda, a título de medida compensatória a ser implementada pela RPM, o custeio das obras que aumentarão a capacidade de captação e armazenamento de água nas microbacias da APE, na microbacia do Ribeirão Santa Rita e nas nascentes e córregos urbanos, como o Tanque do Nerva/Córrego do Rasgão, o Córrego das Termas, o Córrego dos Meninos, o Olhos d´água e outros afluentes urbanos do Córrego Rico. Espera-se que a RPM invista no Projeto Produtores de Água do Acangaú (vencedor do Prêmio Furnas Ouro Azul, em 2004) e na construção de uma barragem multifuncional (armazenamento de água, escada para peixe, lazer e turismo e geração de energia elétrica) no Ribeirão Santa Isabel, a montante do ponto de captação da COPASA, na margem direita da rodovia MG-188, sentido Paracatu-Guarda Mór. Defende-se também que a RPM é responsável pelo custeio de um projeto Produtores de Água na bacia do Ribeirão Santa Rita, uma vez que ele seria profundamente impactado pela nova barragem planejada pela empresa, e pela recuperação das nascentes e córregos urbanos tributários do Córrego Rico, já citados.

1 Eduardo Chapadeiro, David Banton, Celso de Oliveira Loureiro, Juliana M. M. Esper, Rodrigo Dutra Amaral: Estudos Hidrogeológicos na Mina Morro do Ouro, Paracatu, MG.

Continua em RELATORIO PARTE 5

RELATÓRIO PARTE 3

2. Indução de danos ambientais indiretos, em áreas distantes da mina. Para implantar os seus diversos processos produtivos e a sua política de relacionamento com a comunidade, a RPM necessita adquirir materiais no mercado de Paracatu e de outras regiões. Por exemplo, a empresa adquire areia e cascalho, em grandes volumes. A Fundação Acangaú, a pedido do Ministério Público, fez perícias técnicas em pelo menos uma cascalheira, situada na Área de Proteção Especial das microbacias que abastecem de água a cidade de Paracatu. Os principais compradores daquele cascalho eram a Rio Paracatu Mineração e a Prefeitura Municipal. Apesar da ação do MP, uma cascalheira continua operando na APE, amparada por uma autorização concedida pelo Prefeito e seu Secretário de Meio Ambiente, datada de outubro de 2006. Recentemente, boa parte do cascalho assim obtido na APE foi utilizada para a pavimentação de ruas no povoado da Lagoa de Santo Antônio, a fim de cumprir uma promessa da RPM e da Prefeitura Municipal feita àquela comunidade, que no passado apresentou resistência contra a RPM, chegando, em uma ocasião, a impedir o trânsito das máquinas da empresa pelo povoado. De forma semelhante, a RPM adquire areia de dragas instaladas em córregos e ribeirões da região, que operam sem a devida licença e causando danos ambientais não remediados. É preciso que a RPM trate de comprar somente material de origem certificada. A empresa deve apresentar projeto de compensação pelos danos ambientais que ela causa indiretamente, pelo mecanismo de indução de dano.


Continua em RELATORIO PARTE 4

RELATÓRIO PARTE 2

II – Questões a serem tratadas por análises independentes do Projeto de Expansão III da RPM e pela adoção de medidas compensatórias:

1. Segurança das barragens. Toda grande barragem de contenção de resíduos de mineração apresenta riscos de rompimento, especialmente as grandes barragens de terra. As barragens acumulam enorme energia potencial, e estão constantemente sujeitas aos processos erosivos causados, principalmente, pela água das chuvas. A terra absorve água e se expande, provocando fraturas, num processo que é tanto maior quanto maior é a altura e comprimento da barragem. A crista da barragem atual da RPM está a cerca de 200 metros acima dos povoados da Lagoa de Santo Antônio e de Santa Rita. O povoado da Lagoa, provavelmente o assentamento humano mais antigo, o que deu origem à cidade de Paracatu, conta atualmente com cerca de 150 habitações humanas simples, e uma população estimada em 1.500 pessoas, a maioria de baixo nível sócio-econômico. O rompimento dessa barragem – ainda que considerado muito improvável ou remoto pela gerência técnica da empresa – poderia causar a destruição deste povoado e a morte de seus habitantes, que seriam sepultados em um mar de lama em poucos segundos. Rachaduras ou fissuras na crista desta barragem são comuns e podem ser detectadas até mesmo em fotos de satélites. Rompimentos de barragens deste tipo já foram registrados no Brasil, inclusive no estado de Minas Gerais, e em vários outros países, inclusive em países desenvolvidos, num passado recente. A empresa pretende construir uma segunda barragem, que originará uma bacia de decantação ainda maior que a atual, formando uma superfície de 1.000 hectares na região do Machadinho e Santa Rita e potencializando ainda mais os riscos inerentes a estas grandes barragens. O povoado de Santa Rita conta com aproximadamente 70 casas simples e uma população estimada em cerca de 500 pessoas, a maioria de baixo nível sócio-econômico. Aqui também existe o risco de comprometimento de pelo menos uma das principais nascentes do Ribeirão Santa Rita, o que feriria o direito destas famílias à água e ao usufruto do ribeirão, que secularmente lhes assiste. O temor é bem fundamentado, pois esse fato ocorreu com o Córrego de Santo Antônio, cuja nascente foi sepultada sob a barragem de rejeitos atual da empresa. O volume e a qualidade da água deste Córrego diminuiu sensivelmente em função da barragem que sedimentou toda a sua bacia de drenagem a montante. Medidas: A RPM aparentemente não previu áreas de segurança isoladas a jusante das barragens, transferindo desta forma todo o risco para a população. Esta situação não é aceitável e a RPM deverá elaborar estudos e apresentar planejamentos e cronogramas físico-financeiros visando a indenização e eventual relocalização dos habitantes dos povoados do Machadinho, Lagoa de Santo Antônio e Santa Rita e a recuperação ambiental, reflorestamento e isolamento destas áreas e áreas adjacentes, consideradas de RISCO DE DESASTRE. Estas áreas deverão ser adquiridas pela empresa e doadas ao estado, município ou união, com a finalidade de criação de uma unidade de conservação de proteção integral, como Reserva Biológica, Refúgio da Vida Silvestre ou outro tipo, correndo todas as despesas da criação desta UC por conta da RPM. A relocalização e indenização dos moradores e proprietários da área devem ser feitas em local e condições definidas em comum acordo das partes. Muitos moradores das áreas afetadas pela mineração já se viram forçados a abandonar suas comunidades originais, devido às atividades da mineração, e migrar para a zona urbana de Paracatu, causando inchaço urbano e sofrimento humano. A maioria destas pessoas não têm estrutura, idade ou nível de instrução suficientes para se adaptar à nova vida na cidade, e a estrutura urbana atual de Paracatu não oferece as condições de qualidade de vida e de ambiente esperada por estas pessoas. Estes pontos serão mais explorados nos itens 5, 6 e 7, abaixo.

Continua em RELATORIO PARTE 3

RELATÓRIO PARTE 1

A íntegra do relatório com as medidas recomendadas pela Fundação Acangaú

Segue a íntegra do relatório da Fundação Acangaú contendo medidas compensatórias a serem aplicadas pela Rio Paracatu Mineração no município de Paracatu, vinculadas ao projeto de expansão III da empresa. O custo total destas medidas soma cerca de 6% do faturamento bruto da empresa previsto com este projeto de expansão, o que, em valores projetados, giraria hoje em torno de R$1 bilhão. A sugestão dos valores é aproximada, e foi feita como subsídio para a tomada de decisão das partes envolvidas na análise destas medidas. O relatório foi protocolado junto aos órgãos ambientais. Em três dias de discussão em praça pública, foram colhidas 600 assinaturas de apoio ao relatório. A Fundação Acangaú promete colher mais assinaturas junto à população e convidar a RPM para participar dos debates e discussões.

Entendimentos e recomendações para avaliação independente dos impactos ambientais e sócio-econômicos do Projeto de Expansão III da Rio Paracatu Mineração em Paracatu-MG, com vistas à adoção de medidas eficientes e sustentáveis de monitoramento, controle, mitigação e compensação.

I – O empreendimento da RPM em Paracatu

A RPM é uma subsidiária do grupo Kinross, de origem canadense. A empresa foi adquirida pela Kinross do grupo de origem inglesa, Rio Tinto, que havia implantado o empreendimento em 1987, no Morro do Ouro, que faz divisa com o assentamento urbano de Paracatu-MG, a oeste, e com os povoados da Lagoa de Santo Antônio e de Santa Rita, a leste. As características principais da mina do Morro do Ouro são a lavra a céu aberto, feita sobre um subsolo de filito fissurado, e os baixos teores de ouro no minério – 0,4 g de ouro por tonelada de minério moído sulfetado. Esses fatos têm conseqüências e impactos ambientais importantes. Em primeiro lugar, o baixo teor de ouro torna necessária a aplicação de processos sofisticados de moagem e hidrometalurgia que concentram o metal em diversas etapas industriais, gerando resíduos em grande volume, sendo o principal deles o próprio minério, finamente particulado, sulfetado e com a presença de chumbo, cádmio e arsênio. Este minério, que se torna ácido na presença da água e do oxigênio atmosféricos, é parcialmente inativado com calcário e em seguida é depositado em um lago artificial de sedimentação com uma superfície atual de cerca de 800 hectares, no vale adjacente à área da lavra. Este lago é contido por uma grande barragem de terra, argila, cascalho e areia, cujo pé situa-se a 570 metros de altitude, crista com 4 km de extensão e 692 metros de altura final prevista (altura atual = 650 m). A maior parte da água utilizada pela RPM nos seus processos industriais – cerca de 80% – é reaproveitada a partir do bombeamento reverso da água excedente do lago de sedimentação; o restante é bombeado a partir de uma captação da empresa no Ribeirão São Pedro. Decorridos 20 anos de lavra, a RPM prepara-se para expandir sua planta industrial a fim de explorar uma reserva estimada em 15 milhões de onças de ouro, avaliada hoje em R$20 bilhões, caso toda a reserva seja efetivamente explorada. Para atingir seus objetivos, a empresa deverá fazer um investimento da ordem de US$470 milhões nos próximos anos. Estima-se que a empresa operará por mais trinta anos, antes da exaustão das reservas e o fechamento da mina do Morro do Ouro. Entretanto, outros sítios de mineração já são prospectados e adquiridos pela empresa, fazendo crer que a duração do empreendimento poderá ser bem maior.

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sábado, 19 de janeiro de 2008

O arsênio afeta a saúde humana

O arsênio afeta a saúde humana (1)

Richard Martin - Austin, Texas USA

O envenenamento crônico por arsênio causa numerosos problemas de saúde no corpo humano.

O que é arsênio?

O arsênio inorgânico é considerado um veneno para seres humanos desde os tempos antigos. O arsênio é um material metálico altamente tóxico, branco-acinzentado. Arsênio inorgânico é criado quando o elemento arsênio combina-se com oxigênio, cloro ou enxofre. Arsênio inorgânico tem sido usado como veneno em pesticidas e herbicidas, e também em caldas de conservantes para tratamento de madeira. O arsênio inorgânico é um veneno extremamente tóxico. Os compostos orgânicos ou inorgânicos de arsênio não avisam da sua presença: eles são pós brancos ou sem cor, e não têm cheiro nem gosto. Pode parecer incrível, mas um grama de arsênio é veneno suficiente para matar sete pessoas adultas.

Como o arsênio pode afetar minha saúde?

O arsênio pode ser inalado ou ingerido ou, em menor grau, assimilado pela pele. Basta a décima parte de um grama acumulada durante dois meses para causar a morte, e o arsênio causa câncer em níveis muito menores.

Água: O limite internacional de segurança do arsênio na água potável já foi de 50 ppb (partes por bilhão), depois passou para 10 ppb e agora já existem países que querem baixar para 2 ppb.

Solo: A Agência de Proteção Ambiental (EPA) norte-americana estabeleceu um limite de segurança de 10 ppm (10 mg por kg) de arsênio no solo. Níveis de arsênio acima deste limite dão o direito à EPA de ordenar a descontaminação de um estabelecimento comercial pelo proprietário.

Ar: Os limite internacional máximo permitido para exposição ao arsênio inorgânico em ambiente de trabalho é de 10 microgramas por metro cúbico, calculado como um média em um dia de oito horas (OSHA- Occupational Safety and Health Administration, Estados Unidos da América). O arsênio já foi detectado no cabelo, sangue e urina de crianças que viviam perto de uma usina termoelétrica que queimava carvão com um conteúdo de arsênio de apenas 1.000 grams por tonelada. Ototoxicidade por arsênio trazido pelo ar resultou em um aumento significativo de perda auditiva entre crianças expostas.

Detecção e dosagem

Sinais de alerta: Tanto o arsênio inorgânico quanto o orgânico não dão nenhum sinal de sua presença. Os compostos de arsênio são pós brancos ou incolores sem nenhum gosto ou odor específicos. Dada a quantidade diminuta requerida para produzir um efeito letal, a ausência de sinais de alerta tornam estas substâncias muito mortíferas.

Presença: Arsênio inorgânico é encontrado em muitos tipos de rocha, especialmente nos minérios que contêm cobre, chumbo, prata e ouro. Quando esses minérios são triturados para extrair os metais valiosos, a maior parte do arsênio é coletada para a produção de pesticida. Como no caso da radiação, todos nós somos expostos a baixos níveis de arsênio (especialmente arsênio inorgânico) porque níveis muito baixos dele estão sempre presentes no solo, água, alimentos e ar. Uma pessoa ingere em média cerca de 8 microgramas (cerca de 8 milésimos de um grama) na comida todo dia. Arsênio também está presente na fumaça de cigarro onde ela se origina dos inseticidas usados no tabaco.

Mecanismos de assimilação: O arsênio pode ser ingerido, aspirado quando se respire poeira, e, em um grau muito menor, pela absorção através da pele. Envenenamento acidental já foi registrado em casos de uso de vestimentas inadequadas durante a aplicação de produtos baseados em arsênio.

Uma dose letal de arsênio também pode ser alcançada mediante um processo acumulativo durante semanas ou meses. Doses múltiplas sub-letais recebidas durante um período de várias semanas podem acumular no corpo até alcançar uma dose letal. E em doses muito pequenas, o arsênio causa câncer.

Toxicidade do Arsênio

A dose letal aguda de arsênio inorgânico para humanos foi estimada em cerca de 0,6 mg/kg/dia: isso significa que para um adulto de 70 kg, uma dose tóxica é de 42 mg ou 0,042 gramas. Para uma criança de 10 kg, isso seria equivalente a uns 6 mg or 0,006 grams. A título de comparação, 1 grama de arsênio é suficiente para matar 7 pessoas adultas.

A exposição a altos níveis de arsênio inorgânico – mais de 100 ppm de arsênio no alimento e na água – também pode ser fatal. O arsênio e compostos de arsênio são agentes causadores de cancer bem conhecidos e têm sido implicados em cânceres de pulmão e pele e também têm sido associados com defeitos congênitos (defeitos de nascimento). Embora o arsênio orgânico (arsênio combinado com compostos de carbono) seja menos tóxico, ele causa efeitos semelhantes.

Gás arsino: O gás arsino (AsH3) é produzido quando arsênio-elemento ou arsênio inorgânico reage com compostos de zinco ou certos fungos. O gás arsino tem sido usado como arma química de gás tóxico para o sistema nervoso, e ele é preparado mediante a reação do zinco com arsênio, na presença de um ácido. Tetos de zinco galvanizado em áreas de chuva ácida poderiam, teoricamente, causar esta reação, embora o volume esperado de arsino seria baixo. Já armazenar cinzas de madeira imunizada com produtos à base de arsênio em uma lata galvanizada pode ser um pedido de problema.

Mesmo em concentrações tão baixas quanto 3-10 ppm, o gás arsino pode causar efeitos tóxicos em poucas horas. Onde o gás arsino é encontrado em baixíssimos níveis o início da doença é lento e insidioso. Após um período de meses, efeitos hemolíticos cumulativos se apresentam na forma de dispnéia (falta de ar) mesmo durante o descanso (falta de ar), intolerância grave ao exercício e uma taquicardia (pulso com freqüência aumentada). Estes sinais podem estar acoplados com sintomas neurológicos vagos, com uma sensação estranha nas pernas. A hipóxia resultante da exposição a baixos níveis de gás arsino pode levar a desmaios de duração variável.

Neste estágio, a remoção da fonte de contato com o gás arsino pode não ajudar, por causa do “período de latência” de um a seis meses no desenvolvimento dos sintomas neurológicos. A recuperação dos efeitos hemolíticos leva a uma condição compensatória de “policitemia”, ou excesso de células vermelhas do sangue, em pacientes com metabolismo normal destas células.

A exposição mais prolongada a baixos níveis de gás arsino leva a um terceiro estágio da doença que tem semelhanças com o início do envenenamento agudo pelo gás arsino, incluindo urina amarronzada, tontura, dor de cabeça e delírio. Segue-se uma paralisia progressiva das pernas e braços, levando à “queda do pé”, “queda do punho”, ataxia e sintomas gerais incluindo problemas com a propriocepção ou senso de posição.

A recuperação da exposição sub-letal ao arsino é lenta: seis meses de paralisia variável seguidos de um período de recuperação de dois a quatro anos. Dependendo da exposição, existe a possibilidade de lesão neurological permanente afetando as extremidades, particularmente as mãos e os dedos.

Os efeitos do gás arsino sobre crianças e fetos não estão bem documentados, mas existem algumas evidências. No final da década de 1950, o exército da Nova Zelândia tratou roupa de cama e peles de carneiros usadas nas camas com um composto de arsênio com ação fungicida (o arsênio ainda é usado como fungicida em madeira tratada). Entretanto, um fungo chamado 'Scopulariopsis breviculis' pode metabolizar o arsênio e emitir gás arsino como um sub-produto. O gás arsino pode ter sido responsável por uma alta taxa de mortalidade infantil da síndrome da morte súbita infantil (SMS) ou “morte do berço” naquela época na Nova Zelândia. A “morte do berço” ou SMSI esteve anormalmente alta nas famílias de militares onde o arsênio foi usado como um fungicida nas “roupas de cama oficiais”.

Uma instituição de grande prestígio de fabricantes de relógios circulou um alerta aos seus membros que na renovação de velhos relógios havia risco de envenenamento por gás arsino devido ao pigmento 'Scheeles Green' usado nos mostruários dos relógios.

O mesmo fungo 'Scopulariopsis breviculis' mencionado acima foi responsável pelos envenenamentos de “papel de parede e pasta” do século 19 na Europe. O arsênio usado como fungicida no papel de parede era metabolizado pelo fungo e o gás arsino era liberado.

(A informação sobre gás arsino foi uma cortesia de Brian Shadd, Diagnostic engineers, UK.)

Sinais do envenenamento por arsênio

Os efeitos do envenenamento leve a partir da inalação de arsênio ou seus compostos incluem perda do apetite, náusea, e diarréia. Efeitos da exposição mais intensa ao arsênio incluem (1) sensação de “pinicação” nas palmas das mãos, ou câimbras nos músculos da panturrilha; (2) calor e irritação na garganta e estômago, um odor de alho no hálito e na respiração, ou um gosto metálico na boca; (3) vômitos, aumento da frequência das evacuações, com fezes muito soltas; (4) efeitos neurológicos, incluindo irritabilidade, inquietação, dores de cabeça crônicas, apatia, fraqueza, tontura, delírio, sonolência, convulsões ou coma.

O envenenamento crônico por arsênio causa numerosos problemas de saúde no corpo humano. Os sintomas mais comuns do envenenamento por arsênio são lesões de pele visíveis, do tipo hiper-pigmentação (melanose), hiperceratose das palmas das mãos e solas dos pés (ceratose), problemas respiratórios, problemas nos olhos, doença cardiovascular, como hipertensão e doença do pé preto, diabetes, neuropatia periférica e efeitos reprodutivos adversos que incluem aborto espontâneo, nascimento de prematuros e morte neonatal. Medidas de QI verbal e a memória de longo prazo também podem ser afetadas, e o arsênio pode surprimir a regulação hormonal e a transcrição gênica mediada por hormônio.

Os efeitos mais fatais são gangrena, insuficiência renal e insuficiência hepática e câncer de órgãos internos, particularmente câncer de bexiga e de pulmão. Como o arsênio interfere com o metabolismo de energia do corpo, os pacientes arsenicosos invariavelmente sofrem de fraqueza generalizada.

Os efeitos mais sérios do arsênio, como cancer e diabetes, requerem exposições longas e contínuas, talvez de 20 anos ou mais.

Sinais de exposição de longo prazo ao arsênio incluem: (1) desenvolvimento de marcas brancas nas unhas; (2) escurecimento da pele, lesões de pele, rash cutâneo (manchas salientes na pele) e o aparecimento de pequenas feridas nas palmas, solas e dorso, e de manchas que lembram “pingos de chuva em uma estrada empoeirada”.

Tatamento

O arsênio é eliminado do corpo rapidamente, portanto o remédio mais importante para o envenenamento por arsênio é eliminar a exposição. Os efeitos mais graves do arsênio, como cancer e diabetes, requerem longo prazo de exposição contínua para se manifestar, talvez 20 anos ou mais.

Envenenamento imediato agudo pelo arsênio: Indivíduos com suspeita de envenenamento por ingestão de arsênio devem ser sempre encaminhados aos cuidados médicos imediatos. Não há antídotos para o envenenamento imediato por arsênio, e o melhor que pode ser feito imediatamente após a ingestão é provocar o vômito. Lavagens ou eméticos – apomorfina, sulfato de zinco, ipeca, leite de magnésia, entre outros – devem ser usados, sob supervisão médica, a intervalos de até dois dias, em seguida administrar óleo de castor. Fluidos intravenosos geralmente são necessários para prevenir a desidratação. Pessoas com suspeita de envenenamento por arsênio sempre devem ser encaminhadas aos cuidados médicos imediatos.

Uma vez que o arsênio foi ingerido, o melhor tratamento deve ser a administração de agentes que se ligam ao arsênio e ajudam a prevenir seus efeitos tóxicos. Como o arsênio liga-se fortemente ao enxofre, os compostos baseados em enxofre e agentes quelantes têm sido empregados com sucesso. Agentes quelantes como o "British anti-lewisite" (BAL) agem ligando fortemente o arsênio em complexos, tornando-o inativo. Isso pode ajudar a desativar o arsênio e removê-lo do corpo de uma pessoa, evitando a intoxicação grave e a morte.

Agentes quelantes ligam-se fortemente aos metais como arsênio e mercúrio, e podem ajudar a eliminar esses metais do sistema.

(1) traduzido e adaptado de um texto obtido na internet e na Old House Magazine, número 17, Março/Abril 1998, Página 118-125.