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domingo, 15 de outubro de 2017

Por que falta água em Paracatu (ou: por que Paracatu ainda tem água)?

Sergio U. Dani, de Trübbach, Suíça, 15.10.2017



Foto │ Ribeirão Santa Isabel, completamente seco, logo abaixo do ponto de captação de água para abastecimento público de Paracatu. Foto postada no Facebook pelo vereador Edivar Andrade, em 21 de setembro de 2017.

Para entender porque falta água em Paracatu ou porque Paracatu ainda tem água é preciso entender algo muito simples: a água é armazenada nos solos e subsolos, assim como o dinheiro é guardado nos bancos e nos colchões, e quanto mais se deposita, mais se tem e se pode retirar, e quanto menos se deposita, menos se tem e menos se pode retirar. Os solos e subsolos são uma espécie de “conta bancária” de água.

O depósito da água no solo é feito pelas chuvas. A manutenção da água no solo e no subsolos é feita pela vegetação, pelos microorganismos e pelas rochas. A retirada da água dos solos e subsolos é feita, principalmente, pela força da capilaridade da água, que conduz boa parte da água dos solos de volta à atmosfera, e a força da gravidade, que conduz parte da água dos subsolos para os rios. Os rios são meros condutores do excesso de água que não pôde ser retido pelos solos e subsolos.

Fatores climáticos regionais e globais definem o clima em que vivemos, e consequentemente a quantidade de água de chuva que é depositada nos solos e subsolos. Nós exercemos pouca influência sobre esses fatores, assim como exercemos pouca influência sobre os fatores macroeconômicos. 

Entretanto, ao interferir nos mecanismos de depósito de água nos solos e subsolos, ou nos mecanismos de retirada da água depositada da “conta bancária” dos solos e subsolos, nós exercemos uma influência direta sobre a quantidade de água que é armazenada nos solos e subsolos. Consequentemnte, é nossa culpa se depositamos pouco e retiramos muito, zeramos o saldo ou criamos um saldo negativo.

O que acontece em Paracatu é exatamente isso. Tem chovido menos, esse é um fenômeno regional sobre o qual temos pouca influência, mas do qual temos consciência através dos resultados das medições de precipitação que são de amplo conhecimento. Em vez de nos adaptarmos a esta realidade, aumentando a capacidade de armazenamento de água nos solos e subsolos para fazer frente à demanda de água potável da população, estamos tolerando que façam exatamente o oposto: diminuam a capacidade de armazenamento (através dos desmates, substituição da vegetação nativa por pastos e lavouras, ressecamento e erosão dos solos), retirem água a mais da que é depositada (através de poços semiartesianos e artesianos, bombeamento de água para irrigação de lavouras e mineração de ouro em larga escala), e até destruam o próprio “banco de água” de Paracatu, os solos e subsolos onde a água é armazenada (destruição, entupimento e poluição das nascentes da face leste do Sistema Serra da Anta, pela mineração de ouro em larga escala).

Se falta água em casa para os mais de 80 mil habitantes de Paracatu, não foi por falta de aviso. Foi por falta de vergonha na cara, ganância, negligência e corrupção.

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