Ilustríssimo Senhor Desembargador Pedro Marcondes, sou presidente da Fundação Acangaú, instituição criada por mim e outros colegas e conterrâneos, há 18 anos, sediada no Vale do Acangaú, município de Paracatu, de onde minha família é originária desde o século XIX. Dirijo-me a Vossa Excelência como cidadão brasileiro no cumprimento dos seus deveres constitucionais, como pai de família, como médico e como cientista. Escrevo-lhe de Göttingen, Alemanha, onde me encontro a serviço do salvamento do Vale do Machadinho, verdadeira caixa d'água da cidade de Paracatu, e da população do município, ameaçados pela iminente construção de uma barragem de rejeitos tóxicos da mineradora transnacional canadense, RPM/Kinross Gold Corporation. Há dois anos venho labutando, juntamente com outros cidadãos e instituições da sociedade civil organizada, no sentido de esclarecer o público e as autoridades brasileiras acerca do risco iminente de catástrofe socio-econômica e ambiental que a expansão da mina da Kinross em Paracatu representa. Os poderes executivo e legislativo demonstraram-se favoráveis ao licenciamento desse projeto insustentável, contra toda uma linha de evidência circunstancial e fática que indica tratar-se de um erro com graves e persistentes consequências sócio-econômicas, ambientais e para a saúde humana a curto, médio e longo prazos. O Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal reconheceram alguns desses riscos iminentes e irreversíveis, e ingressaram com ações para impedir a entrada do pedido de licenciamento da mineradora junto ao COPAM, em março-abril deste ano, enquanto certas garantias não pudessem ser dadas. Os representantes do Judiciário em Paracatu e Patos de Minas cumpriram seus papéis e concederam as liminares. A representante do TRF em Brasília acolheu o recurso da mineradora, e o mesmo ocorreu em Belo Horizonte, com relação ao Mandado de Segurança da RPM/Kinross. A Procuradoria do MPE interpôs Agravo Regimental contra o referido Mandado de Segurança, que deverá ser apreciado por V.Excia. Senhor Desembargador, se a RPM/Kinross reapresentar o pedido de licença de instalação da nova barragem de rejeitos da RPM/Kinross, certamente o COPAM irá conceder essa licença, pois conhecemos o teor dos pareceres, que são favoráveis à concessão da licença. Então, talvez na mesma hora, no mesmo dia ou na mesma noite as máquinas da RPM/Kinross começarão a destruição irreversível no Vale do Machadinho, para caracterizar o FATO CONSUMADO. Sem entrar nas questões de legitimidade, moralidade, conveniência, adequação- ou dos deméritos do projeto, claro está que a mera colocação do procedimento em pauta, enquanto não foram preenchidos os requisitos legais, pode gerar um dano irreparável. Ainda que o MP ou a sociedade civil organizada ingressem com ação para anular a licença, é notório que anular uma licença na prática não é tão fácil e o impacto já terá sido causado. O caso de Paracatu é tão grave que está despertando a atenção e a ação engajada de um número crescente de entidades locais, nacionais e internacionais, como: . a Fundação Acangaú; . os jornais "O Movimento", "O Lábaro" e "Alerta Paracatu", de Paracatu; . a dupla de cinegrafistas Alessandro Silveira e Sandro Neiva (produtores do filme-documentário "Ouro de Sangue", disponível para baixar em www.alertaparacatu.blogspot.com); . o Instituto Serrano Neves, dirigido pelo Procurador de Justiça do Estado de Goiás, Dr. Paulo Maurício Serrano Neves; . o jornal Estado de Minas (extensa reportagem-denúncia, publicada em três páginas inteiras do jornal, dia 13 de julho de 2008); . a Folha de São Paulo (reportagem na "Folha Online"); . o Movimento pelas Serras e Águas de Minas; . o Projeto Manuelzão; . o blog "Eco-Debate" (www.*ecodebate*.com.br); . a Okanogan Highlands Alliance (dirigida pelo Sr. David Kliegman, estado de Washington, EUA); . a Mining Watch Canada (http://www.miningwatch.ca/index.php?/Kinross); . a Sociedade Internacional para Defesa dos Povos Ameaçados (Gesellschaft für bedrohte Völker, sediada em Göttingen, Alemanha); . o programa ESPN Brasil ( http://espnbrasil.terra.com.br/historiasdoesporte/noticia/54449_JOGO+CONTRA+A+CORRUPCAO+E+DESTAQUE+DO+PROGRAMA+DESTE+DOMINGO+AS+10H30 ); . o Jornal da Ciência (órgão da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=64286; . a Rede Rio das Velhas (http://rederiodasvelhas.ning.com/); . centenas de pessoas, conforme constatamos pelas demonstrações de apoio à luta pelo salvamento de Paracatu e região. Esta semana enviamos correspondência à Organização Mundial da Saúde, em Genebra, com cópias para a OPAS em Washington e Brasília, solicitando ação imediata em vista do risco iminente de catástrofe, conforme documentação publicada em www.alertaparacatu.blogspot.com (várias reportagens, laudos de análises químicas, fotos, filmes-documentários, veja também o relatório da ONU: United Nations Synthesis Report on Arsenic in Drinking-Water, WHO, 2001, acessível a partir de http://www.who.int/water_sanitation_health/dwq/arsenic3/en/* - destaques do relatório publicados em www.alertaparacatu.blogspot.com/2009/06/united-nations-synthesis-report-on.html) Breve também entraremos em contato com o Banco Mundial e o Parlamento Europeu, entre outras entidades e pessoas que se importam com o futuro do povo de Paracatu e região, incluindo o Vale do São Francisco, para onde drenam as águas de Paracatu. Se as 1,2 bilhão de toneladas de rejeitos da mineradora RPM/Kinross contaminadas com arsênio forem depositadas no Vale do Machadinho, elas contaminarão irreversivelmente o aquífero da Serra da Anta, que faz parte da bacia do Rio Paracatu, o tributário mais importante do Rio São Francisco. A quantidade de arsênio que será liberada pela mineradora é veneno suficiente para matar 1000 vezes toda a população atual do planeta Terra. Esse genocídio não acontece de forma aguda, porque a liberação do arsênio é lenta, insidiosa. As mortes se verificam em decorrência da exposição a longo prazo, como acontece em Bangladesh e Bengala Ocidental, que são um modelo mundial do que a intoxicação crônica pelo arsênio na água é capaz de provocar: uma catástrofe sócio-econômica e ambiental de amplas proporções. Sabedores desse risco de dano iminente, apelamos a V.Excia. que não dê abertura para que uma catástrofe como a de Bangladesh se repita em Paracatu e no Vale do São Francisco. Não queremos assistir crimes de lesa-pátria e crimes contra a humanidade repetindo-se no Brasil, com um agravante: em Bangladesh e Bengala Ocidental a catástrofe aconteceu por causa da ingenuidade humana. Em Paracatu, a catástrofe que se insinua poderá ocorrer por motivo vil: ganância e corrupção. Muito respeitosamente, Sergio Ulhoa Dani -- Sergio Ulhoa Dani Tel. 00(XX)49 15-226-453-423 srgdani@gmail.com |
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